quarta-feira, 14 de março de 2018

DISCURSO DO PAPA PIO XII NA BEATIFICAÇÃO DO VENERÁVEL PAPA PIO X ( II )

Virtudes do Beato Pio X.  ( continuação )
   7- Quanto a nós, que estávamos então no início do nosso sacerdócio, já ao serviço da Santa Sé, não poderemos jamais esquecer a nossa intensa comoção, quando, ao meio-dia daquele 4 de agosto de 1903, da Loggia da Basílica Vaticana a voz do Cardeal Primeiro Diácono anunciou à multidão que aquele Conclave - tão importante sob tantos aspectos! - tinha dirigido a sua escolha para o Patriarca de Veneza, José Sarto.
   8- Foi então pronunciado pela primeira vez perante o mundo o nome de Pio X. Que ia significar este nome para o Papado, para a Igreja, para a humanidade? Quando hoje, decorrido quase meio século, nós perpassamos pelo espírito a sucessão dos graves e complexos acontecimentos que o encheram, a nossa fronte inclina-se e os nossos joelhos dobram-se em admirada adoração dos desígnios divinos, cujos mistérios lentamente revelam aos pobres olhos humanos, à medida que se consumam no curso da história.
   9- Ele foi Pastor, bom Pastor. Parecia que tinha nascido para o ser. Em todas as jornadas do caminho, que pouco a pouco o conduzia do humilde lar natal, pobre de bens da terra, mas rico de fé e virtudes cristãs, até ao vértice supremo da Hierarquia, o Filho de Riese permaneceu sempre igual a si próprio, sempre simples, afável, acessível a todos, na sua casa paroquial da aldeia, , na cadeira capitular de Treviso, no bispado de Mântua, na Sé Patriarcal de Veneza, no esplendor da Púrpura romana, e continuou a ser o mesmo na majestade soberana, sobre a sédia gestatória e sob o peso da Tiara, no dia em que a Providência, modeladora longínqua das almas, inclinou o espírito e o coração dos seus Pares a confiar-lhe o cetro, caído das mãos enfraquecidas do grande Ancião Leão XIII nas suas mãos paternalmente firmes. Precisamente de tais mãos tinha o mundo necessidade então.
   10- Não tendo podido desviar da sua cabeça o terrível encargo do Sumo Pontificado, ele, que tinha sempre fugido às honras e às dignidades, como outros, ao invés, fogem de uma vida ignorada e obscura, aceitou entre lágrimas o cálice das mãos do Pai divino.
   11- Mas uma vez pronunciado o seu Fiat, este humilde, morto para as coisas terrenas e todo em anelos pelas coisas celestes, demonstrou no seu espírito a indomável firmeza, a robustez viril, a grandeza da coragem, que são as prerrogativas dos Heróis da santidade.
   12- Desde a sua primeira Encíclica, foi como se uma chama luminosa se tivesse erguido para esclarecer as inteligências e acender os corações. Não de modo diferente sentiam os discípulos de Emaús inflamarem-se-lhes os corações, enquanto o Mestre falava e lhes revelava o sentido das Escrituras (Lc XIV, 32).
   13- Não tendes porventura experimentado também este ardor, queridos filhos, que vivestes naqueles dias e ouvistes dos seus lábios o exato diagnóstico dos males e dos erros do tempo, e juntamente indicados os caminhos e os remédios para os curar? Que clareza de pensamento! Que força de persuasão! Era certamente a ciência e a prudência de um profeta inspirado, a intrépida franqueza de um João Batista e de um Paulo de Tarso; era a ternura paterna do Vigário e Representante de Cristo, atento a todas as necessidades, solícito a todos os interesses, a todas as misérias dos seus filhos. A sua palavra era trovão, era espada, era bálsamo; comunicava-se intensamente a toda a Igreja e estendia-se muito ao longe com eficácia; atingia o irresistível vigor, não só pela incontestável substância do conteúdo, mas também pelo seu íntimo e penetrante calor. Sentia-se nela ferver a alma de um Pastor que vivia em Deus e de Deus, sem outro objetivo senão levar para Ele os seus cordeiros e as suas ovelhas. Por isso, se ele, fiel às venerandas tradições seculares dos seus antecessores, conservou substancialmente todas as solenes (já não faustosas) formas exteriores do cerimonial pontifício, naqueles momentos  o seu olhar suavemente triste, fixo num ponto invisível, mostrava que não para si próprio, mas para Deus, ia toda a honra.
   14- O mundo, que o aclama hoje na glória dos Bem-aventurados, sabe que ele percorreu os caminhos assinalados pela Providência, com uma esperança inconcussa, mesmo nas horas mais escuras e incertas, com uma caridade que o impelia a votar-se a todos os sacrifícios pelo serviço de Deus e pela salvação das almas.
   15- Por estas virtudes teológicas, que eram como o travejamento fundamental da sua vida e que ele praticou num grau de perfeição, que superava incomparavelmente toda a excelência puramente natural, o seu Pontificado refulgiu como nas idades de ouro da Igreja. Acudindo em todos os instantes à tríplice fonte destas virtudes-rainhas, o Bem-aventurado Pio X iniciou e consumou o curso de toda a sua vida com o exercício heróico das virtudes cardeais: fortaleza de uma inflexível imparcialidade, temperança que se confundia com a renúncia total de si mesmo, prudência inteligente, mas prudência do espírito que é "vida e paz", distinta da "sabedoria da carne, que é morte e inimiga de Deus" (cf. Rom VIII, 6-7).
   

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