terça-feira, 26 de abril de 2016

DOUTRINA CATÓLICA SOBRE A SALVAÇÃO (término do capítulo)

   36. CONFUSÃO DE IDEIAS.

   Ainda não entramos de cheio na refutação da teoria da salvação só pela fé. Fizemos apenas um resumo da doutrina católica sobre a salvação, para esclarecer certos pontos em que se confundem os nossos adversários que não estão perfeitamente ao par da nossa doutrina. Mas bastou ao leitor ver o texto das Escrituras em que se exige a observância dos mandamentos para conseguir o Céu, não podendo alcançá-lo os que cometem certas faltas graves, bastou ver a insistência com que a Bíblia nos assegura que Deus retribuirá a cada um segundo as suas obras, sem fazer acepção de pessoas, para observar como é inexata a doutrina da que só a fé é que salva e de que as boas obras não influem na salvação. Queremos dizer apenas algumas palavras sobre uma confusão que fazem os protestantes a respeito do perigo de envaidecimento para aqueles que fazem boas obras, sabendo que elas terão a sua recompensa.

   Os protestantes viram um texto de São Paulo (Efésios II-8 e 9) em que o Apóstolo nos ensina que a concessão da graça primeira, ou seja, a passagem do pecador do estado de pecado para o estado de justiça, pela graça santificante se realiza de graça e não em atenção a nossas obras, para que ninguém se glorie. Teremos ocasião de comentar atentamente e de vagar esse texto num capítulo especial que versará sobra a graça primeira. Daí aprenderam de oitiva a dizer que a glória do Céu não se alcança pelas nossas obras mas só pela fé, para que o homem não se orgulhe, não se glorie de ter alcançado a salvação pelo seu esforço. Deus teria querido assim evitar o perigo do orgulho humano, e teria caído noutro perigo muito maior ainda: teria favorecido horrivelmente à corrupção do homem e ao relaxamento no pecado, impondo somente a fé para a salvação e dispensando a observância dos mandamentos e a prática das outras virtudes cristãs, entre as quais avulta a caridade, para a consecução da glória celeste. 

   37. A DOUTRINA CATÓLICA E A PRESUNÇÃO.

   Qualquer um que considere atentamente a doutrina católica, não terá motivo algum para gloriar-se de suas virtudes ou de suas boas obras. E a prova é que a Igreja Católica tem produzido um número imenso de grandes santos que são conhecidos no mundo inteiro, muitos dos quais bem estimados e admirados pelos protestantes, e no entanto, um fenômeno observado em todos eles é que, quanto mais progrediam na virtude e se enriqueciam da graça de Deus, tanto mais baixo conceito faziam de si mesmos. A sua grande virtude fazia com que lamentassem profundamente as mais pequenas imperfeições; e causa admiração como se não julgavam mais do que grandes e desprezíveis pecadores. Seguiam nisto a palavra do Eclesiástico: Quanto maior és, humilha-te em todas as coisas e acharás graça diante de Deus (Eclesiástico III-20).

   Realmente a consideração da doutrina sobre a graça, que há pouco resumimos, leva o homem a reconhecer o seu nada, a sua fraqueza e insuficiência. Se Deus justifica o pecador e o faz seu filho, esta elevação a uma grandeza sobrenatural é feita por pura bondade e misericórdia de Deus. Cada ação boa, cada ato de virtude, cada vitória sobre as tentações precisou, para efetuar-se, do auxílio da graça divina: Sem mim nada podeis fazer (João XV-5). A criancinha que não pode escrever a carta sem a mãezinha a estar ajudando com a mão dela por cima da sua, não pode absolutamente orgulhar-se de ter escrito a carta por seu próprio engenho e esforço. E os erros dados nesta carta, por culpa do pequeno escrevente, a mãezinha depois os corrige - isto é, os pecados, as faltas, as imperfeições que frequentemente cometemos, Deus está sempre de braços abertos para nos perdoar, se nos voltamos para Ele. E o católico tem, mais do que ninguém, uma lembrança viva de seus pecados, pois tem que fazer cuidadoso exame de consciência sobre eles e confessá-los humildemente ao ministro de Deus, a quem foi dado o poder de perdoar e reter os pecados. Nenhuma razão tem, portanto, o católico, para orgulhar-se de suas virtudes, quando as possui: Que tens tu que não recebesses? Se, porém, o recebeste, por que te glorias como se o não tiveras recebido? (1ª Coríntios IV-7). 

   Se, porém, por um ato de irreflexão ou, para melhor dizer, de loucura, conceber um pensamento de presunção, uma queda fatal se dará, porque Deus resiste aos soberbos, e dá sua graça aos humildes (Tiago IV-6). E acontecerá o que aconteceu a São Pedro, que fez as mais brilhantes profissões de fé e que amava a Cristo mais do que os outros Apóstolos, mas por ter consentido num ato de confiança exagerada em si mesmo, teve que chorar, por toda a vida, uma queda desastrosa. Assim aprenderá o homem, à custa dos próprios fracassos, a não confiar em si mesmo. Não há razão, portanto, para Deus deixar de considerar como CONDIÇÃO NECESSÁRIA PARA A SALVAÇÃO  a guarda dos mandamentos, a prática das boas obras, por parte do homem, (que é livre nas suas ações e portanto tem que mostrar um bom uso de sus liberdade), só pelo receio de que o homem se venha a tornar vaidoso.

   Se assim fosse, Ele também deixaria de apontar a FÉ como CONDIÇÃO NECESSÁRIA PARA A SALVAÇÃO, porque a fé é sempre um ato livre, uma cooperação humana, e assim como há o perigo de ensoberbecer-se o homem pelas suas obras, assim também há o de ensoberbecer-se pela fé: Tu pela FÉ estás firmes, pois NÃO TE ENSOBERBEÇAS, MAS TEME (Romanos XI-20).

   38. RECOMPENSA E BENEFÍCIO.

   Por mais estranho que pareça, a glória do Céu, que a Escritura nos mostra como uma RECOMPENSA dada ao homem pelas suas boas obras, é também, em última análise, uma graça, um BENEFÍCIO de Deus.

   Um homem rico e ilustre toma um mísero e desprezível servo e o cumula de favores, espontânea e benignamente, fazendo dele um filho adotivo. Depois disto, começa a fornecer-lhe verba continuamente, para que ele realize alguns trabalhos. Perdoa frequentemente também os erros e fraquezas deste filho, bastando para isto que ele procure sinceramente o seu perdão. E aqueles trabalhos realizados pelo filho com a verba dada pelo próprio pai, este os recompensa larguissimamente, fazendo-o cada vez mais participante de uma imensa herança.
   Pode ser maior a sua benignidade?
   Assim faz Deus conosco, chamando-nos e justificando-nos misericordiosamente quando somos pecadores, perdoando-nos inúmeras vezes na vida, graças aos merecimentos infinitos de Jesus Cristo, fornecendo-nos continuamente o auxílio da sua graça e recompensando com os gozos da vida eterna as nossas obras, que só com a sua graça podiam ser realizadas. Por isto, tinha razão em exclamar o grande Doutor da Graça, Santo Agostinho: "Deus quando coroa nossos merecimentos, não coroa senão seus próprios benefícios".

2 comentários:

  1. Só tenho uma dúvida: onde se encaixa a pessoa de Jesus o Cristo na salvação para os católicos?

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    1. Caro Ronaldo Marques, leia todos os artigos atinentes ao assunto, e tenho certeza que sua dúvida se dissipará.

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