sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

CARTA APOSTÓLICA "MOTU PROPRIO" "SUMMORUM PONTIFICUM"

Considerações como complemento dos últimos posts

   É lícito, diz o "Motu Proprio", celebrar o Sacrifício da Missa de acordo com a edição típica do Missal Romano promulgado pelo Beato João XXIII em 1962 e NUNCA AB-ROGADO". (grifos nossos). Quero comentar apenas estas duas preciosíssimas palavras destacadas: "nunca ab-rogado".
   Primeiro é um reconhecimento feito de maneira oficial. É o Santo Padre, o Papa, nosso guia no Magistério Vivo e Perene da Santa Madre Igreja quem o faz, e de maneira tão simples e natural, deixando claramente transparecer de que se trata de uma coisa óbvia. No entanto, no dia do Juízo vamos ver a quantos sofrimentos os padres e fiéis tradicionalistas foram submetidos, por  as autoridades da Igreja terem agido como se o contrário é que fosse verdade.
   Numa palestra que D. Antônio de Castro Mayer, bispo de Campos, fez ao microfone da Rádio Cultura de Campos, no dia 27 de novembro de 1971, entre outras coisas diz o seguinte: (...) " a Missa é o centro do Cristianismo, é o que lhe dá vida, e o faz autêntico. Por isso mesmo, Lutero, a primeira coisa que fez para abalar a Igreja de Roma, foi atacar a Missa" (...) "Segundo esta legislação canônica em vigor um costume mais do que centenário, ou imemorial só se considera ab-rogado, quando semelhante ab-rogação é declarada de modo explícito (c. 30). Ora, de um lado a Missa tradicional de São Pio V tem uma tradição muito mais do que centenária. É milenar, e mais que milenar. Pelo menos no século VI já se celebrava a Missa, como se celebra hoje a Missa de São Pio V. De onde, continua a ser lícita a celebração dessa Missa. Ninguém pode censurar um padre porque continua a celebrá-la".
   "Alguém poderia perguntar por que este apego à Missa tradicional?
   "Explica-se:
   "São Pio V fixou o rito da Missa, conservando o rito tradicional, e proibindo pequenas adições e subtrações que se faziam em alguns lugares, para impedir que se alargassem na Igreja, e viessem adulterar o rito sagrado, de maneira que sua característica de verdadeiro sacrifício propiciatório caísse no esquecimento e viesse a ser anulado. A Missa de São Pio V é, pois, uma barreira contra a heresia: os protestantes diziam e dizem que todos os fiéis são sacerdotes e que o padre não tem nenhum sacerdócio especial.- A Missa de São Pio V fixa de modo insofismável a distinção entre o padre que celebra, que sacrifica, e o povo que se junta ao sacerdote em posição subalterna, para participar do sacrifício. Os protestantes negavam que a Missa fosse um verdadeiro sacrifício. Era apenas uma Ceia. - A Missa de São Pio V afirma de modo peremptório que a Missa é um verdadeiro sacrifício. Os protestantes negavam, e negam, que a Missa seja um sacrifício propiciatório. No máximo aceitam que se diga um sacrifício de ação de graças. - A Missa de São Pio V marca indelevelmente o caráter propiciatório da Missa. É pois uma barreira a invasão herética"
   "Daí o explicável apego que a ele (ao rito da Missa de S. Pio V) têm fiéis que amam a Igreja e amam a Jesus Cristo, porque o apego e o amor à doutrina e Revelação de Jesus Cristo é sinal de verdadeiro amor ao mesmo Jesus Cristo, segundo a expressão dele mesmo: "Quem me ama, guarda a minha palavra" (S. Jo. XIV, 23). Compreende-se, assim, a pergunta que faz o publicista francês Luiz Salleron, no semanário parisiense "Carrefour" de 14 de julho último: "É acaso, possível proibir uma Missa que, desde os primórdios, é a Missa ininterrupta da Tradição e que foi fixada no século XVI em plena harmonia com o Concílio de Trento, cujos trabalhos, seguidos por longos anos, tiveram como finalidade determinar bem o objeto do Dogma Eucarístico?" - Também a nós nos parece que não é possível. Até agora a Santa Sé também não a proibiu. Portanto, em plena harmonia com a Igreja, podem todos os padres continuar celebrar a Missa Tradicional de São Pio V".
   Na época, lembro-me que os progressistas da Diocese de Campos, acharam que D. Antônio estava errado. Bem parecido com a época do Papa Honório I; só a matéria da controvérsia era diferente. Patriarcas, bispos e padres monotelitas acharam que o monge Máximo estava errado em não obedecer ao Papa Honório I; mas hoje Máximo é enaltecido pelo seu amor a Igreja e a Jesus Cristo, e foi canonizado; e o Papa Honório I, 40 e poucos anos depois de morto, foi anatematizado, aliás, por um Papa santo, ou seja, São Leão II.
   Se D. Antônio de Castro Mayer estivesse vivo, como ele teria se alegrado por este documento "Motu Proprio" "Summorum Pontificum" de Sua Santidade o Papa Bento XVI!!! Sobretudo por ter declarado de modo insofismável que a Missa de São Pio V nunca foi ab-rogada. Homem de fé e que amava verdadeiramente a Nosso Senhor Jesus Cristo e Sua Mãe Santíssima, D. Antônio de Castro Mayer teria se alegrado enormemente, não só simplesmente por ver sua opinião confirmada pelo Papa; não pensando no própria glória, mas na maior glória de Nosso Senhor Jesus Cristo e no triunfo da Santa Madre Igreja.
   Lendo hoje a carta "Summorum Pontificum", pensamos também em D. Marcel Levebvre, outro bispo que amava ternamente a Santa Madre Igreja. D. Mayer e D. Levebvre eram dois homens capazes de dar a vida no martírio pelo triunfo da Santa Madre Igreja.
   Em 23 de dezembro de 1982, o então Prefeito da Congregação para a doutrina da Fé, o cardeal Ratzinger, hoje o nosso Santo Padre, o Papa, em nome do Papa João Paulo II, apresentava a D. Lefebvre algumas propostas em vista da sua regularização e da dos membros da Fraternidade de São Pio X; e depois, no fim da carta, observou: "Eu devo acrescentar, enfim, que, no que concerne à autorização de celebrar a Santa Missa segundo o "Ordo Missae" anterior ao de Paulo VI, o Santo Padre decidiu que a questão será resolvida para a Igreja universal e, portanto, independentemente de seu caso particular".
   Destas palavras do então cardeal Ratzinger podemos tirar algumas conclusões: 1ª) É uma injustiça contra D. Levebvre dizer (como alguém disse) que ele foi culpado por esta demora de 25 anos na liberação da Missa de São Pio V para a Igreja Universal. Por que injustiça? Primeiro porque o cardeal Ratzinger declarou que o Santo Padre decidiu que a vontade dele era resolver esta questão para a Igreja universal, independentemente do caso de D. Lefebvre, ou seja, não dependeria da solução ou não solução deste caso particular da regularização de D. Lefebvre e de sua Fraternidade de São Pio X. Portanto, se o Papa não resolveu senão depois de 25 anos, não foi por causa de D. Lefebvre. 2ª) D. Lefebvre visitou a João Paulo II, poucos meses depois de sua eleição, para o cumprimentar , e pedir a bênção a Sua Santidade e, especialmente, fazer-lhe um pedido, para o bem de toda a Igreja: reconhecer oficialmente o direito de se celebrar a Missa de sempre. "O Papa João Paulo II, conta o próprio D. Lefebvre, por ocasião da audiência que me concedeu em novembro de 1979, ele parecia bastante disposto, após uma conversação prolongada, a deixar a liberdade de escolha na liturgia, a deixar-me fazer, no fim de contas, o que eu solicito desde o começo: entre todas as experiências que são efetuadas na Igreja, "a experiência da tradição. Parecia ter chegado o momento em que as coisas se iriam arranjar, não mais ostracismo contra a missa, não mais problema. Mas o cardeal Seper, que estava presente, viu o perigo; exclamou: 'Mas Santíssimo Padre, eles fazem desta missa uma bandeira!' A pesada cortina que se havia erguido num instante recaiu. Será preciso esperar ainda." (Confira "CARTA ABERTA AOS CATÓLICOS PERPLEXOS" edição feita pela Permanência, capítulo XX, os 2 §§ finais).
   Todos sabemos que D. Lefebvre dentro da década de 80 fez alguns escritos ou conferências que depois foram publicadas, em que ele diz palavras muito severas como: "é em Roma que a heresia instalou-se... É por isso que nós não podemos nos ligar a Roma". É preciso estarmos lembrados e os mais novos precisam saber que nas décadas de 70 e 80, ou seja, alguns anos após o Concílio Vaticano II, aconteceram tantos e tão grandes escândalos e sacrilégios, por causa do ecumenismo, da liberdade religiosa e da inculturação, das novas teologias; enfim com a destruição de tudo o que era sagrado e tradicional, que realmente éramos levados a pensar que a profecias de Nossa Senhora de La Salette estavam se realizando. As vezes fico pensando assim: Se todos os absurdos que foram cometidos dentro da Igreja tivessem sido filmados e hoje fossem mostrados, muitos teriam dificuldade em acreditar; alguns morreriam de tristeza; teriam exclamado: mas isto não é Religião!!! É a abominação da desolação dentro do lugar santo!!! Hoje também há coisas muito tristes. Mas a grande diferença é que hoje temos muitas coisas boas que na época não tínhamos e nem sequer a esperança de tê-las tão cedo.
   D. Pestana, de saudosa e santa memória, era na época bispo de Anápolis GO. (1979-2004). Por causa dos absurdos que estavam sendo cometidos dentro da Igreja chegou a dizer que não foi só a fumaça de Satanás que entrou na Igreja, mas foi o demônio inteiro. Eis as palavras de D. Pestana: "O demônio todo inteiro, não só a sua fumaça como disse Paulo VI, transpôs triunfalmente os portões da Igreja e está colocado nos seus mais altos postos, através de seus fiéis seguidores. Estupidificados pelo engodo do ecumenismo, estão engolindo a infidelidade e a apostasia que escorrem do alto. A Igreja esá caminhando para Sodoma e Gomorra".  Realmente foi a coisa mais triste do mundo!!! Até o idoso bispo D. Lazo passou para o Fraternidade de São Pio X.
   Como a Santa Igreja é divina, desde a promulgação de Missa de Paulo VI, houve reações contra esta missa feita com a assistência complacente e concorde de seis pastores protestantes. E como na época do Papa Honório I que com sua ambigüidade, imprudência e negligência favoreceu a heresia monotelita defendida pelos bispos patriarcas Sérgio e Pirro, houve dois homens providenciais: o monge São Máximo e o bispo São Sofrônio, podemos dizer que para defender a Missa Tradicional, a Providência Divina suscitou na Igreja dois bispos: D. Antônio de Castro Mayer e D. Marcel Lefebvre.
   Suponhamos, por absurdo, que nem eles nem outros tivessem reagido contra a Missa Nova e não tivessem defendido que a Missa de São Pio V nunca poderia ser ab-rogada, o que teria acontecido? Com certeza, hoje, não teríamos mais a Missa Tradicional. Por isso devemos concluir que D. Lefebvre e D. Mayer foram homens providenciais e quem sabe um dia a Igreja não os vai canonizar como canonizou Santo Atanásio, São Máximo e São Sofrônio?! D. Lefebvre e D. Mayer eram homens de fé, de penitência e de oração. E eram humildes. Com relação a D. Lefebvre, numa carta de 30 de julho de 1983 o então cardeal Ratzinger declarou: "O Santo Padre não desconhece nem sua fé nem sua piedade". Já é um bom início!!! Não é verdade?!
   Em carta de 7 de julho de 2007, D. Bernard Fellay, DD. Superior Geral da Fraternidade Sacerdotal de São Pio X, escrevia: "O Motu Proprio Summorum Pontificum do dia 7 de julho de 2007 restabelece a missa tridentina no seu direito. Nele se reconhece claramente que nunca tinha sido ab-rogada. Deste modo, a fidelidade a esta missa em nome da qual muitos sacerdotes e leigos foram perseguidos e inclusive punidos desde 40 anos atrás - esta fidelidade, pois, nunca foi desobediência. Não é senão um ato de justiça agradecer hoje a D. Marcel Lefebvre por ter-nos mantido nesta fidelidade à missa de sempre em nome da verdadeira obediência, contra todos os abusos de poder. Ninguém duvida que este reconhecimento do direito da missa tradicional seja o fruto dos numerosíssimos rosários oferecidos a Nossa Senhora durante nossa cruzada do Rosário no mês de outubro passado. Saibamos agora expressar-lhe a nossa gratidão".
   Vejam como devemos fazer para conseguirmos graças e bênçãos de Deus, Nosso Senhor: rezar com devoção o Santo Rosário da Santíssima Virgem Maria. E nunca devemos atribuir a nós mesmos, à nossa esperteza política de sobrevivência, a aquisição de alguma coisa. Tudo é graça de Deus; e Nosso Senhor quer que a peçamos.
   Tenho lido nos jornais e nas revistas que assino, agora na Internet, como o Santo Padre o Papa tem sofrido por ter feito esta carta "Summorum Pontificum". Os progressistas não gostaram. E só para se ter uma idéia: no Jornal "O Globo", do dia 09/07/2007 li o seguinte: o título do artigo: "Bispo se diz de luto" por decisão anunciada por Bento XVI. "Eu não consigo conter as lágrimas. Esse é o momento mais triste de minha vida como homem, padre e bispo" afirmou Luca Brandolini, membro da Comissão de Liturgia da Conferência dos Bispos Italianos, em entrevista ao jornal "La Estampa". "É um dia de luto não só para mim, mas para muitas pessoas que trabalharam no Concílio Vaticano II, uma reforma (...) inspirada somente pelo desejo de renovar a Igreja e que agora foi cancelada". (O Globo, 09 de julho de 2007, p. 22). Como os progressistas amam o Vaticano II!!! Será de graça? Foi muito sintomática a referência deste bispo ao Concílio Vaticano II! Cada dia mais me convenço de que os Tradicionalistas (os verdadeiros) são os verdadeiramente obedientes ao Santo Padre, o Papa. Os progressistas só obedecem quando algum papa, a exemplo de Honório I que favoreceu o Monotelismo, favorece o Modernismo; enquanto os verdadeiros tradicionalistas só desobedecem, à exemplo de São Máximo, nestes mesmos casos em que o papa favorece a heresia.
   Que Nosso Senhor Jesus Cristo dê ao Santo Padre, o Papa a fortaleza e a luz necessárias para completar a boa obra de desfazer a "reforma" querida e realizada pelo Concílio Vaticano II. Amém!
  

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

A INFALIBILIDADE - OS DECRETOS DISCIPLINARES E AS LEIS LITÚRGICAS

   Já mostramos que a Santa Igreja é infalível quando define solenemente verdades por si reveladas, isto é, verdades de fé e moral contidas formalmente no depósito da Revelação. Estas verdades constituem o objeto direto e primário da Infalibilidade.
   Mas existem outras verdades que não foram formalmente reveladas. Elas têm, entretanto, um nexo tão íntimo com a Revelação, que são necessárias para que o depósito da fé seja conservado íntegro, seja devidamente explicado e seja eficazmente definido. Entre estas verdades estão os Decretos Disciplinares e as Leis Litúrgicas. Estão entre os objetos indiretos e secundários da Infalibilidade.
   Esta tese assim globalmente considerada, não é de fé. Isto significa que quem a negar não é herege. Mas é uma tese "teologicamente certa". Quem a negar é "temerário".

INTRODUÇÃO: ALGUMAS EXPLICAÇÕES PRELIMINARES:

   1º)  Uma lei litúrgica só envolve infalibilidade quando, considerados o seu conteúdo e as suas circunstâncias, torna-se claro que ela contém uma definição infalível, isto é, que a Igreja quis servir-se deste meio para ensinar infalivelmente uma verdade. Portanto, os textos litúrgicos só envolvem a infalibilidade quando preenchem determinadas condições bem definidas e precisas.
   Vejamos, então, embora resumidamente, quais são estas condições:
   A) A Infalibilidade só se refere a leis e decretos promulgados para a Igreja Universal. Quando dizemos para a igreja universal, queremos significar para todo o "rito latino" que é próprio da Sé Romana, cabeça de todas as igrejas. Existe também o "rito oriental católico".
   B) A Infalibilidade só atinge os assuntos de fé e moral.
   C) Trata-se somente da infalibilidade da doutrina explícita ou implicitamente contida em tudo quanto a lei prescreve: atos, palavras atitudes etc. Ou no terreno estritamente litúrgico: orações, cerimônias, rubricas, gestos, objetos etc.
   Não há infalibilidade sobre a oportunidade ou conveniência da lei. Dizem quandes teólogos, como Hervé, Tanquerey, Wernz e Vidal que, quanto a aspectos prudenciais, podem haver erros nas leis eclesiásticas universais.
   Diz o teólogo Hervé (adotado no nosso Seminário): "A Infalibilidade quanto as coisas disciplinares não parece por si exigir que a Igreja sempre atinja o sumo grau de prudência".
   Tanquerey diz: "Esta Infalibilidade consiste em que a Igreja num juízo doutrinal nunca possa estabelecer uma lei universal, que seja contrária a fé (isto é, herética) e aos bons costumes e a salvação das almas (isto é, uma lei escandalosa, pecaminosa e herética também) ... "no entanto, em lugar algum foi prometido a Igreja um sumo grau de prudência para promulgar as melhores leis para todos os tempos, lugares e circunstâncias".
   Nota: Este sumo grau de prudência, ou seja, uma prudência heróica, vem da santidade, como explica o Papa Pio XII ao falar de São Pio X. Portanto, feliz o povo que tem um papa santo!!!
   O célebre teólogo jesuíta o Padre Goupil diz o seguinte: "Embora, distinguindo os diversos graus de certeza, aceitar-se-á filialmente os costumes piedosos e as tradições que aprova, e ter-se-á outrossim a disposição de corrigir os erros que aí possam ser encontrados." (evidentemente onde a Igreja não empenha a sua Infalibilidade). Nós podemos acrescentar que aqui tem lugar a lei da Igreja no cânon 212.
   Um exemplo: Quanto à Missa de Paulo VI, que é chamada de Missa Nova, D. Antônio de Castro Mayer dizia o seguinte: Não podemos dizer que é inválida, porque, para isso acontecer o papa teria que alterar substancialmente a matéria e/ou a forma do sacramento e do Sacrifício da Santa Missa. Neste ponto o Papa é infalível. Ele não pode mudar o que é de fé divina e/ou definida. Também, dizia ele, não podemos dizer que é herética pelos mesmos motivos, ou seja, aí entra a Infalibilidade. O Papa não pode impor a toda Igreja uma coisa que seja heresia. D. Antônio de Castro Mayer dizia que, pelas suas ambiguidades, a Missa Nova deu azo a que os inimigos internos (os modernistas) e os inimigos externos (os protestantes) dessem interpretações heterodoxas. E ele faz o paralelo com a atitude do Papa Honório I que, com relação a defesa da verdade contra os monotelitas, foi ambíguo e negligente, e consequentemente por isso, foi terrivelmente imprudente. Foi favorecedor da heresia, como tal, foi condenado pelo Papa São Leão II. Honório não ensinou a heresia, mas a favoreceu pela sua negligência. O mesmo aconteceu com a Missa Nova de Paulo VI.
   Gostaria de citar aqui o cardeal Gagnon: "Não se pode entretanto ignorar que a reforma (litúrgica) deu origem (sublinhado nosso) a muitos abusos e conduziu em certa medida ao desaparecimento do respeito devido ao sagrado. Esse fato deve ser infelizmente admitido e desculpa bom número dessas pessoas que se afastaram de nossa Igreja ou de sua antiga comunidade paroquial". É preciso lembrar que o ponto central da Reforma Litúrgica querida pelo Vaticano II foi justamente uma nova Missa. E quando dizemos Missa Nova, devemos entender todas as outras novidades que estão ligadas a ela, como por exemplo a comunhão na mão, o altar em forma de mesa e voltado para o povo, os ministros e ministras da Euccaristia etc., etc.
  É preciso notar também que este cardeal Gagnon não está sozinho. Muitos outros afirmam mais ou menos , o mesmo. E mais importante ainda é o fato de a Santa Sé não os ter censurado por suas afirmações. Pelo contrário.
   Caríssimos e amados leitores, não é amor a Santa Madre Igreja, querer tapar o sol com a peneira ou voluntariamente fechar os olhos. Oh! como é triste a gente constatar que autoridades da Igreja têm os olhos e ouvidos bem abertos para se defenderem de ofensas pessoais e, no entanto, se fazem cegos e surdos voluntários diante das ofensas que são feitas a Nosso Senhor Jesus Cristo!!!
   Depois destes parênteses, continuemos apresentando as condições para que as Leis Litúrgicas sejam infalíveis:
   D) A quarta condição é importantíssima porque dada por Pio IX, hoje beato. Podemos chamá-lo "O Papa da Infalibilidade". Guardai bem o que ele diz quando definiu o dogma da Imaculada Conceição de Maria Santíssima: "O que pertence ao culto está absoluta e intimamente ligado com o objeto deste, e não pode tornar-se RATIFICADO E FIXO (grifos nossos) se este objeto for DUVIDOSO E AMBÍGUO" (grifo nosso).
   Pio IX está falando de um culto universal. Mas mesmo sendo universal este culto não poderá ser ratificado e fixo (o que significa ser proposto infalivelmente), enquanto o seu objeto, no terreno dogmático, for duvidoso e ambíguo. Eis a explicação que deste texto de Pio IX, dá o célebre teólogo jesuíta o Revmo. Padre Manuel Pinto: "Importa, pois, muito saber distinguir o que é que no culto (=liturgia) se pode dizer "ratificado e fixo"ou, por outra, propriamente "lei de oração".
   Com base em dois documentos de São Pio V, o Revmo. Padre Manuel Pinto, S.J. observa: "Liturgias particulares que se mantiveram duzentos anos em comunhão com Roma, não deve facilmente presumir-se que contenham erros de fé e costumes".
   Nós observamos: Se Leis particulares que se mantiveram duzentos anos em comunhão com Roma, não foram abrogadas por São Pio V (quando canonizou o Missa de Sempre), quanto mais as leis universais com muitos séculos de Tradição como é a Missa canonizada por ele mesmo, São Pio V. Por isso que o Santo Padre Bento XVI, gloriosamente reinante, disse que a Missa de São Pio V nunca foi anulada. Hoje, depois de 30 anos, digo: na época de D. Navarro nós tradicionalistas éramos felizes. Felizes por sofrermos pela Verdade, ou seja, por amor a Jesus. Não por nossos merecimentos, mas unicamente pela misericórdia e graça divinas.
   E) Quinta condição para que as leis litúrgicas sejam infalíveis: outro indicativo de infalibilidade é quando certas verdades expressas pelo culto público vão aumentando ininterruptamente sua autoridade à medida que os doutores da Igreja as vão corroborando com mais interesse e que elas vão penetrando na persuasão dos fiéis.
   Nota: constatamos com clareza que é justamente o contrário que se dá com relação a Reforma Litúrgica do Concílio Vaticano II. E isto apesar de os modernistas serem ainda maioria na Igreja.
   F) Esta sexta condição para que as leis litúrgicas sejam infalíveis, compõe-se de três regras importantíssimas. Como aquilo que, na liturgia, o Magistério da Igreja propõe à adesão dos fiéis e estes aceitam, é proposto com grau de autoridade dogmática diversíssimo conforme os casos, então devem-se seguir três regras a saber: 1ª REGRA: (geral) "O fiel deve dar a cada proposição do magistério uma adesão do grau e da natureza - nem mais nem menos - que o magistério dele exige". 
                                        2ª REGRA: "Praticamente, só mediante o estudo teológico completo de cada uma das questões se pode determinar o grau autoritativo de qualquer ponto da liturgia, tanto histórica quanto atual".
                                        3ª REGRA: "Para poder arguir com absoluta certeza que uma doutrina é proposta pela Igreja como de fé divina e católica apenas pelo Magistério ordinário e universal, não basta mostrar que, no propor tal doutrina, existe unanimidade moral entre os bispos unidos com o Romano Pontífice, mas é necessário provar que eles, a propõem precisamente como de fé. A unanimidade moral deve versar sobre o fato de ser essa doutrina proposta como de fé." (Teólogo Pe. Vagaggini).
  
   EXEMPLOS: Seguindo estas três regras, podemos dar um exemplo de infalibilidade na liturgia: o Cânon da Missa de São Pio V; e podemos dar um exemplo de não infalibilidade : os textos da Missa Mova, enquanto tais e tomados na sua totalidade.
   1º exemplo: O Cânon da Missa de São Pio V foi definido como dogma pelo Concílio de Trento. Pois, como explica o Catecismo do Concílio de Trento II, IV, § 19 -24, todo o Cânon da Missa de São Pio V é tirado das duas fontes da Revelação, ou seja, da Tradição e da Sagrada Escritura.
   NOTAS: O arranjo atual das orações que formam o Cânon vem do tempo do Papa São Gregório Magno, ano 600. Mas São Gregório já encontrou o cânon praticamente formado. O que São Gregório fez, foi confirmá-lo e fixá-lo, dando-lhe assim um cunho oficial.
   A ausência de São José no Cânon é mais uma demonstração da antiguidade desta parte invariável e intocável da Santa Missa de São Pio V. É, pois sabido que o culto dos santos-mártires precedeu o culto dos santos-confessores. Este foi uma consequência do culto dos santos-mártires. No Cânon há duas listas dos santos-mártires; uma antes da Consagração, e outra depois da Consagração. Logo no início da lista dos santos-mártires está a Gloriosa sempre Virgem Maria, Mãe de Deus, Nosso Senhor Jesus Cristo. Os títulos que aí a acompanham estão mostrando porque Maria Santíssima deve ser invocada no Cânon, e em primeiro lugar. E, outrossim, Maria Santíssima é Corredentora; é Rainha dos Mártires. Esteve ao pé da Cruz de Seu Divino Filho oferecendo-O e também oferecendo seu Coração Imaculado para ser transpassado por aquela espada de dor predita pelo velho Simeão. São José com certeza, morreu antes de Nosso Senhor Jesus Cristo. A Santa Igreja declarou-o patrono da boa morte porque foi assistido pelo próprio Jesus e pela Santíssima Virgem Maria. Outra prova: Jesus ante de morrer entregou Nossa Senhora a São João que a levou para sua casa. "Eis aí a tua Mãe; eis aí o teu filho".
   Vou contar-vos um fato histórico muito significativo: Quando em 1847 o Papa Pio IX, hoje beato, declarou São José, padroeiro da Santa Igreja Universal, os bispos da Santa Madre Igreja pediram a ele para aproveitar e introduzir São José no Cânon da Missa. Pio IX respondeu taxativamente: "Não, porque o Cânon é intocável". Na verdade, São Pio V apenas canonizou as cerimônias e orações da Santa Missa; ele não inovou nada. Por isso não introduziu São José no Cânon. É claro que teologicamente seria possível, porque seria um acréscimo que não afetaria em nada a substância do Cânon. São Pio V e o Bem-aventurado Pio IX, porém, acharam por bem não modificar em nada o que vinha desde os primeiros séculos.
   Foi o Papa João XXIII, beato, que introduziu São José no Cânon. É claro que o fez com a melhor das intenções. Mas, na época, lembro-me que alguns progressistas (cardeais, bispos e padres) se alegraram dizendo que "agora o Cânon não é mais intocável!!!" Nós dizemos na Filosofia: "Quidquid recipitur, ad modum recpipientis recipitur". O que é recebido, é recebido a modo do recipiente. Aliás, constantamo-lo nos comentários dos blogs. Quanta diversidade!!!
  
   Vamos ver agora o exemplo de não Infalibilidade: os textos da Missa Nova, enquanto tais e tomados na sua totalidade. Num discurso que o Papa Paulo VI fez no dia 19 de novembro de 1969, referindo-se à Missa Nova, ele diz: "O rito e a respectiva rubrica por si NÃO SÃO UMA DEFINIÇÃO DOGMÁTICA; SÃO SUSCEPTÍVEIS DE UMA QUALIFICAÇÃO TEOLÓGICA DE VALOR DIVERSO, segundo o contexto litúrgico a que se referem..." (grifos nossos).
   Portanto, se o próprio Papa Paulo VI declarou explicitamente que os ritos e as rubricas da nova Missa "são susceptíveis de uma qualificação teológica de valor diverso, não parece ser possível sustentar que os textos do novo Missal, enquanto tais e tomados na sua totalidade, envolvam a Infalibilidade da  Igreja.
   Portanto, pelo cânon 212 temos o direito e até o dever de mostrar as falhas, omissões, ambigüidades e "sombras" do "Novus Ordo Missae".
   Ninguém, nem os bispos todos, podem exigir de nós o que o Santo Padre o Papa não exigiu e não exige.
   Podemos dizer que a situação atual na Igreja é a seguinte: Vira progressista quem quiser; e vira sedevacantista também só quem quiser. Deus nos livre de ambas estas coisas!!!
  

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

"UNIDOS EM DEFESA DA FÉ" ( V )

   Sua Excia. Revma. Sr. Dom Carlos Alberto Navarro, Bispo de Campos, nos convidou para mais uma reunião. A esta convocação do Sr. Bispo Diocesano fizemos algumas ponderações através de uma carta datada de 25 de janeiro de 1984. Eis a carta:

Exmo. e Revmo. Sr. Bispo de Campos
Dom Carlos Alberto Navarro

               Laudetur Jesus Christus!

   Vossa Excelência nos convoca para uma reunião reservada aos 25 Padres tradicionalistas da Diocese, inclusive os destituídos de seus cargos e privados do uso de ordens, e mesmo, os excluídos da Diocese por Vossa Excelência.
   Da Circular de convocação consta que a intenção expressa de V. Exa. é obter uma larga confraternização de todos os Padres da Diocese, de maneira a realizar-se a "Unidade tão desejada por Cristo em Sua Igreja".

   À convocação de Vossa Excelência devemos ponderar:

  I - Nós, os chamados 25 Padres tradicionalistas, realmente temos um mesmo pensamento: somos Padres da Igreja Católica de sempre e tomamos o símbolo desta Fé apostólica como critério único e imutável de nosso julgamento e procedimento (Cf. DS 1.500). Por isso, as acusações, em matéria de fé, lançadas contra alguns de nós, na realidade nos afetam a todos.

  II - Esta mesma solidariedade torna comuns as calúnias levantadas contra nosso procedimento. Assim, todos nos sentimos atingidos quando Vossa Excelência publicamente nos acusou de dilapidadores dos bens eclesiásticos. Igualmente, todos fomos afetados pelas difamações públicas com que V. Exa. nos capitulou como "ervas daninhas" e 'envenenadores do rebanho" de Cristo. A oposição de V. Exa. animou certo Juiz a tentar enquadrar, embora sem base, um de nossos Padres na Lei de Segurança Nacional (processo posteriormente arquivado pela Justiça Militar). Na ocasião, V. Exa. explorou o fato apontando-nos como avessos ao diálogo, fanáticos e subversivos.

   III - Tais atitudes persecutórias de V. Exa. obrigaram-nos à defesa pública, que fizemos, guardando todo o respeito à pessoa de V. Exa. Por outra parte, firmamos nossas posições em sólida base doutrinária, como se pode verificar em nossas publicações sobre "A Nova Missa: um caso de consciência", O Magistério sacerdotal em período extraordinário de grave crise, etc.
   Não podemos, pois, ser apontados como causa de desunião na Igreja, pois a união se faz com fundamento na Fé, sem a qual não há caridade.

   IV - Aliás, nós, por primeiro, procuramos o diálogo com V. Exa. e aceitamos outros que V. Exa. propôs: um, assessorado por Dom Romer; outro, por Dom Inácio Accioly, Mons. Tapajós e Dom Cirilo Gomes; sem contar o especial com o Exmo. Sr. Núncio Apostólico. No segundo desses encontros fomos destratados: Mons. Tapajós quis forçar-nos a assinar um documento cheio de inexatidões doutrinárias e contra nós mesmos.
   Aos nossos argumentos, jamais nos deram resposta satisfatória, de maneira que eles ainda se mantêm.

   V - Pelo Decreto de V. Exa. de 25 de agosto de 1982, o que V. Exa. nos quer impor é a aceitação do "Novus Ordo Missae". Não nos custa repetir, ainda uma vez, que, em consciência, não podemos aceitá-lo, porque ele extenua a profissão de fé nos dogmas eucarísticos, contra a lei geral que nos manda orar segundo a fé: "Lex credendi legem statuat suplicandi".

   Nestas condições, qualquer encontro com a finalidade de realizar a unidade eclesial - da qual jamais nos afastamos, pede:
    1. que, sem a menor censura ou constrangimento, possamos celebrar  sempre a SANTA MISSA, de acordo com o Ordo tradicional, chamado impropriamente de São Pio V.
   Achamos este ponto capital. Pois, como católicos apostólicos romanos, interessa-nos não somente o problema de Campos, mas também, e principalmente, o de toda a Santa Igreja. Toda a crise contemporânea procede da diminuição da Fé, que o Vaticano II e as inovações dele decorrentes, entre elas o Novo Ordo, introduziram no seio da Igreja.
   2. em conseqüência, que não sejamos impedidos de defender e propugnar a Fé, o que aconteceria se nos obrigassem a não censurar o novo "Ordo Missae", e a dele não afastar os fiéis.
   3. que sejam reparadas as injustiças e difamações de que fomos objeto.
   Os padres precisam aparecer diante do povo como realmente são: íntegros e puros na Fé, e não debaixo da suspeição de hereges, cismáticos ou rebeldes. Ademais, é contra a Moral a pessoa aprovar, cismáticos ou rebeldes. Ademais, é contra a Moral a pessoa aprovar, mesmo que apenas com seu procedimento, uma injustiça e, mais ainda, difamações que prejudiquem o cumprimento de seu dever.
   E aqui nos perguntamos sobre a viabilidade deste ponto, uma vez que V. Exa., ao mesmo tempo que nos convida para o diálogo, acaba de punir dois sacerdotes tradicionalistas incardinados na Diocese, retirando-lhes a jurisdição.
   4. Enfim, para se evitarem os inconvenientes das reuniões passadas, e assim não caminharmos rumo ao desconhecido, é necessário que V. Exa. nos mande por escrito quais as propostas concretas desta sua atual atitude.
  
   Fora destes contornos, parece-nos que um encontro, longe de contribuir para a unidade eclesial, só serviria para criar confusão.

   Certos de que V. Exa. levará na devida consideração estas nossas ponderações, com nossos melhores votos, subscrevemos-nos
                                       pelos 25 sacerdotes
                                  servo em N. S. Jesus Cristo,

                                                        _________________________
                                                               Mons. Licínio Rangel
Campos, 25 de janeiro de 1984.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

"UNIDOS EM DEFESA DA FÉ" ( IV )

  O novo bispo da Diocese de Campos, Sua Exa. Revma.. D. Carlos Alberto Navarro escreveu-nos uma carta datada de 22 de outubro de 1982 onde, de maneira irônica e capciosa, pede que nós mesmos apresentemos uma solução concreta para o impasse: ficar dentro da Igreja visível, discordando, porém, do Papa e do Bispo.
   Eis a nossa resposta:

Exmo. e Revmo. Sr.
Dom Carlos Alberto Navarro              
DD. Bispo Diocesano
                                                       Laudetur Jesus Christus!

   Apresentamos a V. Exa.  as homenagens que devemos a nosso Bispo Diocesano, e passamos a responder à questão que V. Exa, nos impôs na carta de 22 de outubro do corrente.
   A demora na resposta procede da dificuldade em entender a questão. Vossa Excelência pede-nos que apresentemos uma sugestão concreta que nos permita ficar dentro da Igreja visível, discordando, porém, do Papa e do nosso Bispo.

   1. Pedimos licença para lembrar que, na nossa resposta ao decreto de Vossa Excelência, manifestamos a dificuldade de atender ao seu primeiro ponto. Este nos impunha a explícita e pessoal aceitação de uma decisão do Santo Padre. No entanto, V. Exa. não nos indicava, de modo claro, qual seria essa decisão pontifícia e onde ela se acharia, e a nós não nos seria possível acatar uma decisão que não conhecíamos. Dizíamos, depois, que, devido às limitações apresentadas pelo novo Ordo Missae, na profissão de Fé nos dogmas eucarísticos, ele se tornava ambíguo e inaceitável.
   V. Exa., agora, também não diz quais as determinações do Papa, cuja recusa envolveria, de nossa parte, uma rejeição do próprio Romano Pontífice como tal, e, em conseqüência, de V. Exa. como nosso Bispo Diocesano. De maneira que não vemos a procedência da questão que V. Exa. nos impôs.
   Permita-nos V. Exa. observar que a questão, no caso, seria propriamente outra, a saber: Como poderia um fiel, sacerdote ou leigo, conservar-se dentro da unidade visível da Igreja, aceitando um Ordo Missae reconhecidamente ambíguo, que não distingue nitidamente a liturgia católica da liturgia, por exemplo, luterana? Como poderia mostrar-se ele ao mundo, como fiel católico, admitindo um culto que serviria também para a liturgia de uma seita herética?
   Em outras palavras: que entende V. Exa. por pertencer à Igreja visível? Será que não pertenciam à unidade visível da Igreja de Cristo os que não seguiram Honório I ao mandar silenciar as duas vontades em Jesus Cristo? Será que estavam fora da unidade visível da Igreja os Santos que discordaram de Pascoal II e a ele se opuseram, na questão das investiduras?
   Esperamos ter dado a V. Exa., com respeito e franqueza, a possível resposta à questão que V. Exa. nos impôs. Pedimos, novamente, excusas pela demora em responder, à vista da, como dissemos, dificuldade de entender a questão proposta.

  2. Esta resposta é redigida quando V. Exa. já iniciou a aplicação das penas cominadas contra os padres fiéis à Missa Tradicional. Realmente, V. Exa. acaba de despedir da Diocese os Revmos. Pes. Edmundo Gutierres Delgado, Vigário de Cambuci, e José Olavo Pires Trindade, Vigário de Miracema.
   V. Exa. declara que essa ordem de se retirar da Diocese não é punição. Acreditamos que assim o diga para minorar - se é que minora - o impacto de uma expulsão, que é a que se reduz a brusca dispensa do ministério e o reencaminhamento às dioceses onde eles estão encardinados.
   Não podemos deixar de dar aos nossos colegas o conforto de nossa solidariedade. Eles, já há dez anos, aqui exercem seu zelo pela salvação das almas. E são agora postos na rua, sem o menor reconhecimento pelo trabalho apostólico abnegado e freqüentemente heróico em benefício de paróquias desta Diocese.
   Merecem nossa especial solidariedade porque são assim punidos em virtude de se manterem fiéis à Missa tradicional católica, sem ambigüidades nem extenuações na Fé. De fato, essa foi a razão invocada por V. Exa. quando cominou as penas que agora, com grande rigor, passa a aplicar.
   Acresce que, por ironia dos tempos, estamos na época em que o episcopado, através da CNBB, se proclama a defensora dos direitos dos posseiros contra os proprietários legais de terras. Seria injurioso equiparar nossos caríssimos colegas a posseiros invasores. Acreditamos, por isso mesmo, que não se lhes pode negar o direito adquirido, em 10 profícuos anos de trabalho, de continuar aqui seu apostolado, tanto mais quanto se timbra em afirmar que o bilhete de "retire-se" não é uma punição!
   Sr. Bispo, não seríamos leais a V. Exa. se não externássemos estes sentimentos que em nós desperta o golpe que atingiu nossos colegas no apostolado e na defesa da integridade de nossa Fé. E não estaríamos bem com nossa consciência se assistíssemos impassíveis aos sofrimentos a que são injustamente submetidos por sua fidelidade aos Santo Sacrifício da Missa.

   Apresentamos a Vossa Excelência as nossas orações.
Campos, 10 de novembro de 1982.

Seguem-se as assinaturas dos padres.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

"UNIDOS EM DEFESA DA FÉ" ( III )

NOSSA  POSIÇÃO

AOS FIÉIS DE NOSSAS PARÓQUIAS

   Nossos paroquianos e inúmeros outros fiéis olham para nós com ansiosa expectativa. Que resposta demos à intimação feita pelo Sr. Bispo Diocesano através do Decreto de 25 de agosto do corrente? Aceitamos ou não o novo "Ordo Missae".
   Neste momento crucial, em que se suspeita da ortodoxia de nossa fé e se põe em dúvida nosso acatamento à autoridade sagrada do Papa; em que somos ameaçados de demissão de nossos cargos e de outras severas penas, mais do que em nenhum outro momento de nossa vida, não poderíamos omitir uma palavra de esclarecimento para aqueles que sempre confiaram em nós.
   Nosso silêncio causaria grave escândalo aos fiéis, diante dos quais temos o dever de dissipar qualquer dúvida sobre a coerência de nosso procedimento com a Fé Católica.
   É, pois, diante de Deus, Juiz supremo que um dia nos vai julgar a todos nós, que fazemos esta declaração. Temos presentes as conseqüências que nos possam advir da parte dos homens, mas tememos muito mais as que nos adviriam da parte de Deus.

   I - Somos sacerdotes católicos apostólicos romanos, filhos da Santa Igreja, que amamos com todas as veras de nossa alma e em cujo seio queremos viver e morrer, como esperamos pela graça de Deus.
    Renovamos, pois, nossa profissão de Fé, já conhecida de nossos fiéis. Mais particularmente, declaramos que damos plena e amorosa adesão e obediência ao Santo Padre, o Papa, Vigário de Jesus Cristo na Terra, Chefe visível da Igreja. Aceitamos todos os direitos e atribuições, honras e privilégios que ao Romano Pontífice conferem a Tradição e o Direito Canônico, dentro dos limites especificados no Concílio Vaticano I, ao definir o dogma da Infalibilidade Pontifícia. Reconhecemos o primado e o magistério do Papa sobre a Igreja Universal, Pastores e fiéis. Baseados, no entanto, na Tradição, não temos dúvida em afirmar que uma medida que ponha em risco a pureza e a integridade da Fé não deve ser aceita, seja qual for o Superior que a ordene.
   É esta doutrina da Igreja que nos leva a, em consciência, não poder aceitar e pôr em prática a nova ordenação da Santa Missa, instaurada em 1969.
    Toda obediência na Igreja está condicionada à fidelidade à Fé. Ora, nessa nova ordenação do Santo Sacrifício do Altar, extenuam-se e obscurecem-se os dogmas eucarísticos: da Presença Real e substancial de Jesus Cristo na Hóstia Consagrada; da Transubstanciação; da Missa como verdadeiro sacrifício propiciatório; do sacerdócio hierárquico especificamente distinto do sacerdócio comum dos fiéis. E no nº 7 da "Institutio", que precede e explica o novo Missal reformado, chega a afirmar, contrariamente ao ensino do Concílio de Trento e de acordo com a doutrina luterana, que a ação sacrifical é de toda a assembléia, e não exclusivamente do sacerdote hierárquico.

   Santo Tomás de Aquino: "(...) havendo perigo próximo para a Fé, os prelados devem ser argüídos, até mesmo publicamente, pelos súditos. Assim, S. Paulo, que era súdito de S. Pedro, argüiu-o publicamente, em razão de um perigo iminente de escândalo em matéria de Fé" (Suma Teol. II-II, 33, 4, 2)

   São Roberto Belarmino: "(...) assim como é lícito resistir ao Pontífice que agride o corpo, assim também é lícito resistir ao que agride as almas, ou que perturba a ordem civil, ou, sobretudo, àquele que tentasse destruir a Igreja. Digo que é lícito resistir-lhe não fazendo o que ordena e impedindo a execução de sua vontade..." (De Rom. Pont.. lib. II c. 29)

   II - Nossa recusa é motivada, portanto, justamente pela obediência aos ensinamentos perenes da Santa Igreja.
         Será justo nos apontarem como rebeldes, desobedientes, cismáticos, se, ao nos dirigirmos aos nossos superiores, usamos as mesmas palavras de S. Bruno de Segni ao Papa Pascoal II: "Eu vos estimo como a meu Pai e senhor (...) Devo amar-vos; porém devo amar mais ainda Aquele que criou a vós e a mim."
   Esta atitude não é perfeitamente coerente com o ensinamento de S. Pedro: "Importa obedecer antes a Deus que aos homens"? (Atos 5,29)
   A resistência é uma forma heróica de obediência. Repitamos com São Bernardo: "Aquele que faz um mal porque lhe mandam, faz menos um ato de obediência do que de rebeldia". (Carta XXIII, em "Cartas Diversas")

   III - Nossa posição, por outro lado, se ajusta ao propósito explícito do Concílio Vaticano II, quando declara, na Constituição sobre a Sagrada Liturgia (Proêmio, nº 4), que: "obedecendo fielmente à Tradição, a Santa Mãe Igreja considera todos os ritos legitimamente reconhecidos com igual direito e honra e, para o futuro, os quer defender e, de todos os modos, favorecer." (grifos nossos)

   Afirmamos, outrossim, que nossa atitude é patrocinada pelo mesmo Concílio Vaticano II, ao estabelecer que, em matéria religiosa, ninguém pode ser impedido por nenhum poder humano de agir segundo a sua consciência, em privado ou em público, só ou associado a outros, desde que se respeitem os direitos alheios segundo a justiça e a benevolência. (Decl. sobre a Liberdade Religiosa, nn. 2 e 7)

   Concluímos dirigindo uma súplica filial e confiante à Virgem Santíssima, Mãe do Sumo Sacerdote e nossa Mãe, para que nos obtenha de Seu Divino Filho a graça de permanecermos fiéis, até à morte, à Missa Católica.

   SUB TUUM PRAESIDIUM CONFUGIMUS, SANCTA DEI GENITRIX.
   DEBAIXO DA VOSSA PROTEÇÃO NOS REFUGIAMOS, Ó SANTA MÃE DE DEUS.

                                             Campos, 26 de setembro de 1982.

     Seguem-se as assinaturas dos 25 padres que eram: Mons. Licínio Rangel; Mons. Dr. Benigno de Britto Costa;
Mons. Francisco Apoliano; Mons. Ovídio Simón; Mons. Henrique Conrado Fischer; Pe. Emanuel José Possidente;
Pe. Fernando Arêas Rifan; Pe. José M. F. Collaço; Pe. Edmundo G. Delgado; Pe. José Moacir Pessanha; Pe. Eduardo Athayde; Pe. Antônio Alves de Siqueira; Pe. Gervásio Gobato; Pe. José Olavo Pires Trindade; Pe. Elcio Murucci; Pe. David Francisquini; Pe. Antônio Paula da Silva; Pe. José Eduardo Pereira; Pe. José Gualandi; Pe. José Ronaldo Menezes; Pe. Alfredo Oelkers; Pe. José Onofre Martins de Abreu; Pe. Alfredo Gualandi.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

"UNIDOS EM DEFESA DA FÉ" ( II )

   Vimos no post anterior que o novo Bispo de Campos, Sua Excia Revma Dom Carlos Alberto Etchandy G. Navarro fez um DECRETO  preceituando que déssemos a resposta por escrito até o dia 25 de setembro. Além da resposta individual, os 25 padres fiéis à Tradição deram uma resposta em conjunto. Eis a carta:

   Exmo. e Revmo Sr.
   Dom Carlos Alberto Etchandy Gimeno Navarro
   DD. Bispo Diocesano

                                                         Laudetur Jesus Christus!

   Em atenção à ordem constante do decreto que Vossa Excelência nos entregou e fez publicar nos jornais de Campos, em 25 de agosto p. p., cabe-nos, respeitosamente, dar a seguinte resposta, que envolve considerações de ordem jurídica e teológica.
   I - Quanto ao aspecto jurídico:
        1. Vossa Excelência não especifica precisamente qual a "decisão do Santo Padre" que devemos acatar, nem nos indica o documento em que o mesmo Santo Padre no-la impõe.
            Nestas condições, torna-se difícil uma resposta precisa, porque não podemos dizer que acatamos, se não sabemos com clareza o que devemos acatar.
        2. Entre os documentos emanados da Santa Sé, não se encontra nem um que exclua formalmente dos livros litúrgicos aprovados o Missal chamado de São Pio V. Quanto a cláusula com que, segundo Vossa Excelência, Paulo VI teria promulgado o Missal Romano restaurado, se ela de fato afirma a validade e eficácia daquilo que estabelece e ordena, de modo algum revoga qualquer Missal preexistente. Em outras palavras, tal cláusula derroga a Bula "Quo primum" apenas enquanto esta obrigava, de maneira exclusiva, o Missal Tridentino.

   II - Quanto ao aspecto teológico, em consciência declaramos:
        1. Somos sacerdotes Católicos Apostólicos Romanos, filhos da Santa Igreja, que amamos com todas as veras de nossa alma e em cujo seio queremos viver e morrer, como esperamos pela graça de Deus.
        2. Como católicos e filhos da Santa Igreja, damos plena e amorosa adesão e obediência ao Santo Padre, Vigário de Jesus Cristo na terra, Chefe visível da Igreja, segundo as determinações constantes do Cap. 4º da Ses. IV do Concílio Vaticano I, que definiu a Infalibilidade Pontifícia (Cf. Denz.-Sch. 3070). Pio IX precisou as delimitações ou contornos do poder papal mais acuradamente, ao aprovar a carta dos Bispos alemães à circular do chanceler Bismark (Denz.-Sch. 3212-3117).
            Aceitamos, pois, todos os direitos e atribuições, honras e privilégios que ao Romano Pontífice conferem a Tradição e o Direito Canônico.
         3. De acordo com essa mesma doutrina católica tradicional, toda obediência na Igreja está condicionada à fidelidade à Fé. A Igreja é uma sociedade constituída para manter a integridade e pureza da Fé transmitida pelos Apóstolos. Ora, esta Fé é que nos impede de poder, em consciência, aceitar a imposição que Vossa Excelência nos faz, no sentido de admitir e pôr em prática o novo "Ordo Missae", uma vez que nele se extenuam os dogmas eucarísticos e há mesmo ensinamento contrário ao depósito revelado no nº 7 da "Institutio Generalis Missalis Romani". De fato, por esse nº 7, contrariamente ao ensino do Concílio de Trento (Ses. XXII. c. 1; Ses. XXIII. c. 1), e de acordo com a doutrina luterana, a ação sacrifical é de toda a assembléia, e não exclusivamente do sacerdote hierárquico.
          4. Se aceitássemos - como gostaríamos, por deferência a Vossa Excelência - a imposição que nos faz, nós nos estaríamos, ipso facto, excluíndo da fé e da mesma Igreja.
          5.  Nos casos em que pode haver perigo para a Fé, os súditos têm o direito, e até o dever, de resistir. (Cf. Inocêncio III, apud Billot, Tract. de Eccl. Christi, Tom. I, pp. 618-619; S. Tomás de Aquino, Summa Theol. II-II, 33, 4, 2 - Ad Gal. 2, 11-14, lect. III, nn. 77, 83-84; - S. Roberto Belarmino, De Rom. Pont., lib. II, c. 29).

   III - Observamos
                              a) que nossa atitude coincide com deliberações do Concílio Vaticano II, segundo as quais nenhum poder humano pode impedir alguém de, em matéria religiosa, agir de acordo com sua consciência (D. Hum. nº 2), desde que mantenha convivência pacífica com os demais cidadãos.
                               b) que nossa posição também se ajusta ao propósito explícito do Concílio Vaticano II, onde este declara que, "atendendo fielmente a Tradição, a Igreja atribui igual direito e honra a todos os ritos legitimamente reconhecidos e quer que no futuro se conservem e fomentem (grifos nossos), por todos os meios." (Sac. Conc., Proem. n. 4).

   IV - Aos que nos acusam de estarmos pondo em dúvida a ortodoxia de "Paulo VI, de João Paulo I e de João Paulo II que adotaram o novo "Ordo Missae", fazemos as seguintes ponderações:
                             O Concílio de Trento lançou anátema contra quem condenasse o rito, que manda dizer em voz baixa as palavras da Consagração na Missa; o novo "Ordo" manda que, em virtude da própria natureza das palavras (Rub. 91; Institutio, nn. 10 e 12), a prece eucarística - portanto também as palavras da Consagração - sejam ditas em voz alta. A aceitação desta segunda proposição envolve a rejeição da primeira, onde haveria, aliás, erro palmar, por estabelecer um rito contrário à própria natureza das palavras a serem pronunciadas! Diriam nossos opositores que quantos aceitam o novo "Ordo Missae" põem em dúvida a ortodoxia de Pio IV, que aprovou o Concílio de Trento, e de seus sucessores até Paulo VI?
                              Queremos notificar, outrossim, que já respondemos a carta de S. Exa. D. Giuseppe Casoria, DD. Pró-Prefeito da Sagrada Congregação dos Sacramentos e do Culto Divino, que V. Exa. nos entregou.
                               Ao enviar esta resposta, renovamos a expressão de nossos respeitos devidos a V. Exa., e apresentamos as nossas orações.
                               De Vossa Excelência Reverendíssima
                                   devotíssimos no Senhor
Campos, 24 de setembro de 1982.

         Seguem-se as assinaturas dos 25 padres fiéis à Tradição



"UNIDOS EM DEFESA DA FÉ" ( I )

   Faz hoje 30 anos que Sua Excia. Revma. D. Carlos Alberto Etchandy Gimeno Navarro tomou posse da Diocese de Campos em lugar de Sua Excelência Reverendíssima Dom Antônio de Castro Mayer.
   Em agosto de 1982 o novo Bispo mostrava bem para o que veio: "Ecce venio ut...!" Eis o  seu decreto:

D E C R E T O
1) A todos e a cada um dos sacerdotes incardinados ou com uso de ordens nesta Diocese de Campos se preceitua:
             a) responder-nos, por escrito, individualmente, até 25 de setembro, se aceita, como esperamos, a decisão do Santo Padre;

             b) a partir do dia 25 de outubro de 1982, o uso EXCLUSIVO dos Livros Litúrgicos aprovados pela Sé Apostólica, e em vigor na Igreja Latina, fazendo-se especial menção da Constituição Apostólica do Santo Padre Paulo VI, de três de abril de 1969, que promulga o Missal Romano restaurado, com a cláusula: "Tudo o que aqui estabelecemos e ordenamos, queremos que seja válido e eficaz agora e no futuro, não obstante qualquer coisa em contrário nas Constituições e Ordenações Apostólicas de Nossos Predecessores e outros estatutos, embora dignos de menção e derrogação especiais";

             c) Se algum presbítero ousar desobedecer a quanto se prescreve neste Decreto, o que esperamos não aconteça, fica desde já canonicamente advertido de que seremos obrigados a dar cumprimento aos Sagrados Cânones, com especial menção dos cc. 2331 §§ 1 e 2  e/ou 2337 §§ 1 e 2, dentro das normas do direito em vigor.

             Este Decreto entra em vigor a partir da data de sua comunicação ao Clero, inclusive para aqueles que se recusarem a recebê-lo, do que o Revmo Chanceler fará fé pública.

            Dado e passado nesta Episcopal cidade de Campos, sob nosso selo e armas, no dia 25 de agosto de 1982, memória de São Luís de França.

Dom Carlos Alberto Etchandy Gimeno Navarro
Bispo Diocesano

Padre Joaquim Ferreira Sobrinho
Chanceler do Bispado


   
D. Fernado Arêas Rifan, DD. Bispo e Administrador Apostólico, numa reunião feita a alguns Congregados Marianos da minha Paróquia, disse que D. Navarro quis jogar a Missa de Paulo VI goela abaixo, mas que não é assim que se faz.  Na verdade só Deus é que pode julgar a culpa de cada um. E esperamos que Deus teve misericórdia de D. Navarro. Afinal é a formação que ele recebeu. Estava obedecendo ao Papa. E sobretudo, ainda um Papa não havia declarado depois do Vaticano II que a Missa chamada de S. Pio V nunca fora abrogada. Este mérito tão glorioso só veio a ser creditado ao nosso queridíssimo Papa gloriosamente reinante Bento XVI.
  Caríssimos e amados leitores, em seguida, se Deus quiser, postarei a resposta dos então 25 padres tradicionalistas de Campos, resposta a este decreto e logo depois o esclarecimento da NOSSA POSIÇÃO, aos fiéis de nossas Paróquias.

  


sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Êxodo XX, 5: legítima interpretação

   Caríssimos e amados leitores, vejamos agora o versículo 5º: "Não te encurvarás a elas nem as servirás; porque Eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a maldade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem".
   Já que o versículo 3º se refere aos deuses estrangeiros: "Não terás outros deuses diante de mim".
   Já que o versículo 4º: "Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra", como já provamos, se refere a imagens de escultura ou figuras destes mesmos deuses estrangeiros ( ou seja: os deuses falsos dos outros povos que eram pagãos idólatras) conclui-se claramente que a proibição de prestar culto, que lemos no versículo 5º se refere a imagens ou figuras destes mesmos deuses pagãos. Bastam os pronomes A ELAS e NEM AS (que sublinhamos no texto) para nos mostrar que é àquelas imagens de que fala o versículo anterior que é proibido prestar culto. No versículo anterior, Deus proibiu FAZER tais ídolos. Mas podia acontecer que os judeus, nas suas viagens ou recebendo visitas de gente de outros povos, se deparassem com tais ídolos que eles, judeus, não tinham fabricado, mas que foram feitos pelos outros. Ou podia acontecer que alguém, mesmo no seio do povo israelita, teimasse em fazer tais ídolos. Neste caso era preciso que soubessem os judeus que também lhes estava proibido, tanto adorá-los, como o prestar-lhes qualquer culto.
   E a prova de que Deus se refere a estes ídolos, a estas representações de deuses falsos, está na razão que Deus lhes apresenta: "Não te encurvarás a elas nem as servirás PORQUE EU SOU O SENHOR TEU DEUS". O que mostra muito bem que, sendo Ele o único Deus dos israelitas, não quer entrar em pé de igualdade com DEUSES ESTRANGEIROS, nem quer ser substituídos por eles.
   Os protestantes provariam que aí Deus está proibindo aos católicos fazer imagens de Jesus Cristo, de Maria Santíssima e dos anjos e santos e reverenciá-las, se conseguissem provar que estas imagens, venerandas e sagradas pelas pessoas que representam, são imagens daqueles DEUSES ESTRANGEIROS, que eram pura invenção do demônio, para afastar os homens do culto do Deus verdadeiro, culto este que nós, católicos, Lhe prestamos, reconhecendo o Seu supremo domínio sobre todas as coisas e reservando a Ele, só a Ele, o culto de LATRIA, ou seja, de verdadeira adoração. Nós não substituímos o culto de Deus pelo de outros deuses, nem pelo de nenhuma criatura.
   Diante, portanto, da legítima interpretação do texto, não há aí nenhuma proibição do culto das imagens, tal como é compreendido e praticado pela Igreja que Cristo fundou, ou seja, a Igreja Católica.

   A interpretação protestante.
   Analisemos agora a interpretação que os protestantes dão ao texto.
   Não é a interpretação verdadeira; mas ainda mesmo que o fosse, a proibição contida neste texto do ANTIGO TESTAMENTO não nos atingiria, assim como eles também não se sentem atingidos por ela. É o que iremos provar.
   Os protestantes separam completamente os dois versículos: para eles o 3º versículo é uma ordem; e o versículo 4º é outra ordem que nada tem que ver com o versículo anterior.
   Aqui o homem menos instruído logo se atrapalha com o sentido da palavra IMAGEM; e desta confusão se aproveita o protestante.
   Hoje, quando falamos em IMAGEM, logo nos lembramos das imagens sagradas, que vemos nas igrejas católicas. Era justamente o que não existia naquele tempo. Não havia imagem de Jesus Cristo, nem da Virgem Maria, nem de São Pedro ou de Santo Antônio ou de São Francisco etc., etc., por uma razão muito simples: é porque nem Jesus como homem, nem Maria Virgem, nem nenhum desses santos existia ainda. Havia, sim, os anjos, DOS QUAIS, como vimos, DEUS MESMO MANDOU FAZER IMAGENS.
   Imagens aí no texto se toma no sentido geral: representação de um ser, mostrando-lhe a semelhança. Uma imagem de escultura é, por exemplo, a estátua de um homem (quando trabalhei em Campos e discutia com algum protestante, eu dava o exemplo da estátua do Pastor Barreto que se vê em frente do Colégio Batista), um animal qualquer: um cachoro, um elefante; um carneiro feito de gesso ou de madeira ou de prata ou de ouro etc.
   Desde que acha o protestante que também para nós está proibido fazer qualquer imagem de escultura, então estão proibidas todas as estátuas. São condenadas pela lei de Deus... É preciso acabar com elas... São proibidos todos os animais feitos por escultura. Entrando numa casa, onde encontra na sala um gato ou um leão ou um cavalo ou um boi fabricado em gesso ou em madeira ou em metal, o "evangélico" deve protestar indignado, porque toda imagem de escultura é proibida por Deus. Tem que acabar, portanto, a profissão de ESCULTOR,  como sendo uma profissão de homens rebeldes e pecadores, que vivem fazendo justamente aquilo que Deus proíbe no seu mandamento.
   Mas não são somente os escultores que entram na dança; entram também todos os PINTORES, DESENHISTAS, GRAVADORES E FOTÓGRAFOS, porque o texto não proíbe somente qualquer imagem de escultura, mas proíbe qualquer FIGURA, SEMELHANÇA, seja de criaturas humanas, seja de astros, seja de animais ou de plantas, seja lá do que for, pois continua assim NEM ALGUMA   SEMELHANÇA  do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas.
   Entrando no atelier de um pintor e encontrando-o a pintar uma figura humana, o protestante terá que protestar: É proibido: Êxodo cap. 20, versículo 4; não podes fazer isto.
   E se o pobre pintor disser: Ao menos, deixe-me pintar um peixe ou outro animal qualquer, uma planta, ao menos uma flor. - Não! está na Bíblia, nada disto é permitido. Não se pode fazer a figura de coisa alguma: nada do que há em baixo na terra, nada do que há nas águas.
   Os livros ilustrados, bem como as fotografias, as gravuras, os desenhos que aparecem nas revistas ou jornais, bons ou maus, todos são proibidos.
   Ora, esta interpretação é evidentemente absurda. Não foi assim; Deus só proibiu fazer figuras de DEUSES ESTRANGEIROS, fosse qual fosse a forma sob a qual se apresentassem.
   E mesmo que se quisesse dizer que Deus falava sobre qualquer imagem ou figura em geral, ainda se poderia conceber que houvesse esta proibição PARA OS JUDEUS num tempo em que não havia ainda imprensa nem fotógrafos. Podia-se ainda imaginar que Deus, diante do grande perigo em que estavam os judeus de cair na idolatria pelo exemplo dos povos vizinhos, proibisse a este pequenino povo a arte dos pintores e dos escultores, afim de se evitar a ocasião de pecado. Seria então UM PRECEITO POSITIVO SÓ PARA ELES E OCASIONADO PELAS CIRCUNSTÂNCIAS. Mas querer fazer daí um preceito geral para todos os tempos, mesmo para os povos cristãos e civilizados que não estão mais, pelo simples fato de ver uma pintura ou uma estátua, em perigo de cair na idolatria, seria evidentemente cair no ridículo.
   O protestante, portanto, se não quer admitir que este versículo 4º se refere aos deuses estrangeiros, mencionados no versículo precedente, fazendo parte, portanto, da LEI NATURAL, como é em geral todo o Decálogo, tem que admitir que se trata de um preceito positivo só para os judeus. A não ser que queira apresentar como abomináveis e condenados por Deus todas as estátuas, todos os objetos de adorno em forma de figuras humanas ou de animais, todos os brinquedos de criança feitos no mesmo sistema, todas as pinturas, todas as gravuras de livros, todas as fotografias...

   Mas dirá o protestante: Deus não proíbe somente fazer imagens. Proíbe PRESTAR-LHES CULTO no versículo 5º e os católicos prestam culto às imagens. Resposta: É o caso de perguntar: Se você é obrigado a admitir (para não cair no ridículo) que o versículo 4º é endereçado só AOS JUDEUS, como pode provar agora que o versículo 5º, ou seja a proibição de prestar culto às imagens não é também um preceito SÓ para eles? Este versículo 5º está. não só logicamente, mas também GRAMATICAMENTE ligado ao versículo 4º. Um preceito que era SÓ PARA OS JUDEUS não nos atinge a nós, cristãos.

   CONCLUSÃO: Nós católicos sabemos muito bem que estamos obrigados a NÃO COMETER NENHUM ATO DE IDOLATRIA. Esta é uma lei natural, escrita nos nossos corações; e uma lei cristã, constantemente pregada pelos Apóstolos, como por exemplo: "Nem os idólatras... hão de possuir o reino de Deus" (1 Cor. VI, 9 e 10); "Meus caríssimos, fugi da idolatria" (1 Cor. X, 14).
   Mas o nosso culto às imagens está muito longe de ser uma idolatria, porque 1º, como já explicamos, as nossas imagens não são ídolos (ídolo é a representação de um deus falso); 2º, não prestamos a elas o culto de adoração ou latria (pois isto seria reconhecer-lhes o supremo domínio sobre todas as coisas), culto este que só prestamos a Deus.
   E, como já esclarecemos no princípio, este culto não é obrigatório no sentido de que só se salva quem rezar diante das imagens, ou que só se possa fazer oração diante delas. Mas a Igreja o conserva como um MÉTODO utilíssimo para instruir os fiéis, para avivar sempre no espírito de todos, até mesmo dos mais rudes, a lembrança das coisas celestiais e para melhor fomentar nos seus filhos o fervor, a piedade e a devoção.
  

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

LEGÍTIMA INTERPRETAÇÃO: ÊXODO XX, 3, 4 e 5.

   Os protestantes citam este texto da Bíblia para acusar a Igreja Católica de idolatria, ao fazer e venerar as imagens dos santos.
   Como já provamos anteriormente, os católicos veneram as imagens dos santos, mas os protestantes, fazendo jus ao seu verdadeiro nome, protestam que nós católicos adoramos imagens. Protestam, portanto, que somos idólatras como os pagãos, e, portanto desobedecemos o primeiro mandamento do Decálogo.
   Caríssimos e amados leitores, não será difícil desfazer tão grave acusação. É só vermos a verdadeira interpretação do texto do Êxodo XX, 3-5 e do Deuteronômio V, 7-9 que são iguais. 
    Vamos examinar o texto do Êxodo XX, 3-5:
     Versículo 3: "Não terás OUTROS DEUSES diante de mim.
     Versículo 4: "Não farás para ti IMAGEM DE ESCULTURA, NEM  ALGUMA SEMELHANÇA DO  QUE HÁ EM CIMA NOS CÉUS, NEM EM BAIXO NA TERRA.
     Versículo 5: "NÃO TE ENCURVARÁS A ELAS NEM AS SERVIRÁS; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a maldade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem". 
   Vê-se claramente que estas imagens e semelhanças de que Deus fala no versículo 4º são as imagens dos deuses falsos ou ídolos dos pagãos. Se no versículo 4º  Deus diz que não façam imagem de escultura, nem alguma semelhança (ou figura) do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, entende-se que Deus não fala aí de qualquer espécie de desenho ou de pintura ou de escultura (pois assim estaria proibindo até o termos em casa o retrato de nossos pais, ou qualquer pintura decorativa representando flores, bichos, peixes, aves, pássaros etc.), mas sim de ídolos, de figuras de pessoas, ou de animais, ou de astros, ou de outras coisas. Tudo era deus, exceto o próprio Deus. Por isso Deus proíbe os outros deuses ( ou deuses estrangeiros), SEJA QUAL FOR A FORMA SOB A QUAL ELES SE APRESENTEM. 
    E a prova de que Deus aí não se refere a qualquer imagem, a qualquer semelhança, a qualquer pintura, está no fato de que Deus mesmo mandou Moisés FAZER uma serpente de metal (se há proibição de fazer qualquer figura ou semelhança de tudo o que há em cima no céu, e DO QUE HÁ EM BAIXO NA TERRA, a serpente é um animal que há em baixo na terra): "E o Senhor lhe disse: FAZE UMA SERPENTE DE METAL, e põe-na sobre uma haste: todo o que sendo ferido olhar para ela, viverá. Fez, pois , Moisés UMA SERPENTE DE METAL e pô-la sobre uma haste; e era que, mordendo alguma serpente a alguém, olhava para a serpente de metal, e ficava vivo". (Números, XXI, 8 e 9).
   Não creio que "os crentes" protestem contra o próprio Deus! Mas já encontrei pastor que me disse com ar de triunfo: você não sabe que o rei Exequias mandou destruir esta serpente? Respondi: Sei, sim senhor. Estudei e estudo as Sagradas Escrituras já durante muitos anos. Mas sr. pastor você quer dizer com isto que Deus errou e Exequias fez certo? - Não recebi resposta. Então eu lhe disse: Isto prova mais uma vez que Deus proibiu fazer imagem de qualquer coisa como ídolo para ser adorado como um deus. O rei Exequias mandou destruir aquela serpente porque justamente o povo passou, depois de alguma tempo, a considerar aquela serpente como se fosse uma deusa, inclusive queimando incenso diante dela, o que significava adoração. 
   Esta imagem de serpente em escultura era prefigurativa de Jesus na Cruz. É o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo quem o disse: "Como Moisés no deserto levantou a serpente, assim importa que seja levantado o Filho do Homem, para que todo o que crê n'Ele não pereça, mas tenha a vida eterna" (S. João, III, 14 e 15). 
   Deus mandou Moisés fazer também dois querubins de ouro (com faces e com asas, portanto, representação em escultura, ou seja imagens de pessoa humana com asas). E é assim que a Igreja Católica representa os anjos, como Deus mesmo indicou. E em Êxodo XXV, 22 Deus disse:"E ali virei a ti, e falarei contigo de cima do propiciatório, do meio dos dois querubins (que estão sobre a arca do testemunho), tudo o que eu te ordenar para os filhos de Israel". Será que os protestantes teriam a ousadia blasfema de dizer: Deus não teria um outro lugar melhor para falar a Moisés do que entre duas imagens!?  Quando trabalhei nos Hospitais em Campos como Capelão, encontrei um doente protestante. Logo pegou a sua Bíblia e abriu em Êxodo XX e mandou eu ler. Eu disse-lhe: vire três folhas e leia primeiro o capitulo XXV, versículos 17-22. Ele leu e depois disse-me: Sr. padre, isto o pastor nunca leu para nós!  - Eu falei: é claro! ele só lê para vocês o que eles acham que é contra a Igreja Católica.  
   Portanto, quando os protestantes dizem, procurando impressionar a gente simples: Os católicos estão contra a Bíblia, porque a Bíblia proíbe FAZER IMAGENS e eles fazem imagens de Jesus Cristo, de Maria, dos anjos e dos santos, trata-se de uma acusação muito fora de propósito. Deus proibiu aí no texto do Êxodo fazer imagens dos DEUSES FALSOS ( falsos porque só há um Deus Verdadeiro, Vivo e Eterno) pois é dos deuses pagãos (que são ídolos) que Ele está falando. E a prova é que Ele mesmo mandou fazer outras imagens e Deus não cai em contradição consigo mesmo. Nem se concebe que Deus, tendo horror a quaisquer imagens, como querem os protestantes, fosse o primeiro a mandar fabricá-las.
   E baste ler com atenção o Pentateuco, se não quisermos falar em todo o Antigo Testamento, para ver como a grande preocupação, se assim se pode dizer, de Deus, era fazer com que aquele povo pequenino, cercado como estava, de tantos povos idólatras, não se deixasse contaminar pelo exemplo dos outros, adorando os deuses estranhos. Basta conferir algumas passagens: Gêneses, XXXV, 2; Êxodo XX, 23; Êxodo XXIII, 23; Êxodo XXIV, 14; Levítico XIX, 4; Números XXXIII, 4; Deuteronômio VI, 14; Deuteronômio VIII, 19; Deuteronômio XXVIII, 36 e 37; Deuteronômio XXXII, 16.
   Na próxima postagem, veremos a interpretação do versículo 5º do capítulo XX do Êxodo.
  
       

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A CONSUMAÇÃO DO SACRIFÍCIO: A COMUNHÃO

   Nos sacrifícios do Antigo Testamento, o povo gostava que por qualquer sinal Deus lhe fizesse saber que o sacrifício era aceito por Ele e que Lhe era agradável. As vezes, como sinal, Deus mandava fogo do céu para consumir á vítima. E algo de análogo encontramos na imolação do Calvário. Deus, ressuscita o seu Filho e consome pelo fogo do amor as imperfeições do seu corpo mortal, para lhe conferir num grau superior todas as qualidades dos corpos gloriosos e, porque de certo modo se tornou espírito vivificante, para lhe permitir uma ação santificante sobre as almas. É sobretudo na Eucaristia que aparece este papel santificante : "Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna e eu o ressuscitarei no último dia" (S. Jo. VI, 54). Por isso, Jesus ressuscitado aparece subitamente no meio dos apóstolos reunidos no Cenáculo. São Paulo, depois de ter observado que os sacerdotes antigos tinham necessidade de sucessores, porque eram mortais, acrescenta: "Mas Ele, porque permanece para sempre, tem um sacerdócio que não passa. Por isso pode salvar perpetuamente aqueles que por Ele se aproximam de Deus, sempre vivo para interceder por nós" (Heb. VII, 24). Depois de cumprir a sua missão, depois de confirmar a fé dos apóstolos, e de lhes explicar o reino de Deus, passados quarenta dias depois da sua ressurreição, subiu ao céu, onde está sentado à direita do Pai, e onde pede e ora constantemente por nós, mostrando as cicatrizes das suas chagas gloriosas. Jesus é, portanto, no céu, o nosso Soberano Pontífice. Mas está também em estado de vítima.  São João no Apocalípse diz que viu   um Cordeiro vivo mas como se estivesse sido imolado. É certo que no céu, Cristo não oferece um sacrifício no mesmo sentido que no Calvário e nos nossos altares, mas aparece diante do Pai como tendo sido imolado outrora, com as cicatrizes gloriosas das suas chagas e na qualidade de vítima que lhe pertence tanto como a de sacrificador. Daqui se conclui que o sacrifício inaugurado na terra atinge no céu a sua consumação, no sentido de que Jesus não só recebe a recompensa do seu sacrifício, mas continua o papel de mediador e de sacerdote, não cessando nunca de se oferecer e de interceder por nós (Heb. VII, 25). É do céu ainda, que Ele faz descer sobre nós uma chuva ininterrupta de bênçãos, que nos permite participar dos frutos da redenção.

   Em certos sacrifícios antigos, os sacerdotes e os fiéis que apresentavam a vítima consumiam uma parte, para deste modo entrarem em comunhão com ela e com a divindade, à qual havia sido consagrada. Este ato, então meramente simbólico, encontra-se em toda a sua realidade no sacrifício oferecido por Cristo. Se Jesus subiu ao céu, fê-lo, segundo a sua promessa, para nos preparar um lugar para, enquanto vivermos na terra, nos tornar participantes das graças que nos mereceu. Estas graças, obtemo-las nós pelos sacramentos e sobretudo pela Eucaristia, que, ao dar-nos Jesus, nosso sacerdote e nossa hóstia, faz-nos participar dos seus pensamentos, dos seus sentimentos e virtudes. Mas podemos também obtê-las pela comunhão espiritual, que perpetua os efeitos da comunhão sacramental, ao levar-nos a pensar, a falar, a atuar sempre em união com Jesus. Caríssimos e amados leitores, ditosas as almas que vivem em união habitual com Jesus, sacerdote e vítima!. A sua transformação será total: em vez de se deixarem guiar por pensamentos egoístas, pelo desejo de agradar aos homens, pela curiosidade, pela vaidade ou pela sensualidade, fixaram toda a sua atenção em Nosso Senhor Jesus Cristo, o único a quem querem agradar. Para essas almas, Jesus é o centro de toda a vida. É por Ele, com Ele e n'Ele que elas oram, trabalham e vivem. Podem dizer com São Paulo: "Eu vivo, mas não sou eu que vivo: é Jesus que vive em mim"; "a minha vida é Jesus".
   Na próxima postagem vamos meditar nestas palavras: POR ELE, COM ELE E NELE.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Jesus se imola como Vítima

   A IMOLAÇÃO: Começa com a dolorosa Paixão, no horto das Oliveiras com a agonia do Getsêmani, e tem o seu remate no Calvário. Antes porém de se deixar imolar pelos carrascos, Jesus quis oferecer-se de novo como vítima, desta vez num verdadeiro sacrifício, acompanhado de ritos misteriosos - o sacrifício da Ceia. Depois de ter celebrado a antiga Páscoa com os apóstolos, dá início, por assim dizer, à nova Páscoa, e institui um sacrifício que se perpetuará nos altares até ao fim dos tempos. Tomando o pão, abençoa-o e dá-o aos apóstolos, dizendo: "Comei, isto é o meu corpo, dado e entregue por vós". E tomando o cálice do vinho, acrescenta: "Bebei dele todos; é o meu sangue, o sangue da nova aliança, que é derramado por vós e pela multidão dos homens em remissão dos pecados". Jesus sabe que vai ser imolado no dia seguinte e oferece antecipadamente ao Pai a sua imolação, a efusão do seu sangue, a sua morte, para patentear publicamente aos Apóstolos que se entrega livre e voluntariamente à morte expiatória e às torturas físicas e morais que a acompanharão. A Ceia é, portanto, um verdadeiro sacrifício, porque é um dom antecipado da vítima que será imolada no dia seguinte.
   É por esta mesma razão que Jesus é chamado sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque. Com efeito, Melquisedeque oferecera a Deus pão e vinho. Ora, é sob as espécies de pão e de vinho que Jesus se oferece ao Pai e se dá aos Apóstolos. A santa missa celebrada hoje nos nossos altares é uma reprodução do sacrifício da Ceia, com a diferença de que o sacerdote oferece atualmente a vítima outrora imolada no Calvário, ao passo que Cristo oferecia no Cenáculo a vítima que ia ser imolada no dia seguinte.
   Jesus pode agora começar a sua dolorosa Paixão. Deve mesmo começá-la, já que com as palavras que disse na Ceia se votou à morte.
   É exatamente isto que Jesus faz. Entra nos Horto das Oliveiras, onde vai ter agonia e suar sangue. Jesus deixa que a sua imaginação Lhe represente, de uma maneira clara, todas as torturas e humilhações que há de sofrer no dia seguinte. Fica tão sensibilizado, que sente medo, tédio e uma tristeza muito profunda. Jesus vê-se , sobretudo, como cabeça de um corpo místico de que nós somos membros, carregado com o peso dos nossos pecados, sente-se como que submergido pela vaga de todas as iniquidades humanas, em face do Deus de toda a santidade. Uma tristeza mortal apodera-se da sua alma e pelo seu corpo cansado perpassa um suor de sangue. "Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice. Mas não se faça como eu quero, mas como tu queres" (S. Mat. XXVI, 39).
   E o martírio começa. Traído por Judas, renegado por Pedro, abandonado por quase todos os seus discípulos, é vilipendiado, insultado, ferido pelos servos do Sumo Sacerdote, condenado pelo Sinédrio por se ter confessado Filho de Deus, condenado por Pilatos que proclamara momentos antes a sua inocência. Flagelado, coroado de espinhos como um rei fantoche, carregado de um pesado lenho, sobe penosamente o Calvário, estende os seus membros doloridos sobre a cruz, vê as suas mãos e os seus pés perfurados pelos cravos, ouve os insultos e os sarcasmos dos escribas e dos fariseus, que o convidam ironicamente a descer do patíbulo, se é verdadeiramente o Messias, o Filho de Deus. E em vez de se vingar, suplica ao Pai que lhes perdoe, porque, diz Ele, "não sabem o que fazem" (S. Luc. XXIII, 34).
   E enquanto o seu corpo é torturado pelos algozes e a sua alma se angustia ao pensamento de que muitos não tirarão proveito do seu sangue, que faz Jesus, o Soberano Pontífice, no altar da cruz? Renova o dom de sua vida, já tantas vezes feito: "Eu sou o Bom Pastor. O Bom Pastor dá a vida pelas suas ovelhas... ninguém me tira a vida, mas sou eu que a dou; eu tenho o poder de a dar e o poder de a tomar; tal é a ordem que recebi de meu Pai" (S. Jo. X, 11-18). Esta ordem foi tão bem cumprida que podia dizer com toda a verdade: "Tudo está consumado". Os sacrifícios figurativos do Antigo Testamento são substituídos pelo único verdadeiro sacrifício. As profecias estão cumpridas, em particular a profecia de Isaías anunciando com antecipação de séculos os sofrimentos e a morte do Homem das dores.
   Jesus acabou a sua obra, cumpriu toda a justiça. Sofreu, sem se queixar, as mais espantosas torturas do corpo e da alma. Sofreu-as por amor, por amor do Pai, a quem queria glorificar, e por amor dos homens, a quem queria salvar. Já só Lhe resta permitir que a morte se apodere da sua vítima voluntária. É  o que Ele faz, depois de se oferecer pela última vez como hóstia ao Pai: "Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito" (S. Luc. XXIII, 46).
   Nosso Senhor Jesus Cristo expira. Deus foi glorificado como nunca tinha sido, e os homens foram salvos, pelo menos de direito. Resta aos homens fazer seus pela fé e pela caridade, pelas obras e pela recepção dos sacramentos, os méritos do Redentor. Ao fazê-lo consumarão o sacrifício de Cristo e comungarão com Jesus-Vítima. É o que meditaremos, se Deus quiser, na próxima postagem.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Jesus se oferece como Vítima

   A OBLAÇÃO DA VÍTIMA: Como já dissemos, no mesmo instante em que o Filho de Deus se encarnava no seio virginal de Maria Santíssima, era constituído Sacerdote Soberano. Sabendo que os sacrifícios da Lei Antiga não podiam glorificar ao Pai como Ele o merece, Jesus Cristo apresenta-se diante d'Ele e oferece-se como vítima. Assim começa o primeiro sacrifício verdadeiro e digno deste nome: sobre o altar puríssimo do coração de Maria Santíssima, o Verbo Encarnado oferece, como sacrificador, uma vítima, e esta vítima é Ele mesmo. Jesus oferece-se inteiramente: corpo e alma. É o seu corpo que um dia imolará na cruz e que, até que chegue o seu dia, vai sacrificando pela prática da mortificação. É a sua alma, com todos os seus pensamentos, desejos, afetos, volições, que não cessará de imolar sob a espada da obediência até o dia em que, no Calvário, completará o seu sacrifício pelo supremo ato de amor. "Aniquilou-se a si mesmo, tomou a forma de servo e fez-se obediente até a morte, e morte de cruz". Toda a vida de Jesus será uma cruz e um martírio voluntários. Será mártir desde o momento da Encarnação. Seu primeiro olhar é para o Pai, a quem constantemente oferece, em seu nome, os mais perfeitos atos de religião e expiação. O seu segundo olhar é para nós: olhar de comiseração e amor para com os pecadores, que vem salvar com o seu sangue; olhar de afetuosa ternura para os justos, que ama já como membros do seu corpo místico e nos quais deseja crescer e aumentar para lhes comunicar os tesouros da sua vida divina. Por todos eles, Cristo oferece ardentes súplicas, que são ouvidas em virtude da dignidade da sua pessoa, (Heb. V, 7). Maria Santíssima, que traz em seu seio puríssimo o Verbo Encarnado, já começa a exercer o seu papel de colaboradora secundária na obra da nossa Redenção; e também o papel de Medianeira de todas as graças.
   Depois de nove meses, Jesus nasce e os seus não o receberam, diz São João, I, 2). Já São Lucas constata dolorosamente que Jesus nasce num estábulo, porque não havia lugar para sua Mãe e para Ele na hospedaria. (S. Luc. II, 7). Assim, ao chegar ao mundo já sofre o frio da estação e o dos corações da maioria. Sofre a penúria da pobreza e mais ainda a ingratidão dos homens. E não cessará de ser vítima. No dia da Circuncisão, cerimônia humilhante e dolorosa, derrama as primeiras gotas de sangue para confirmar a intenção de o derramar um dia até à última gota por nós. Perseguido por Herodes, é obrigado a tomar o caminho do exílio e quando, após a morte do tirano, regressa à Palestina, é para se encerrar numa pobre casa de Nazaré, aldeia desconhecida da Galileia, e passar aí trinta anos na obscuridade, na obediência, no trabalho manual, de tal modo escondido, que os compatriotas o olham como um vulgar carpinteiro. A sua vida pública não será, com exceção de algumas alegrias e sucessos passageiros, senão um longo martírio. Desde o início que os Fariseus e os Escribas O perseguem, a princípio com suspeitas, depois, com inveja e ódio; armam-Lhe constantes ciladas, procuram contrariar a sua influência sobre o povo. Se, na verdade, consegue fazer alguns discípulos fiéis e converter alguns pecadores insignes, não há dúvida de que a massa do povo permanece indiferente ou hostil, porque não pode reconhecer o Messias glorioso tão ansiosamente esperado, num jovem Rabi tão humilde e tão modesto, que em vez de conviver com os grandes e preparar o triunfo temporal do seu povo, visita os humildes, os aflitos, os pobres, os publicanos e os próprios pecadores. Como devia ter custado a Jesus ver-se assim incompreendido e desprezado, apesar de tantos milagres, que eram outros tantos sinais que provavam a divindade da sua missão e da sua pessoa! Mas, caríssimos leitores, tudo isto não era mais do que o prelúdio do autêntico sacrifício. Jesus será imolado como vítima. É o que veremos, se Deus quiser, na próxima postagem.  

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

JESUS, SACRIFICADOR E VÍTIMA

   Nos sacrifícios do Antigo Testamento, o sacerdote era distinto da vítima. Escolhia-se como vítima para os sacrifícios sangrentos, que eram considerados os mais perfeitos, um ser vivo, normalmente um animal doméstico, que era mais indicado para substituir o homem, visto que lhe pertencia. Este animal era oferecido a Deus, segregado de todo o uso profano, e consagrado ao serviço e honra da divindade. Era em seguida imolado, para mostrar que o pecador, depois de ofender a Deus, já não tem direito de viver e merece a morte. Depois de ser queimado, em certos sacrifícios, uma parte da vítima, comia-se a outra porção, para comungar assim com a vítima e, por ela, com a divindade. A união com Deus, despedaçada pelo pecado, era, portanto, após a glorificação da divindade, o fim a que tendia o sacrifício.
  Assim, pois, três atos principais constituíam o sacrifício: a OBLAÇÃO, a IMOLAÇÃO, a COMUNHÃO, também chamada consumação.
   Todos estes sacrifícios eram figuras e símbolos que preparavam o sacrifício verdadeiro, aquele que o Homem-Deus, Soberano Sacerdote da Nova Lei, devia oferecer para glorificar a Deus e salvar os seus irmãos. Mas Deus tem direito a homenagens infinitas. Para lhas tributar e reparar a ofensa feita a Deus pelo pecado, era necessário um sacrifício de valor moral infinito. Para que assim fosse, Jesus, nosso Soberano Sacerdote, quis ser não apenas o SACRIFICADOR, mas também a VÍTIMA. Assim, sob este duplo aspecto (de sacrificador e vítima ao mesmo tempo) o Sacrifício por Ele oferecido teria verdadeiramente um valor infinito, porque a dignidade dum sacrifício depende da dignidade da pessoa que o oferece e da vítima que é oferecida. Ora, Jesus, sacerdote e vítima, não é outrem senão o Homem-Deus, isto é, uma pessoa infinita porque divina.
   Vamos, se Deus quiser, compreender tudo isto melhor ainda, meditando sucessivamente, nas postagens seguintes, os três grandes atos que constituem este sacrifício de um valor infinito, isto é, falaremos da OBLAÇÃO: Jesus se oferece como Vítima; em outra postagem, falaremos da IMOLAÇÃO: Jesus se imola como Vítima; e finalmente em outra postagem, falaremos da CONSUMAÇÃO ou COMUNHÃO: Jesus ressuscita, sobe aos Céu e lá está sempre vivo a interceder por nós; pelos sacramentos e especialmente pela Eucaristia, Jesus faz-nos participantes dos seus pensamentos, dos seus sentimentos e virtudes. Há também a comunhão espiritual que perpetua os efeitos da comunhão sacramental.

domingo, 23 de outubro de 2011

Jesus Cristo, Sacerdote por excelência.

2 - JESUS SATISFAZ AS CONDIÇÕES DO SACERDÓCIO

  Vimos na postagem anterior que as condições essenciais para o sacerdócio são: ser homem, ser consagrado e oferecer sacrifício. Pois bem. Vamos ver agora, com a graça de Deus, que Jesus satisfaz perfeitamente estas três condições.
   A)  SER HOMEM. Jesus é o  Filho de Deus feito homem. Antes da Encarnação, sendo só Deus, não poderia ser sacerdote. Mas desde que no dia da Encarnação no seio da sempre Virgem Maria se fez homem, nada O impede de se revestir da condição de sacerdote. Neste momento, o Verbo entra na família humana e pode, sem nada perder da sua divindade, abater-se, humilhar-se, aniquilar-se, adorar e pedir, como homem que é. Diz São Paulo: "Por isso, entrando no mundo, diz(Jesus): "Não quiseste hóstia, nem oblação mas formaste-me um corpo...Então Eu disse: Eis-me que venho... para fazer, ó Deus, a tua vontade...Por esta vontade somos santificados  mediante a oblação do corpo de Jesus Cristo..." (Heb. X, 5, 7 e 10). Em Hebreus, IV, 15 diz ainda o Apóstolo: "Não temos um Pontífice que não possa compadecer-se das nossas enfermidades, mas que foi tentado em tudo à nossa semelhança, exceto no pecado". Bossuet assim comenta: "Mas não a tomastes (=a natureza humana) sã, perfeita, imortal, tal como saíra no princípio das vossas mãos. Assumiste-la tal como o pecado e a justiça vingadora de Deus a tornaram - mortal, enferma, pobre -, porque queríeis carregar com o nosso pecado. Queríeis carregá-lo sobre a cruz, vítima inocente; queríeis carregá-lo durante todo o decurso da vossa vida... Como não podíeis assumir também a iniquidade e a mácula do pecado, tomastes a pena, o justo suplício, isto é, a mortalidade com todas as consequências. Assim Vos  tornastes sensível aos nossos males - Vós que os experimentastes na Vossa carne... Quem duvida que não possais ajudar-nos nas coisas que já sofrestes, pois sofrestes livremente e quisestes, ao suportá-las, fazer nascer em Vós a compaixão para conosco? Sede para sempre louvado, Senhor, e compadecei-Vos dos nossos males, não como os ricos se compadecem dos pobres, mas como os pobres choram os outros pobres" (Bossuet, Méditations sur l'Evangile, 95ª).
   Acrescentemos que, por não ter deixado de ser Deus, ao fazer-se homem, Jesus é o mediador ideal entre o Céu e a terra, não apenas santo e imaculado, mas impecável , o Filho bem-amado do Pai, em quem Ele pôs todas as suas complacências, o sacerdote escolhido por natureza para adorar a infinita majestade e defender a nossa causa. Jesus é verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Como homem, pode compadecer-se das fraquezas dos seus irmãos e abater-se, humilhar-se, sofrer, morrer, para glorificar seu Pai; Como Deus, pode dar a todas as suas ações um valor infinito.
   São Paulo na mesma Epístola aos Hebreus, V,4-6 mostra ser necessário  que Cristo fosse chamado e estabelecido sacerdote pelo Pai. Portanto Jesus não se elevou por si mesmo à glória do Sumo Pontificado, mas recebeu-o d'Aquele que disse: tu és meu Filho, eu te gerei hoje; como disse ainda em outra passagem: "tu és sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedeque". Foi, portanto, a livre escolha de Deus que fez de Jesus o sacerdote supremo, o sacerdote por excelência. Como devemos agradecer a Deus essa sua bondade infinita!

   B) SER CONSAGRADO. Jesus foi consagrado sacerdote perfeito pelo próprio Deus. Escolhido desde toda a eternidade, Cristo é feito sacerdote no próprio momento da Encarnação e desde logo começa o seu duplo papel de Religioso de Deus e de Salvador dos homens. É o que declara São Paulo: "Ao entrar no mundo, Cristo disse (a seu Pai): não quiseste sacrifícios nem holocaustos mas formaste-me um corpo; não te agradaram holocaustos nem sacrifícios pelo pecado. Então eu disse: Eis-me aqui!... Venho, ó Deus, para fazer a tua vontade... É em virtude desta vontade que somos santificados pela oblação que Jesus fez, uma vez por todas, do seu corpo" (Heb. X, 5-7-10).
  Que vem a ser Religioso de Deus?  Jesus recebeu a consagração sacerdotal para desempenhar junto de Deus o papel de Religioso; e junto dos homens o papel de Salvador. O papel de Salvador, todos sabem em que consiste. Mas talvez nem todos compreendem em que consiste este papel de Religioso de Deus.
Vamos explicá-lo. Como Religioso de Deus, Jesus Cristo oferece-se como vítima, em substituição de todos os holocaustos e sacrifícios do Lei Antiga. É a obediência, a humildade e amorosa submissão à vontade do Pai que imolará todos os atos à glória de Deus e reparará assim, nobremente, a desobediência dos nossos primeiros pais. Desta forma, Deus será glorificado como nunca o fora; será glorificado como merece, com uma glória infinita, porquanto o Verbo comunica às ações e sofrimentos da sua humanidade um valor infinito. E por este mesmo sacrifício, Jesus salvará em princípio todos os homens, no sentido de que lhes merecerá, de uma maneira abundante e mesmo superabundante, todas as graças de que têm necessidade para serem salvos: se alguns não aproveitam da sua redenção, é porque resistiram à sua graça. E São João diz: "Se alguém pecou, temos um advogado junto do Pai, Jesus Cristo, o justo; Ele próprio é uma vítima de propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas pelos de todo o mundo" (1 João, I, 2). E se, possuindo o estado de graça, tivermos necessidade de novos socorros para perseverar ou progredir na vida espiritual, Jesus estará presente, "sempre vivo para interceder por nós" (Heb. VII, 25).

   C) OFERECER SACRIFÍCIO. Se alguém é sacerdote, então importa que ofereça sacrifício; se é  o sacerdote por excelência, importa que ofereça um sacrifício perfeito. Foi exatamente o que Jesus fez. Quanto ao sacrifício, começou a oferecê-lo interiormente desde o primeiro instante da sua existência e renovou exteriormente este oferecimento no dia da sua apresentação no templo. Preparou a imolação sangrenta por uma vida de rudes trabalhos e profundas humilhações. Completou o seu sacrifício na última Ceia e sobre o altar da Cruz, oferecendo-se livre e generosamente para suportar com paciência heróica todas as torturas físicas e morais que os seus algozes lhe infligiram. Consumou-o, ressuscitando e subindo ao céu; aí, aparece diante do Pai com a sua humanidade imolada por nós e, embora lá não ofereça um sacrifício propriamente dito, não cessa de interceder por nós e de pedir que os frutos da sua Paixão nos sejam aplicados.
   No Santo Sacrifício da Missa, Jesus Cristo continua o sacrifício do Calvário, oferecendo de novo a seu Pai a Vítima imolada sobre a Cruz, com as mesmas disposições de obediência e amor. E, como diz o Beato Olier, "como este augusto interior de Jesus é o mesmo sobre a cruz e sobre o altar, sob os véus do pão e sob os véus da carne, é ainda o que mais devemos estimar e honrar nos sacrifício de Cristo, que começou sobre a cruz e continua sobre os santos altares".