quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Jesus se imola como Vítima

   A IMOLAÇÃO: Começa com a dolorosa Paixão, no horto das Oliveiras com a agonia do Getsêmani, e tem o seu remate no Calvário. Antes porém de se deixar imolar pelos carrascos, Jesus quis oferecer-se de novo como vítima, desta vez num verdadeiro sacrifício, acompanhado de ritos misteriosos - o sacrifício da Ceia. Depois de ter celebrado a antiga Páscoa com os apóstolos, dá início, por assim dizer, à nova Páscoa, e institui um sacrifício que se perpetuará nos altares até ao fim dos tempos. Tomando o pão, abençoa-o e dá-o aos apóstolos, dizendo: "Comei, isto é o meu corpo, dado e entregue por vós". E tomando o cálice do vinho, acrescenta: "Bebei dele todos; é o meu sangue, o sangue da nova aliança, que é derramado por vós e pela multidão dos homens em remissão dos pecados". Jesus sabe que vai ser imolado no dia seguinte e oferece antecipadamente ao Pai a sua imolação, a efusão do seu sangue, a sua morte, para patentear publicamente aos Apóstolos que se entrega livre e voluntariamente à morte expiatória e às torturas físicas e morais que a acompanharão. A Ceia é, portanto, um verdadeiro sacrifício, porque é um dom antecipado da vítima que será imolada no dia seguinte.
   É por esta mesma razão que Jesus é chamado sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque. Com efeito, Melquisedeque oferecera a Deus pão e vinho. Ora, é sob as espécies de pão e de vinho que Jesus se oferece ao Pai e se dá aos Apóstolos. A santa missa celebrada hoje nos nossos altares é uma reprodução do sacrifício da Ceia, com a diferença de que o sacerdote oferece atualmente a vítima outrora imolada no Calvário, ao passo que Cristo oferecia no Cenáculo a vítima que ia ser imolada no dia seguinte.
   Jesus pode agora começar a sua dolorosa Paixão. Deve mesmo começá-la, já que com as palavras que disse na Ceia se votou à morte.
   É exatamente isto que Jesus faz. Entra nos Horto das Oliveiras, onde vai ter agonia e suar sangue. Jesus deixa que a sua imaginação Lhe represente, de uma maneira clara, todas as torturas e humilhações que há de sofrer no dia seguinte. Fica tão sensibilizado, que sente medo, tédio e uma tristeza muito profunda. Jesus vê-se , sobretudo, como cabeça de um corpo místico de que nós somos membros, carregado com o peso dos nossos pecados, sente-se como que submergido pela vaga de todas as iniquidades humanas, em face do Deus de toda a santidade. Uma tristeza mortal apodera-se da sua alma e pelo seu corpo cansado perpassa um suor de sangue. "Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice. Mas não se faça como eu quero, mas como tu queres" (S. Mat. XXVI, 39).
   E o martírio começa. Traído por Judas, renegado por Pedro, abandonado por quase todos os seus discípulos, é vilipendiado, insultado, ferido pelos servos do Sumo Sacerdote, condenado pelo Sinédrio por se ter confessado Filho de Deus, condenado por Pilatos que proclamara momentos antes a sua inocência. Flagelado, coroado de espinhos como um rei fantoche, carregado de um pesado lenho, sobe penosamente o Calvário, estende os seus membros doloridos sobre a cruz, vê as suas mãos e os seus pés perfurados pelos cravos, ouve os insultos e os sarcasmos dos escribas e dos fariseus, que o convidam ironicamente a descer do patíbulo, se é verdadeiramente o Messias, o Filho de Deus. E em vez de se vingar, suplica ao Pai que lhes perdoe, porque, diz Ele, "não sabem o que fazem" (S. Luc. XXIII, 34).
   E enquanto o seu corpo é torturado pelos algozes e a sua alma se angustia ao pensamento de que muitos não tirarão proveito do seu sangue, que faz Jesus, o Soberano Pontífice, no altar da cruz? Renova o dom de sua vida, já tantas vezes feito: "Eu sou o Bom Pastor. O Bom Pastor dá a vida pelas suas ovelhas... ninguém me tira a vida, mas sou eu que a dou; eu tenho o poder de a dar e o poder de a tomar; tal é a ordem que recebi de meu Pai" (S. Jo. X, 11-18). Esta ordem foi tão bem cumprida que podia dizer com toda a verdade: "Tudo está consumado". Os sacrifícios figurativos do Antigo Testamento são substituídos pelo único verdadeiro sacrifício. As profecias estão cumpridas, em particular a profecia de Isaías anunciando com antecipação de séculos os sofrimentos e a morte do Homem das dores.
   Jesus acabou a sua obra, cumpriu toda a justiça. Sofreu, sem se queixar, as mais espantosas torturas do corpo e da alma. Sofreu-as por amor, por amor do Pai, a quem queria glorificar, e por amor dos homens, a quem queria salvar. Já só Lhe resta permitir que a morte se apodere da sua vítima voluntária. É  o que Ele faz, depois de se oferecer pela última vez como hóstia ao Pai: "Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito" (S. Luc. XXIII, 46).
   Nosso Senhor Jesus Cristo expira. Deus foi glorificado como nunca tinha sido, e os homens foram salvos, pelo menos de direito. Resta aos homens fazer seus pela fé e pela caridade, pelas obras e pela recepção dos sacramentos, os méritos do Redentor. Ao fazê-lo consumarão o sacrifício de Cristo e comungarão com Jesus-Vítima. É o que meditaremos, se Deus quiser, na próxima postagem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário