1ª - Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino do céu.
Modo de falar próprio da língua hebraica. Significa os que têm espírito de pobreza, isto é, são desapegados das riquezas materiais. Podem existir ricos que tenham espírito de pobreza: são aqueles que não se apegam à fortuna, não depositam nela a sua felicidade e sabem utilizá-la em boas obras. Ao contrário, podem existir pobres sem este espírito de pobreza: se por acaso se julgarem infelizes por estarem desprovidos de bens materiais. Pobres de espírito, portanto, são os humildes, os que não têm apego aos bens da terra, os que voluntariamente renunciaram a eles para mais de perto seguirem a Jesus Cristo. Um pobre, pois, mal satisfeito com sua sorte, dominado pela ambição e pelo orgulho, é um rico de espírito: não é para ele o reino do céu. Do mesmo modo, no seio da abundância e na prosperidade, pode um rico ser pobre de espírito pelo nenhum apego aos bens da fortuna, pelo espírito de caridade e submissão à vontade de Deus. O santo homem Jó é um dos mais belos exemplos desta verdade. Donde concluímos que é uma interpretação despropositada e, portanto, inteiramente errada, aquela que considera a expressão "pobres de espírito" no sentido deprimente de "os tolos, os ignorantes, os que, enfim, são sem capacidade intelectual". É uma interpretação absurda!
2ª - Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra.
Esta expressão significa a recompensa da felicidade do reino do Messias, tanto nesta vida como na vida futura. Os mansos, isto é, os que não murmuram nem se irritam, os que evitam a discórdia, os que sabem perdoar com generosidade as ofensas alheias, aqueles, enfim, que suportam o peso da vida conformados com a vontade de Deus. "Eles possuirão a terra: isto é, o céu, - a terra dos vivos - "terra viventium". Todavia, mesmo neste mundo, a paciência é uma arma poderosa para vencer ainda as maiores resistências. "Pegam-se mais moscas, dizia São Francisco de Sales, com uma gota de mel do que com um barril de vinagre".
3ª - Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.
Obs.: Na Vulgata e em numerosos manuscritos, aprecem invertidas a 2ª e a 3ª bem-aventuranças. Estou seguindo a Vulgata.
Bem-aventurados os que choram os seus pecados e os dos seus irmãos. Santas lágrimas que tanta consolação nos merecem no céu. Também as lágrimas que, todos os dias e com tanta abundância, caem dos olhos dos pobres, dos aflitos, dos doentes e abandonados têm bem-aventurança. "Lázaro só teve males na vida, - diz Abraão ao rico epulão, - agora ele é consolado".
4ª - Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.
Ter fome e sede de justiça quer dizer: desejar ardentemente a justiça, que consiste na perfeição moral ou santidade. É a necessidade que sente toda alma boa e reta, todo coração bem formado, de fazer a vontade de Deus, essa vontade de que Jesus fazia o seu alimento: "O meu alimento é fazer a vontade d'Aquele que me enviou". Bem-aventurados os que comem com prazer o Pão (Sua palavra e a Eucaristia) que Jesus lhes apresenta, e bebem, com delícia, a água, que Ele ofereceu à Samaritana, isto é, a graça de Deus, que é como água viva que jorra para a vida eterna.
5ª - Bem-aventurados os misericordiosos, porque também alcançarão misericórdia.
Os misericordiosos, isto é, os que perdoam, os que se compadecem das misérias do próximo, os que choram com os que choram, os que curam as feridas do corpo e da alma daqueles que sofrem; enfim, os justos, bons e dedicados. No último dia, Nosso Senhor será também misericordioso para com eles.
6ª - Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus.
Puros de coração ou os que têm o coração puro. Aqui não se refere exclusivamente à castidade, mas à isenção de qualquer mancha moral. São os corações desprendidos dos sentimentos carnais e sensuais, sentimentos estes que mancham o corpo e a alma; são os corações abertos a tudo o que é nobre, santo, justo, amável e virtuoso, a tudo o que é louvável nos bons costumes. Esses corações verão a Deus, neste mundo, através das sombras da fé, e no Céu O contemplarão face à face.
7ª - Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus.
Os pacíficos, isto é, os que odeiam as discussões, dissensões e demandas injustas; os que buscam, de preferência, tudo o que une e aproxima os corações; os que têm, por assim dizer, o culto dos direitos alheios. Filhos da paz, eles preferem ceder o seu direito, para não defendê-lo com quebra da caridade. São firmes em defender os mandamentos e direitos de Deus, mas o fazem de maneira mansa, suave e caridosa. Não são canas agitadas pelos ventos, nem tão pouco, "filhos do trovão".
8ª - Bem-aventurados os que sofrem perseguição por amor da justiça, porque deles é o reino do céu.
O próprio Jesus explica: "Sereis bem-aventurados, quando os homens vos amaldiçoarem, vos perseguirem e vos expulsarem da sua companhia, vos odiarem, vos carregarem de opróbrios e de injúrias, e repelirem vosso nome com infame por causa do Filho do Homem, e falsamente disserem de vós toda sorte de mal, por minha causa. Alegrai-vos e exultai, porque uma grande recompensa vos está reservada no Céu; assim perseguiram eles o Profetas, que vieram antes de vós".
A justiça é a causa de Deus. Os perseguidos combatem por Ele, e Ele se encarrega de os recompensar como merecem, e ainda mais do que merecem.
Caríssimos, aí está o código sublime da Bem-aventurança eterna. A felicidade que Jesus promete está colocada tão alto que os maus não podem atingi-la, e, ao mesmo tempo, é de acesso tão fácil que os bons podem alcançá-la. O caminho está, pois, aberto para todos. O Céu não é mais o privilégio desta ou daquela classe, mas de todos - grandes e pequenos, ricos e pobres, felizes e infelizes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário