sábado, 8 de agosto de 2020

O DOM DAS LÍNGUAS


 S. Paulo enumera as graças dadas gratuitamente (gratiae gratis datae: "A cada um, porém, é dada a manifestação do Espírito para utilidade (comum). Assim, a um é dada pelo Espírito a linguagem da sabedoria; a outro, porém a linguagem da ciência, segundo o mesmo Espírito; a outro, a fé, pelo mesmo Espírito; a outro o dom das curas, pelo mesmo Espírito; a outro, o dom de operar milagres; a outro, o discernimento dos espíritos [os que vêm de Deus, e os que não vêm]; a outro, A VARIEDADE DE LÍNGUAS; a outro, a interpretação das palavras" (I Cor XII, 7). Estuda-se em Teologia que estas graças Deus as dá não em benefício da pessoa que as recebe, mas para beneficiar o próximo, isto é, para a conversão e/ou edificação do próximo.

Aqui, quero falar só do dom das línguas. Que significa? É falar várias línguas estrangeiras, não pelo estudo delas, mas por uma graça dada pelo Espírito Santo, para poder assim tocar os corações.  Os Apóstolos, no dia de Pentecostes, receberam este dom: "Foram todos cheios do Espírito Santo e começaram a falar várias línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem" (Atos II, 4). Como ali em Jerusalém havia povos de todos os países até então conhecidos, este dom foi necessário para a conversão de pessoas de todos os lugares e assim a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo, já naquele dia, se tornou CATÓLICA, isto é, UNIVERSAL. Este dom nos Apóstolos consistiria, ou em eles falarem as várias línguas de cada um daqueles povos, ou eles falavam a sua língua (hebraico e aramaico) e todos os entendia, cada um, na sua língua materna.

O P. Afonso de Santa Cruz diz em seu livro sobre S. Francisco Xavier, O GIGANTE DO ORIENTE: "O navio, que trouxe Xavier até Amboino, estava lotado de indígenas de várias nacionalidades, e todos eram muçulmanos ou pagãos. Em pleno mar deu-se o Pentecostes das línguas. Xavier falava e todos entendiam, na sua língua materna, o conteúdo da pregação.  Este prodígio impressionou tanto, que todos pediram espontaneamente o batismo ao missionário do Deus verdadeiro",  E assim aconteceu nas suas Missões nas Índias. No Japão, porém, o Espírito Santo não lhe deu o dom das línguas: "Xavier, escreve o mesmo P. Afonso de Santa Cruz, caminha com o coração dilacerado, no meio do povo, por não entender uma só palavra japonesa. Todos queriam escutá-lo, mas ele ficava aí, como acabou de escrever a Roma, como estátua muda. Teve que estudar, como criança, os elementos básicos da língua japonesa. Levou quarenta dias, para ter a possibilidade de ensinar os rudimentos da fé.  Pensava contar com o dom das línguas, mas este sumira. Isto foi um banho de humildade para o insaciável missionário".

Não é dom das línguas falar coisas que nem a própria pessoa sabe o que está falando. Mas ouçamos o próprio S. Paulo: "É maior o que profetiza [etimologicamente = aquele que prega] que o que fala diversas línguas; A NÃO SER QUE TAMBÉM AS INTERPRETE, a fim de que a Igreja receba edificação" (I Cor XIV, 5).

Neste mesmo capítulo 14 de sua 1ª Epístola aos Coríntios, o Apóstolo dos Gentios mostra como se deve exercer este dom do Espírito Santo: "Assim, pois, irmãos, se eu for ter convosco falando em diversas línguas, de que vos aproveitarei eu...? Há, com efeito, tantos gêneros de línguas neste mundo e todas têm a sua expressão. Se eu, pois, não entender o que significam as palavras, serei bárbaro para aquele a quem falo; e o que fala será bárbaro para mim... Por isso, o que fala uma língua desconhecida, peça o dom de a interpretar. Se eu orar numa língua (desconhecida, verdade é que) o meu espírito ora, mas o meu entendimento fica sem fruto. Que, pois, hei de fazer? Orarei com o espírito, cantarei também com a inteligência. Mas, se deres ações de graças com o espírito, o que ocupa o lugar do simples povo como responderá Amém à tua ação de graças, não entendendo o que dizes? Verdade é que tu dás bem a ação de graças, mas o outro não é edificado. [E isto, na suposição de que esteja realmente falando alguma língua].Dou graças a meu Deus, porque falo as línguas que todos vocês falam. Mas na Igreja eu antes quero dizer cinco palavras, de modo a ser compreendido para instruir também os outros, do que dez mil palavras em língua estrangeira. Irmãos, não sejais meninos na compreensão, mas sede pequeninos na malícia e perfeitos na inteligência... As línguas, pois, são um sinal, não para os fiéis, mas para os infiéis; porém as profecias (são um sinal) não para os infiéis mas para os fiéis. Se, pois, toda a Igreja se reunir em assembléia, e todos falarem línguas diversas, e entrarem então pessoas ignorantes ou infiéis, não dirão que estais loucos?... Que haveis, pois, de fazer, irmãos? Quando vos reunis, se um de vós tem um cântico, outro uma instrução, outro uma revelação, outro o dom das línguas, outro uma interpretação, faça-se tudo para edificação. Ou se alguém fala línguas, falem dois, ou quando muito três, e um depois do outro; e haja um que interprete. Se não houver intérprete, ESTEJAM CALADOS na Igreja e não falem, senão consigo e com Deus". E S. Paulo termina o capítulo assim: "Mas faça-se tudo decentemente e com ordem".

Mas há, até entre católicos, a "ORAÇÃO EM LÍNGUAS", como costumam chamar. Na verdade, a expressão mais adequada, julgo eu, seria: "ORAÇÃO COM GEMIDOS ININTELIGÍVEIS", porque, como afirmam os que promovem tais "orações", nem eles mesmos sabem o que estão dizendo. Pretendem, no entanto, se basear em S. Paulo na Epístola aos Romanos VIII, 26 e 27: "Assim mesmo o Espírito ajuda também a nossa fraqueza, porque não sabemos o que havemos de pedir, como convém, mas o mesmo Espírito ora por nós com gemidos inexplicáveis.E o que perscruta os corações, sabe o que deseja o Espírito, porque Ele pede segundo Deus pelos santos".

Caríssimos, para não alongar demasiado este artigo, darei, se Deus quiser, no próximo post, a explicação tradicional desta passagem de S. Paulo. Que o Espírito Santo nos ilumine, a mim que vos escrevo, e a vós que me ledes. Amém!

 

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