LEITURA ESPIRITUAL, dia 15º
'Não quero a morte do ímpio, mas que se converta e viva" (Ezequiel
XXXIII, 11).
São três os admiráveis efeitos da misericórdia divina com
respeito aos pecadores: 1) Deus espera-os com paciência; 2) Busca-os com solicitude;
3) Recebe-os com alegria, quando voltam arrependidos.
1- ESPERA-OS COM
PACIÊNCIA: Nesta meditação em
primeiro lugar convém relembrar o que é o pecado e a aversão que Deus lhe tem,
e, consequentemente as razões que parecem obrigar a Justiça divina a puni-lo
sem delongas. Assim teremos mais facilidade em fazer uma ideia de quanto é
misericordiosa esta paciência de Deus em esperar o pecador, isto é,em não
condená-lo logo. Então, que faz o homem, quando se rebela contra Deus pelo
pecado mortal? Vamos relembrar algumas passagens bíblicas: "Estendeu sua mão contra Deus, e se fez forte contra o Onipotente.
Correu contra ele com o pescoço levantado, armou-se duma soberba
inflexível" (Jó XV, 25 e 26); "Estes são os que disseram a Deus:
Retira-te de nós, pois não queremos saber nada dos teus caminhos. Quem é o
Onipotente para que o sirvamos? (Jó, XXI, 14 e 15); "Crucificam de novo o
Filho de Deus em si mesmos e O expõem à ignomínia" (Hebreus, VI, 6). Que
audácia! que insolência! que furor ímpio e sacrílego! E esses vasos de ira, que
mereceriam por tantos títulos ser quebrados, Deus sofre-os com paciência,
cinqüenta, sessenta anos e, às vezes até mais do que isto! "E se Deus querendo mostrar a sua ira e tornar manifesto o seu
poder, suportou com muita paciência os vasos de ira, preparados para a perdição"
(Romanos, IX, 22). Deus alimenta estes pecadores, bondosamente os traz no
seu seio, enche-os de benefícios. Pouco falta para que os justos se
escandalizam. Aliás a Bíblia diz: "Os
meus pés por pouco não vacilaram, diz o profeta Davi, por pouco se não transviaram meus passos. Porque invejei os iníquos,
vendo a paz dos pecadores" (Salmo LXXII, 2 e 3); "Levanta-te, por que
dormes, Senhor?" (Salmo XLIII, 23). Na verdade os maus abusam duma
bondade, que não podem compreender, e gloriam-se dos seus atentados contra o
Céu: "Até quando os pecadores,
Senhor, até quando os pecadores se hão de gloriar? (Salmo XCII, 3). Persuadem-se
que, se Deus não pune os seus crimes, é porque não os vê: "E chegam a dizer: Porventura Deus sabe isto, e tem disto notícia
o Altíssimo? Eis que estes pecadores, que têm tudo na abundância neste mundo,
adquiriram novas riquezas" (Salmo LXXII, 11 e 12). Mas que dizeis? Não
pode o Senhor vingar-se? Ele que só com um olhar faz estremecer a terra: "Aquele Senhor que, só com olhar para a
terra, a faz tremer; que toca os montes, e eles fumegam" (Salmo CIII, 32) pode
ser indiferente às ofensas que recebe? Deus aborrece necessária e infinitamente
o pecado; só o considera bastante punido no inferno, bastante chorado pelas
lágrimas de um Deus, bastante reparado pela morte de um Deus. Ora, em Deus tão
inimigo do pecado, que prodigiosa misericórdia não é, tanta constância em
suportar o pecador! É o que expressa o próprio divino Espírito Santo: "Por isso o Senhor espera o momento em
que terá misericórdia de vós; ele exaltará a sua glória, perdoando-vos, porque
o Senhor é um Deus de equidade; ditosos os que esperam n'Ele" (Isaías XXX,
18); "Não retarda o Senhor a sua promessa, como alguns pensam, mas usa de
paciência convosco, não querendo que nenhum pereça, mas que todos se convertam
à penitência" (2 Pedro III, 9). Isto é o que suspende o seu braço, e
impede que os ministros da sua ira procedam contra os que o ofendem. Os servos
do pai de família pedem licença para arrancar o joio que o homem inimigo semeou
no seu campo; todas as criaturas pedem a Deus licença para vingar à sua glória
ultrajada pelo pecador. E a tantas vozes que pedem vingança, Deus responde: Deixai crescer a ambos. É verdade que Eu
evitaria muitos insultos, ferindo os ímpios a quem a minha bondade não comove;
mas custa-me perdê-los. Ah! antes quero que voltem para mim e vivam! "Não quero a morte do ímpio, mas que se
converta e viva" (Ezequiel, XXXIII, 11). Caríssimos, não são estas
delongas, esta paciência, este amor do Senhor um poderoso motivo de conversão?
De fato, a bondade de Deus, não é para a gente pecar mais, mas para se
arrepender por ter ofendido um Pai tão bondoso. É motivo para se fazer
penitência. Assim dizia a santa mulher Judite: "Mas, porque o Senhor é paciente, arrependamo-nos disto mesmo, e
derramando lágrimas, imploremos a sua misericórdia; porque Deus não ameaça como
os homens, nem ele se inflama em ira como os filhos dos homens" (Judite
VIII, 14 e 15).
2 - DEUS BUSCA O
PECADOR COM SOLICITUDE. Está no ordem das coisas humanas que o ofensor dê
os primeiros passos para a reconciliação. É Deus, porém, que busca ao
homem pecador! Quando deveria fazer
milagres de rigor para nos punir, faz milagres de clemência para nos
salvar. O pecador foge e Deus chama-o
pela voz da consciência: Que fizeste, meu filho?! Medite na incerteza da hora
da morte; pensa nas penas da outra vida; medite nos benefícios de Deus , na sua
justiça e na sua bondade. Caríssimos, ai de nós se não fosse a misericórdia
divina! Somos um nada pecador, nada para o bem, mas, infelizmente com muita
força para nos arrancarmos dos braços de nosso Pai do Céu e nenhuma temos,
quando se trata de voltarmos para Ele! É mister que digamos com Davi: "Andei errante como ovelha que se
desgarrou; buscai o vosso servo" (Salmo CXVIII, 176). E Deus assim o
faz, e multiplica as parábolas para no-lo explicar. É um pastor que deixa todo
o seu rebanho no deserto, para ir buscar uma ovelha que se havia perdido. Onde está ela? Chegará ele a tempo? - É como
uma mulher que perdeu uma dracma. Ela acende a sua candeia, revolve tudo em sua
casa, até que a ache. Dir-se-ia, ó meu Deus, que a perda duma alma é para vós a perda de um reino! Jesus Cristo
é o Bom Pastor que nos ensinou com palavras, e com o exemplo. Basta lermos os
Santos Evangelhos!
3 - DEUS RECEBE COM
ALEGRIA O PECADOR QUE VOLTA ARREPENDIDO - Recordai-vos do acolhimento feito
ao filho pródigo, das festas celebradas por ocasião da sua volta. É o pastor quando achou a sua ovelha, com que alegria a
põe sobre os seus ombros. Não a coloca para ir andando na sua frente, não! a
carrega carinhosamente nos ombros! E pensar que este pecador havia levantado
a mão contra o Onipotente!!! Mas o
pastor, não só carrega a ovelha, mas apenas chega a sua casa, a alegria
transborda-lhe do coração; ele convida os seus amigos a felicitá-lo. Dir-se-ia
que um homem feliz a mais, é para Deus um acréscimo de felicidade. Caríssimos,
nesta meditação vamos fazer a seguinte reflexão: Se o Bom Pastor recebe com
alegria a ovelha desgarrada, por que há de recear o pecador arrependido não ser
acolhido na sua volta, ou abandonado na suas fraquezas? Deus amou-me, quando eu
o perseguia; odiar-me-á quando Lhe torno a trazer um coração contrito e
humilhado? Buscou-me, quando d'Ele fugia; repelir-me-á, quando me lanço nos
seus braços.?
Ó Jesus, agora
entendo que se para ir ao céu é preciso fazer violência a si mesmo, também não
é menos verdadeiro que para se condenar é preciso Vos fazer violência. Se o
pecador nunca desanimar de se levantar, Deus também nunca deixará de o receber.
São Francisco de Sales dizia: "O leito de uma boa morte deve ter por
colchão a caridade, mas é utilíssimo ter a cabeça apoiada nos dois
travesseiros: expirar com uma confiança humilde na misericórdia de Deus".
Amém!
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