Leituras: Primeira Epístola de São João Apóstolo 3, 13-18.
Continuação do Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas 14, 16-24:
"Naquele tempo, disse Jesus aos fariseus esta parábola: Um homem preparou um grande banquete, para o qual convidou muitas pessoas. E, à hora do banquete, mandou um de seus servos dizer aos convidados que viessem, porque já estava tudo pronto. Todos, porém, unanimemente, começaram a escusar-se. Disse-lhe o primeiro: Comprei uma quinta e preciso ir vê-la; rogo-te que me dês por escusado. Um outro disse: Comprei cinco juntas de bois, e vou experimentá-los; peço-te que me dispenses. Disse um terceiro: Casei-me, e por isso não posso ir. Voltando o servo referiu estas coisas a seu senhor. Então, indignado, o pai de família disse a seu servo: Sai já pelas praças e ruas da cidade, traze aqui os pobres, os aleijados, os cegos e os coxos. E disse o servo: Senhor, está feito o que me mandaste, e ainda há lugar. Respondeu o senhor ao servo: Vai pelos caminhos e cercados, e obriga a gente a entrar para que se encha a minha casa. Eu vos digo, porém, que nenhum daqueles que foram convidados, provará a minha ceia."
Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!
Esta meditação foi extraída do Livro "INTIMIDADE DIVINA" do P. Gabriel de Sta. M. Madalena, da Ordem dos Carmelitas Descalços.
1. O Evangelho deste domingo (Lc. 14, 16-24) harmoniza-se perfeitamente com a festa do Corpo de Deus. "Um homem fez uma grande ceia e convidou a muitos". O homem que faz a ceia é Deus, e a grande ceia é o Seu reino onde as almas encontrarão na terra toda a abundância de bens espirituais e, na outra vida, a felicidade eterna. É este o sentido próprio da parábola, mas nada obsta a que também se possa entender num sentido mais particular, vendo na ceia o banquete eucarístico e no homem que o ofereceu, Jesus, que convida os homens a alimentarem-se da Sua Carne e do Seu Sangue.. "A mesa do Senhor está pronta para nós, canta a Igreja. - A Sabedoria [ou seja o Verbo Encarnado] preparou o vinho e pôs a mesa" (Breviário). O próprio Jesus, ao anunciar a Eucaristia, dirige a todos o Seu convite: "Eu sou o pão da vida; o que vem a mim não terá jamais fome e o que crê em mim não terá jamais sede... Vossos pais comeram o maná no deserto e morreram. Este é o pão que desceu do céu, para que aquele que dele comer não morra" (Jo. 6, 35-50). Jesus não se limita, como os outros homens, a preparar-nos uma ceia, a fazer numerosos convites e a apresentar iguarias excelentes; mas o fato singularíssimo - que nenhum homem por mais rico e poderoso que seja poderá imitar - é que Ele próprio Se oferece como alimento. São João Crisóstomo a quem pretende ver Cristo na Eucaristia com os olhos do corpo, diz: "Pois bem, já O vês, tocas e comes. Tu queres ver as Suas vestes e Ele, ao contrário, concede-te não só vê-Lo, mas até tomá-Lo como alimento, tocá-Lo e recebê-Lo dentro de ti... Aquele a quem os anjos olham temerosos e não ousam contemplar livremente devido ao Seu deslumbrante esplendor, faz-se nosso alimento; nós unimo-nos a Ele e formamos com Cristo um só corpo e uma só carne" (Breviário).
2. Jesus não podia oferecer ao homem uma mesa mais rica do que o banquete eucarístico. E de que modo correspondem os homens ao Seu convite para esta mesa? Muitos, como os judeus incrédulos, encolhem os ombros e retiram-se com um sorriso cético nos lábios: "Como pode este dar-nos a comer a sua carne?" (Jo. 6, 53). Mas o que afasta da Eucaristia não é só a falta de fé; esta é muitas vezes acompanhada e não raramente deriva das causas morais de que fala o Evangelho de hoje. "Comprei uma quinta e é-me necessário ir vê-la, rogo-te que me dês por escusado", respondeu um; e outro: "Comprei cinco juntas de bois e vou experimentá-las: rogo-te que me dês por escusado". A excessiva preocupação com os bens terrenos e o apego aos mesmos, o mergulhar-se totalmente nos negócios, são os motivos pelos quais tantos recusam o convite de Jesus. Porém, ainda não é tudo: "Casei-me e por isso não posso ir", respondeu um terceiro. Este representa aqueles que, submersos nos prazeres dos sentidos, perderam a sensibilidade para as coisas do espírito e, em presença delas, continuam o seu caminho, não se lembrando sequer de se desculpar.
É impossível não estremecer em face da grande cegueira do homem que antepõe ao dom de Cristo, Pão dos anjos e penhor de vida eterna, os interesses terrenos, os vis prazeres dos sentidos, que muito depressa se dissipam como o nevoeiro aos raios do sol.
Terminemos com Santo Agostinho: "Ó Senhor, aproximar-me-ei com fé da Vossa mesa, participando dela para ser por ela vivificado. Fazei, Senhor, que eu seja inebriado pela abundância da Vossa casa, e dai-me a beber da torrente das Vossas delícias... Fazei que eu me aproxime e me fortaleça; deixai que me aproxime embora mendigo, fraco, aleijado e cego. À Vossa ceia não vêm os homens ricos e saudáveis que julgam caminhar bem e possuir a agudeza de vista, homens muito presunçosos e por consequência, tanto mais incuráveis quanto mais soberbos. Aproximar-me-ei qual mendigo, porque me convidais Vós que, de rico, Vos fizestes pobre por mim, para que a Vossa pobreza enriquecesse a minha mendicidade. Aproximar-me-ei como fraco, porque o médico não é para os que têm saúde senão para os doentes. Aproximar-me-ei como aleijado e Vos direi: 'Dirigi Vós os meus passos pelas Vossas veredas'. Aproximar-me-ei como cego e Vos direi: 'Iluminai os meus olhos, a fim de que eu jamais durma o sono da morte'". Amém!