terça-feira, 24 de março de 2020

PORQUE O MAL

   POR QUE O MAL?


                                                          Dom Fernando Arêas Rifan*

             
Diante do sofrimento atual com essa pandemia, surge sempre a questão da existência do mal: “Se Deus existe, de onde vem o mal?” (Leibniz). Se Deus, Pai todo-poderoso, cuida de todas as suas criaturas, por que então o mal existe? O Catecismo da Igreja Católica nos diz que a resposta não pode ser dada de modo rápido e simples, mas há que se considerar todo o conjunto da fé cristã: a bondade da criação, as sábias leis divinas da natureza, a pequenez e limitação da criatura – só Deus é perfeitíssimo, sem deficiências; as criaturas, não -, a liberdade humana, o drama do pecado, o amor paciente de Deus, a sabedoria misteriosa da Providência divina, enfim, todo o conjunto da mensagem cristã traz a solução para o problema do mal.
 Em sua sabedoria e bondade infinitas, Deus quis criar um mundo em estado de busca da perfeição última. Essa série de transformações que se operam no universo permite, no desígnio de Deus, juntamente com o mais perfeito, também o imperfeito, com as construções da natureza, também as destruições. Juntamente com o bem físico existe, portanto, o mal físico, enquanto a criação não houver atingido a sua perfeição. As leis físicas e químicas universais, criadas por Deus, são benéficas universalmente, embora, pela deficiência das criaturas, por serem tais, possam produzir alguns malefícios particulares, a não ser que Deus interfira com um milagre, que é a suspensão temporária do efeito das suas leis universais da natureza, o que só raramente acontece, por motivos só dele conhecidos.
Além disso, existe o mal moral, procedente da vontade livre do homem, pelo mau uso da liberdade que Deus lhe deu para poder merecer agindo sem coação.
E Deus sempre sabe tirar do mal um bem. “Deus todo-poderoso, por ser soberanamente bom, nunca deixaria qualquer mal existir em suas obras se não fosse bastante poderoso e bom para fazer resultar o bem do próprio mal” (S. Agostinho, De libero arbítrio, I, 1, 2). E nós também devemos sempre tirar do mal um bem: a caridade, a solidariedade, o arrependimento, a contrição, o propósito de melhorarmos a nós e o mundo, a paciência, a humildade, o desapego, enfim as virtudes cristãs que nos preparam para uma eternidade feliz, sem males.
            Neste tempo quaresmal, cujo ápice será a celebração da vitória de Cristo sobre o mal e a morte, ouçamos o maior teólogo vivo da Igreja: “Ao longo deste tempo, manteremos o olhar fixo sobre Jesus Cristo, ‘autor e consumador da fé’ (Hb 12, 2): n’Ele encontra plena realização toda a ânsia e aspiração do coração humano. A alegria do amor, a resposta ao drama da tribulação e do sofrimento, a força do perdão face à ofensa recebida e a vitória da vida sobre o vazio da morte, tudo isto encontra plena realização no mistério da sua Encarnação, do seu fazer-Se homem, do partilhar conosco a fragilidade humana para a transformar com a força da sua ressurreição. N’Ele, morto e ressuscitado para a nossa salvação, encontram plena luz os exemplos de fé que marcaram estes dois mil anos da nossa história de salvação” (Papa emérito Bento XVI, Porta Fidei, 13).

                                                                  *Bispo da Administração Apostólica Pessoal

                                                                         São João Maria Vianney

segunda-feira, 23 de março de 2020

CONDIÇÕES PARA UMA CONTRIÇÃO VÁLIDA

LEITURA ESPIRITUAL MEDITADA

Caríssimos, em se tratando de um assunto capital para a salvação, é necessário fazer uma análise completa a não deixar nos fiéis a mínima dúvida ou ignorância. Assim, sendo a CONTRIÇÃO ou a dor dos pecados absolutamente necessária para a validade da confissão, e sendo esta nas maioria dos casos necessária para a salvação, entendemos que se trata de assunto extremamente importante e mesmo urgente.

Então, para que a nossa dor nos alcance o perdão dos pecados, deve reunir CINCO CONDIÇÕES: é preciso que seja verdadeira, sobrenatural, absoluta, universal e confiante. Vamos dar a explicação de todas estas condições:

1ª - VERDADEIRA: Quer dizer, a dor não pode estar só na boca, mas também no coração. É uma dor íntima e não meramente externa. Eis aí porque o Santo Concílio de Trento a chama uma dor da alma. A Sagrada Escritura é clara sobre este ponto: "Convertei-vos a mim de todo o vosso coração, e dilacerai os vossos corações e não os vossos vestidos" (Joel, II, 12 e 13). É o coração, isto é, a vontade que deve arrepender-se, pois que foi o coração que pecou querendo o mal, comprazendo-se nele, desobedecendo a Deus. "Todos os crimes vêm do coração, dizia Nosso Senhor Jesus Cristo (Cf. S. Mateus, XV, 18). É, pois, o coração que deve converter-se detestando o mal e amando o bem. Davi dizia: "Odeio a iniquidade; e acrescentava, e amo a vossa lei" (Salmo 118). É nisto que consiste a conversão verdadeira que o Senhor quer quando diz: "Fazei-vos um coração novo" (Ez. XVIII, 21) e (Salmo 21). Quando se perde a Deus pelo pecado, como encontrá-Lo? Diz Deus em Deut. IV, 29: "Encontrá-Lo-eis, se o procurardes de todo o coração".

2ª - SOBRENATURAL: Esta dor deve ser sobrenatural, quer dizer, deve ser produzida por um motivo sobrenatural, e não natural; por exemplo: se alguém se arrependesse de uma falta, por ser ela prejudicial à sua saúde, aos seus bens, ou à sua reputação, seria isto um motivo natural, que não serviria para nada. Para que o motivo da dor seja sobrenatural, como deve ser, é preciso que nos arrependamos do pecado, seja por causa da sua fealdade, seja porque ele ofendeu a bondade infinita de Deus, seja porque ele nos fez merecer o inferno ou perder o paraíso; teremos assim a dor perfeita, chamada contrição. ou a dor imperfeita, chamada atrição, como explicaremos depois, se Deus quiser.  
3ª - SOBERANA, isto é, SUPREMA, ABSOLUTA, MÁXIMA: A dor dos pecados é suprema ou máxima quando a ofensa feita a Deus nos desagrada mais do que outro qualquer mal. Caríssimos, por a dor ser soberana, isto não significa que ela deve necessariamente ser acompanhada de lágrimas e duma sensibilidade positiva. Ela reside essencialmente na VONTADE,  e circunstancialmente também na sensibilidade. Falo isto pensando nas almas timoratas que, às vezes, se inquietam por não experimentar sensivelmente a dor dos seus pecados. Fiquem tranquilas tais almas, porque é bastante que a dor dos pecados esteja na vontade, ou queiram arrepender-se, preferindo ter perdido tudo no mundo, do que ter ofendido a Deus. Daí o sábio ensinamento de Santa Teresa d'Ávila: "Para conhecer se temos uma verdadeira dor dos nossos pecados, a melhor regra é saber se a pessoa penitente está disposta a perder tudo, antes do que a graça de Deus; então, sem dúvida alguma, temos uma verdadeira dor".  E isto diz respeito somente aos pecados mortais, pois, não é necessário ter arrependimento de todas as faltas veniais para se obter o perdão de alguma delas, atendendo a que aquelas, cujo arrependimento é sincero, podem ser perdoadas sem as outras. Mais uma observação: Sabemos, pelo que já escrevi, que Deus não pode perdoar nenhum pecado, seja mortal, seja venial, sem que o culpado tenha um verdadeiro arrependimento. Resulta disto que uma pessoa, confessando somente pecados veniais, sem o arrependimento necessário, faz uma confissão nula; por esta razão, se quer receber a graça da absolvição, é preciso que tenha ao menos arrependimento de algum dos pecados veniais dos quais se confessa, ou que acrescente uma outra matéria certa, acusando-se de algum pecado da vida passada, do qual tenha uma verdadeira dor.

4ª - UNIVERSAL: Quanto, porém, aos pecados mortais, é absolutamente necessário ter arrependimento de TODOS  os pecados mortais cometidos, e um verdadeiro propósito de não mais os cometer, sem o que nenhum pecado será perdoado. A razão disto é que nenhum pecado mortal é perdoado sem a infusão da graça na alma; ora, não podendo esta graça achar-se com o pecado mortal, logo, segue-se que nenhum pecado mortal pode ser perdoado, sem que todos os outros o sejam ao mesmo tempo. Portanto, de nada serve detestar os pecados mortais, quando não se detestam todos sem exceção. Gostaria de fazer uma observação importante, sobretudo para as consciências escrupulosas: Quem cometeu vários pecados mortais, não é necessário que deteste cada um em particular; basta que aborreça todos os pecados mortais em geral, como ofensas graves a Deus; porque, se qualquer pecado tivesse ficado esquecido, será perdoado com os outros.


5ª - CONFIANTE: Judas Iscariotes se arrependeu, mas foi um arrependimento sem confiança: se desesperou. A dor deve ser CONFIANTE, quer dizer: unida à esperança do perdão; doutro modo, seria semelhante à dor dos condenados, que se arrependem também dos seus pecados, mas sem esperança de perdão. Pois eles se arrependem, não porque os seus pecados tenham ofendido a Deus, mas tão somente porque são a causa das suas penas. Outro exemplo ilustrativo é o de Caim. Reconheceu o pecado que tinha cometido, matando seu irmão Abel; porém, desesperou igualmente do perdão: "Minha iniquidade é muito grande, dizia ele, para que eu possa obter a remissão"  (Gen. IV, 13). São Francisco de Sales diz que a dor dos verdadeiros penitentes é cheia de paz e de consolação, porque, quanto mais o verdadeiro penitente lastima ter ofendido a Deus, tanto mais confiança tem em obter o perdão das suas faltas; o que muito aumenta a sua consolação. Daí também esta exclamação de São Bernardo, dirigindo-se a Deus: "Se é tão agradável chorar por vós, quão delicioso não será alegrar-se em Vós!". Amém!

domingo, 22 de março de 2020

MAIS EXPLICAÇÕES SOBRE A CONTRIÇÃO

LEITURA ESPIRITUAL MEDITADA

A dor perfeita ou contrição é, na verdade, um tesouro inestimável, a tal ponto que a ela podemos aplicar as palavras da Escritura Sagrada: "Todos os bens me vieram com ela" (Sabedoria, VII, 11). Daí dizer S. Leonardo de Porto Maurício: "Quem poderia jamais exprimir as riquezas imensas que a dor derrama no coração, principalmente a dor perfeita ou a contrição! Ah! meus bem amados, desta pérola preciosa, eu queria ver-vos de posse dela mesmo que fosse pelo preço do vosso sangue, pois com ela possuís todos os bens".

Caríssimos, e ainda que sejais livres de vos contentardes com a atrição, é bom, entretanto, excitar sempre em vós a contrição, porque esta faz logo a alma amiga de Deus, reveste-a com a veste nupcial da graça, e apaga todos os pecados, mesmo antes da absolvição, o que não pode fazer a atrição, que, sem a intervenção da absolvição dada pelo sacerdote, fica estéril e não produz efeito algum. A dor perfeita, pela qual detestamos os nossos pecados pelo amor de Deus amado sobre todas as coisas, é como um segundo batismo, que imediatamente purifica a alma de todas as suas iniquidades.

Façamos algumas comparações para que possam, caríssimos, ver como um ato de contrição é tão precioso! Tomai na mão uma balança, colocai de um lado um ato de contrição, e do outro todos os bens do paraíso; comparai: um ato de contrição pesa tanto quanto todos estes bens, pois que só por esse ato fazeis jus a todos estes bens. Vede, por outro lado, os suplícios eternos do inferno: uma só lágrima, um só suspiro de um coração contrito basta para os suprimir totalmente. Dai-me, outrossim, um homem carregado de todos os pecados; se excita em sua alma um ato de verdadeira contrição, todos esses pecados se dissipam logo, como a neve diante do fogo. Como a contrição perfeita é abençoada!!!... Ademais, ajuntai a isto que a contrição espalha nos corações o mais rico tesouro que podemos possuir sobre a terra, quer dizer: a paz interior e a tranquilidade da alma.

Caríssimos, pode acontecer que o demônio coloque em vossas cabeças e nos vossos corações, escrúpulos. Mais ou menos assim: dissestes todos os pecados? Destes, de fato, todas as explicações? Será que o confessor compreendeu-vos bem? Pois bem! se apesar de todos estes pensamentos extravagantes, quereis viver tranquilos e trazer vosso coração em paz, fazei o possível para ter uma contrição verdadeira, detestando o pecado pelo amor de Deus, soberano bem; esta dor perfeita curará por si só todas as vossas feridas e suprimirá todos os defeitos que teriam podido resvalar, contra vossa vontade, nas confissões passadas. Ó amável contrição, que nos faz gozar um paraíso antecipado!... Por isso, o melhor conselho que um sacerdote possa dar a alguém, máxime, aos escrupulosos é esse: "caríssimos, em lugar de ficar atormentando vossas cabeças com exames de consciência demasiadamente demorados, meditai na Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo. O Pai nos amou de tal modo que nos enviou do céu seu próprio Filho, e Jesus Cristo, Deus e Homem verdadeiro, amou-me de tal modo, que não podia fazer mais do que fez para que eu com um único ato de amor a Ele, recebesse pelo seu Sangue derramado na Cruz, o perdão de todos os meus pecados, bastando ter, mesmo só implícito, o desejo de receber o sacramento da Penitência.


Suponhamos que vos achais em estado de pecado mortal. Que seria de vós se não tivésseis tempo de vos confessar? Que seria se morrêsseis no meio dos campos, se fôsseis surpreendido por um acidente imprevisto, e que não tivésseis um confessor ao vosso alcance? Eis aqui um grande motivo de consolação: fazendo um ato de contrição, sereis justificados tão bem como se estivésseis confessado, ainda que fique sempre a obrigação de confessar os pecados dos quais se tem arrependimento, e se não deva diferir por muito tempo a confissão. Ó amável contrição, que nos abre as portas do céu, nos fecha as do abismo, põe em fuga os demônios, nos dá o glorioso caráter de filhos e amigos de Deus, e nos faz gozar desde este mundo as delícias do céu! Amém!

sábado, 21 de março de 2020

MEIOS PARA SE OBTER A ATRIÇÃO E A CONTRIÇÃO

LEITURA ESPIRITUAL MEDITADA

1.  ORAÇÃO: O primeiro meio e o principal é recorrer a Deus pela oração. Com as forças da nossa livre vontade, infelizmente podemos pecar, mas com essas forças só não nos podemos levantar. Ainda mais: fazer de um pecador um justo é a obra prima da onipotência de Deus; é uma obra muito maior do que criar um novo sol ou um mundo novo, maior do que dar a vida a todos os cadáveres que povoam um cemitério. Caríssimos, devemos refletir na negligência imperdoável desses cristãos que não cuidam em se recomendar a Deus para ter essa verdadeira dor. Vemos como muitos recomendam-se a Deus para obter uma grande colheita de café, ganhar processo, curar-se de uma moléstia; conseguir um emprego etc.. Nestes meus mais de 45 anos de sacerdócio, posso contar nos dedos das mãos as pessoas que me pediram missas para alcançar a graça da contrição. Daí, quantas confissões sem o devido arrependimento!

2. FAZER FREQUENTES ATOS DE CONTRIÇÃO: Como se aprende uma arte qualquer? Pelo uso e o exercício. Certamente, quem quer aprender uma língua estrangeira, não bastaria pegar no livro, três ou quatro vezes por ano. E o perigo é, além de fazer poucas vezes o ato de contrição, ainda pior, é que, às vezes, fazem-no de um modo maquinal, sem pensar no que dizem. Devemos tomar o santo hábito de fazer de manhã e à noite o ato de contrição e, mais importante ainda, procurar fazê-lo o melhor possível. Devemos fazê-lo, é claro, antes de nos confessarmos e antes de recebermos a absolvição. Na verdade, o Ato de Contrição maior, aquele tradicional, inclui o pedido da contrição e depois também da atrição: "Senhor meu Jesus Cristo, Deus e Homem verdadeiro, Criador e Redentor meu, por serdes Vós quem sois, sumamente bom e digno de ser amado sobre todas as coisas, porque Vos amo e estimo, pêsa-me de todo coração de Vos ter ofendido [até aqui o Ato de Contrição], pêsa-me também por ter perdido o céu e merecido o inferno [ato de atrição]... etc.

3. FAZER EM ESPÍRITO TRÊS VIAGENS: Ao inferno, ao céu e ao Calvário. As duas primeiras para se obter a atrição; e a terceira para se conseguir a contrição. MEDITAR NO INFERNO: Entrar ali em pensamento naquele lugar de tormentos, e ver o lugar que merecemos pelos pecados mortais (mesmo que seja um só), no meio do fogo eterno, na companhia dos demônios e dos réprobos. Então agradecer a Deus não nos ter precipitado ali, e suplicar que tenha misericórdia de nós. Esta meditação serve par excitar em nossa alma um vivo temor de Deus, que pune o pecador de uma maneira tão terrível.  MEDITAR NO CÉU: Ali contemplar esta morada da Glória e da Felicidade. Lamentar à sua entrada, que o pecado fechou as suas portas, e suplicar ao Senhor que as abra. Esta meditação serve para formar em nosso coração uma doce confiança na misericórdia do Senhor, que não quer a morte do pecador, mas a sua conversão e a sua vida. MEDITAR NO CALVÁRIO, ou seja, NA PAIXÃO E MORTE DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO: Aí, fixando o Salvador crucificado, devemos dizer: Eis ali a minha obra: eu sou a causa das dores de Jesus Cristo; cooperei, por meus pecados, com os outros pecadores, para cobrir de chagas este corpo sagrado, para crucificá-Lo, para lhe dar a morte. Ó Jesus, que mal me tínheis feito? Como pude tratar-Vos assim a Vós, que me amastes até ao excesso, a Vós, a quem eu deveria amar com um amor infinito, se pudesse amar infinitamente. É porque sois infinitamente amável que eu Vos amo e que me arrependo de Vos ter ofendido.

Caríssimos, oh! se nós seguíssemos este método, quanto fruto tiraríamos das nossas confissões!

4. FAZER A VIA SACRA:  Havendo tempo, é sumamente recomendável porque completa a meditação anterior sobre a Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo. É mais uma oração e ação muito eficazes para se obter de Deus o arrependimento perfeito, ou contrição.


5. PEDIR ESTA GRAÇA A MARIA SANTÍSSIMA: Mãe das Dores e reconciliadora dos pecadores com Deus, ou seja, Advogada dos pecadores, ela ouve nossa oração e pede a Jesus que mude a água lodosa dos nossos pecados no vinho delicioso da graça divina. Amém!

sexta-feira, 20 de março de 2020

DOR PERFEITA E DOR IMPERFEITA DOS PECADOS

LEITURA ESPIRITUAL MEDITADA

Caríssimos, vimos na postagem anterior sobre este assunto, quais as condições que deve ter a nossa dor, para nos dispor ao perdão das nossas faltas na confissão. Vamos ver neste artigo que esta dor pode ser perfeita ou imperfeita. A dor perfeita chama-se contrição, e a imperfeita, atrição. A CONTRIÇÃO  é a dor que se tem do pecado, porque ofende a bondade de Deus. Os teólogos dizem que a contrição é um ato formal de perfeito amor para com Deus; porque, para aquele que tem a contrição, o que excita a arrepender-se de ter ofendido a Deus é o seu amor para com a bondade de Deus; é, pois, muito útil fazer, antes do ato de contrição, um ato de amor a Deus, desta maneira: "Meu Deus, porque sois a Bondade infinita, eu vos amo acima de todas as coisas; e, porque vos amo, pesa-me, acima de tudo, de vos ter ofendido". Resumindo: o motivo predominante da dor não é o temor do inferno nem a fealdade do pecado, mas o amor de Deus.

A ATRIÇÃO  é também uma dor de ter ofendido a Deus, mas proveniente de um motivo menos perfeito, como a fealdade do pecado, ou o dano que ele causou, seja o inferno merecido, seja o paraíso perdido.

Assim, a contrição é um arrependimento do pecado por causa da injúria feita a Deus, e a atrição é um arrependimento do pecado por causa do mal que dele resulta para nós.

Pela contrição, recebe-se no mesmo momento a graça santificante, antes de receber a absolvição do confessor, contanto que se tenha intenção, ao menos implícita, de receber o sacramento. Mas pela atrição não se obtém a graça santificante senão recebendo a absolvição. É o que ensina o Santo Concílio de Trento.

Pergunta-se se, para receber a absolvição, é necessário que a atrição esteja unida ao AMOR INICIAL,  quer dizer: a um começo de amor. É claro que sobre isto não paira nenhuma dúvida, porque o próprio Concilio Tridentino ensina que uma das disposições que devem ter os pecadores para serem justificados é que comecem a amar a Deus. A dúvida está em saber como deve ser este começo de amor. Aí, há muitas opiniões entre os teólogos, mas sabemos qual é a aprovada pela Igreja, como veremos abaixo.

Alguns querem que seja um ato de amor predominante. São desta opinião os que têm laivos de Jansenismo. E, portanto, não é aprovada pela Igreja. Vejamos; dizem que o pecador ame a Deus acima de todas as coisas. Mas não raciocinam bem; pois, quem ama a Deus acima de todas as coisas, ama com um amor perfeito, o qual perdoa e apaga o pecado. O Papa Gregório XIII condenou uma proposição de Baio, afirmando que o amor de Deus pode existir com o pecado. Baio falava do amor, que é, segundo S. Paulo, a plenitude da lei (Rom. XIII, 10). Ora, qual é este amor que cumpre a lei? É o amor predominante, pelo qual se ama a Deus sobre todas as coisas. Santo Tomás de Aquino ensina que, amando a Deus sobre todas as coisas, cumprimos este preceito de Jesus Cristo: "Amareis o Senhor vosso Deus de todo o vosso coração" (Mat. XXII, 37): "Quando nos é ordenado, diz S. Tomás, amar a Deus de todo o nosso coração, isto significa que devemos amá-Lo sobre todas as coisas". Daí conclui que o amor de Deus não pode existir com o pecado mortal.

Temos, além disso, vários textos da Sagrada Escritura, para nos assegurar que quem ama a Deus é amado por Deus: "Eu amo aqueles que me amam" (Prov. VIII, 17); "Aquele que me ama será amado de meu Pai e eu o amarei também" (Jo. XIV, 21). "Quem permanece no amor, permanece em Deus e Deus nele" (1 Jo. IV, 16); "O amor resguarda a multidão dos pecados" (1 Pedro, IV, 3).

Segue-se daí que toda a contrição, que é um ato de amor, mesmo em um fraco grau, contanto que seja realmente contrição, perdoa todos os pecados graves. Suposto isto, resulta que pelo começo de amor, que deve estar unido à atrição, não se pode entender o amor predominante; pois, por mais fraco que fosse este amor, seria sempre o amor perfeito, e conseguintemente, em lugar de atrição, ter-se-ia contrição; de modo que, se uma tal disposição fosse necessária, todos os penitentes já estariam absolvidos antes de se confessar; e então o sacramento da Penitência não seria mais um sacramento de mortos, mas um sacramento de vivos; a absolvição não seria mais uma verdadeira absolvição, antes uma simples declaração da absolvição já recebida, como pretendia Lutero; o que se não pode dizer, segundo o Concílio de Trento.


CONCLUSÃO: Não é pois, necessário que o começo de amor, que deve acompanhar a atrição, seja um ato de amor predominante; basta que seja um simples começo de amor, tal como é o temor dos castigos eternos, entre os quais, aliás, o maior é a perda de Deus. "O temor de Deus, diz-nos o Espírito Santo, é o começo do seu amor" (Eclesiástico XXV, 16). A vontade de não mais ofender a Deus é também um começo de amor; da mesma maneira, a esperança do perdão e dos bens eternos, que Deus promete aos penitentes. Quando se espera pelo bem de alguém, diz Santo Tomás, começa-se a amar esse alguém. É por isso que, quando nos vamos confessar, é bom juntar ao ato de dor um ato de esperança de obter o perdão das nossas faltas pelos méritos de Jesus Cristo, segundo o que ensina, ainda o Concílio de Trento, pois, sabe-se que é por esta esperança que os penitentes se devem preparar para receber de Deus a remissão dos seus pecados.   

quinta-feira, 19 de março de 2020

A DOR E DETESTAÇÃO DOS PECADOS OU CONTRIÇÃO

LEITURA ESPIRITUAL MEDITADA

 O Sacrossanto Concílio de Trento assim define a contrição: "É uma dor da alma e detestação do pecado cometido, com o propósito de não mais pecar para o futuro". A contrição foi necessária em todos os tempos para obter o perdão, e é ela que prepara o homem para a remissão dos pecados.  Daí o mesmo Concílio Tridentino declarar que a contrição não compreende somente a cessação do pecado e o começo de uma vida nova, mas ainda o ódio `a vida passada, segundo estas palavras do Espírito Santo: "Lançai para longe de vós todas as vossas iniquidades, e fazei em vós um coração novo e um espírito novo" ( Êxodo, XVIII, 31).

E, na verdade, quem considerar atentamente estes lamentos dos santos: "Pequei contra vós só, ó meu Deus, fiz o mal em vossa presença" (Salmo 50); "Todas as noites rego meu leito com lágrimas; recordarei todos os anos da minha vida na amargura do minha alma" (Salmo 6).

Caríssimos, todo aquele que meditar bem nestes lamentos dos santos, compreenderá que eles provêm de um verdadeiro ódio à vida passada e de uma profunda detestação dos seus pecados. E justamente por força deste arrependimento interno, não perdiam oportunidade de fazer penitências exteriores, e aceitavam todos os sofrimentos e tribulações como merecidas pelos seus pecados. O exemplo clássico que se dá no Antigo Testamento é o do Rei Profeta Davi. É muito salutar meditarmos nos Salmos penitenciais que, pela Vulgata tradicional, são:  6, 31, 37, 50, 101, 129, 142. Os dois mais conhecidos são: O "Miserere" (Salmo 50) e o "De Profundis" (Salmo 129).

A dor ou arrependimento dos pecados cometidos é de tal modo necessária para se obter a remissão deles, que, sem esta disposição, Deus não perdoa. Nosso Senhor Jesus Cristo disse: "Se não fizerdes penitência, todos perecereis". E, como já explicamos, trata-se primeiro da penitência interior, ou seja, a dor ou contrição do coração. Como dizia o Espírito Santo pelo profeta Joel: "Rasgai os vossos corações e não as vossas vestes" (Joel, II, 13).

Pode acontecer que alguém se salve sem exame de consciência e sem confissão, como quando, não podendo confessar-se, por falta de tempo ou de sacerdote, faz um ato de verdadeira contrição perfeita à hora da morte; mas sem arrependimento é impossível salvar-se, mesmo que conte direitinho todos os pecados.


É preciso assinalar aqui o erro de certos penitentes que, em sua preparação para a confissão, não procuram senão lembrar-se dos seus pecados, e não se aplicam absolutamente a conceber uma verdadeira dor. Esta dor devemos nós pedi-la insistentemente a Deus; antes de nos apresentarmos ao confessionário, tenhamos cuidado de dirigir uma Ave-Maria à Santíssima Virgem, Mãe das Dores, afim de que nos obtenha um verdadeiro arrependimento dos nossos pecados. Lemos na vida do Santo Cura d'Ars como ele avisava sempre seus paroquianos sobre isso. Costumo pregar nos retiros que antes de tomarmos o caminho do confessionário, devemos fazer mentalmente três viagens: irmos até ao Céu que perdemos; até ao inferno que merecemos; até ao Calvário onde vemos Jesus chagado e morto na cruz por causa de nossos pecados. Amém!

quarta-feira, 18 de março de 2020

LIÇÕES DE UMA PANDEMIA


                                                          Dom Fernando Arêas Rifan*

            O grande mal provocado pelo novo Corona Vírus e a enfermidade por ele provocada, a COVID-19, deve nos trazer algumas reflexões sensatas.
            Deus não é autor do mal. O mal é proveniente da nossa finitude, pois só Deus é o sumo bem e a suma perfeição.  É consequência às vezes do mau uso da nossa liberdade e, muitas vezes, dos nossos pecados. Mas Deus só permite um mal para dele tirarmos algum bem. E podemos tirar sim.
            Iniciamos a Quaresma, na Quarta-feira de Cinzas, com a reflexão que a
Igreja nos propôs: “Lembra-te, homem, que és pó e em pó te hás de tornar”. Essa doença vem nos lembrar a nossa pequenez. O homem, orgulhoso de sua ciência e de suas conquistas tecnológicas em todos os campos, prostra-se de joelhos diante de um ser ultramicroscópico, que põe toda a humanidade temerosa. Realmente nós não somos onipotentes e tão poderosos: só Deus o é. Portanto, a primeira lição é de humildade.
            Por isso, recorramos a Deus onipotente, pedindo-lhe que afaste de nós esta calamidade: “ela não é enviada por Ele, mas permitida, para que nos convertamos de nossa soberba e desmando na organização dos recursos da criação...” (Dom Pedro Cipollini). A oração é necessária. É o reconhecimento da nossa impotência diante de Deus todo-poderoso e de nossos pecados, muitas vezes causa da desordem e dos males. Segunda lição: oração.
            “Nas tempestades da vida, nos momentos de desorientação, o homem não pode contar apenas com as próprias forças. É preciso ter fé e recordar que Deus pode nos salvar de todas as tempestades”. Palavras do Cardeal Angelo Comastri, arcipreste da Basílica de São Pedro, lembrando da tempestade no Mar da Galiléia, com os apóstolos temerosos acordando Jesus. “Temos que recordar sempre que Deus pode nos tirar de todas as tempestades, desde que tenhamos fé e abramos o nosso coração a Ele”. Oração com fé e humildade.
            Se de um lado devemos recorrer à oração, com confiança em Deus, por outro lado devemos usar todos os recursos, prevenções e assepsias que os médicos e os profissionais da saúde nos recomendam. “Honra o médico, porque ele é necessário; foi o Altíssimo quem o criou” (Eclo 38, 1). “Peca na presença daquele que o criou quem não se submete ao tratamento do médico” (Eclo 38, 15). Jesus disse: “Os doentes precisam de médico” (Mt 9, 12).
            E não devemos “tentar a Deus”, ou seja, fazer coisas imprudentes e perigosas para a nossa saúde, confiando erradamente que Deus nos protegerá (Mt 4, 7). Prevenção e cuidados.
            Essa calamidade nos ensina ainda que todos somos iguais em natureza, sem distinção de classes, cor, nacionalidade, sexo, etc, fracos e débeis, precisando sempre e dependentes uns dos outros. Isso nos obriga a cuidarmos uns dos outros, à solidariedade e à caridade.
            Que Maria Santíssima, saúde dos enfermos, nos proteja, e São José, cuja festa celebraremos amanhã, nos defenda de todo mal.

                                                                                                                                                                                                                    *Bispo da Administração Apostólica São João Maria Vianney                                                                                                                                        

terça-feira, 3 de março de 2020

NORMAS SOBRE A COMUNHÃO DOS FIÉIS


 
Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney

NORMAS PARA A COMUNHÃO DOS FIÉIS


            Em nossa Administração Apostólica, na qual, em perfeita comunhão com a Igreja, conservamos como forma ritual própria a forma extraordinária do Rito Romano, conforme nos concedeu a Santa Sé, conservamos também a comunhão na boca para os fiéis.
            As razões para se conservar a prática da comunhão na boca foram elencadas na Instrução Memoriale Domini, da Congregação para o Culto Divino, de 29/5/1969, sobre a maneira de distribuir a comunhão, redigida por mandato especial do Papa S. Paulo VI, aprovada por ele mesmo, em virtude de sua autoridade apostólica:
“... Decerto é verdade que um uso antigo já permitiu aos fiéis tomar este divino alimento em suas mãos e colocá-lo, eles próprios, em suas bocas... Posteriormente, com uma compreensão mais profunda da verdade do mistério eucarístico, de seu poder e da presença de Cristo nele, sobreveio um maior sentimento de reverência para com esse sacramento e sentiu-se que se demandava uma maior humildade quando de seu recebimento. Foi, portanto, estabelecido o costume do ministro colocar uma partícula de pão consagrado sobre a língua do comungante”.
“Esse método de distribuição da Santa Comunhão deve ser conservado, levando-se em consideração a situação atual da Igreja em todo o mundo, não apenas porque possui por trás de si muitos séculos de tradição, mas especialmente porque expressa a reverência do fiel pela Eucaristia. O costume não prejudica de modo algum a dignidade pessoal daqueles que se aproximam deste augusto sacramento: é uma parte daquela preparação que é necessária para uma recepção mais frutuosa do Corpo do Senhor”.
            “Essa reverência exprime bem a comunhão, não ‘de um pão e de uma bebida ordinários’ (São Justino), mas do Corpo e do Sangue do Senhor, em virtude da qual ‘o povo de Deus participa dos bens do sacrifício pascal, reatualiza a nova aliança selada uma vez por todas por Deus com os homens no Sangue de Cristo, e na fé e na esperança prefigura e antecipa o banquete escatológico no Reino do Pai’ (S. Congr. dos Ritos, Instr. Eucharisticum Mysterium, 3).”
            “Por fim, através dessa maneira de agir que deve já ser considerada tradicional, assegura-se mais eficazmente que a santa comunhão seja administrada com a reverência, o decoro e a dignidade que lhe são devidos de sorte que seja afastado todo o perigo de profanação das espécies eucarísticas, nas quais, ‘de uma maneira única, Cristo total e todo inteiro, Deus e homem, se encontra presente substancialmente e de um modo permanente’ (S. C. dos Ritos, Instr. Eucharisticum Mysterium, 9); e para que se conserve com diligência todo o cuidado constantemente recomendado pela Igreja no que concerne aos fragmentos do pão consagrado:O que permitistes cair, pensa nele como se tivesses perdido um de teus membros’ (São Cirilo de Jerusalém).”
            (Sobre a mudança para a prática de colocar as hóstias consagradas nas mãos das pessoas): “Uma mudança em matéria de tal importância, baseada em uma antiga e venerável tradição, não afeta somente a disciplina. Carrega certos perigos consigo, que podem surgir de uma nova maneira de administrar a Santa Comunhão: o perigo da perda de reverência pelo augusto sacramento do altar, de profanação, de adulteração da verdadeira doutrina” ...

            Assim, por essas razões, não obstante a permissão da Santa Sé para outros métodos, conservamos aqui a prática tradicional da comunhão na boca.

            Nas atuais circunstâncias, com o perigo de contaminação do novo Corona Virus, para a segurança e saúde dos nossos fiéis, damos as seguintes normas:
1.      Escolham-se partículas maiores (de 33 a 40 mm) para a comunhão dos fiéis;  
2.      Os sacerdotes lavem bem as mãos antes da celebração e passem álcool em gel;
3.      A comunhão aos fiéis seja dada de modo mais lento e cuidadoso;
4.      Para a comunhão, os fiéis devem ter a cabeça ligeiramente voltada para cima, colocar a língua sobre o lábio inferior e não fazer nenhum movimento com a cabeça em direção à mão do sacerdote, pois é ele que faz o movimento ao nos dar a comunhão. Também os fiéis não devem fazer o sinal da cruz nem inclinação com a cabeça.
5.      Na forma extraordinária, o ministro diz “Corpus Domini Nostri Iesu Christi custodiat animam tuam in vitam aeternam” (“O Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo guarde a tua alma para a vida eterna”) e o fiel não precisa dizer Amém.
6.      Um acólito ou coroinha deve portar, ao lado do ministro que dá a comunhão, um recipiente com álcool em gel, para o ministro limpar os dedos, caso toque na boca ou língua de algum fiel, antes de dar a comunhão ao próximo comungante. Depois, esse recipiente deverá ser purificado e o álcool remanescente lançado na piscina da sacristia.

“Ave verum corpus natum de Maria Virgine” (Salve, verdadeiro corpo nascido da Virgem Maria). “Adoro te, devote, latens deitas” (Adoro-te devotamente, ó divindade escondida) (cf. S. João Paulo II, enc. Ecclesia de Eucharistia, n. 59).  


        Campos dos Goytacazes, RJ, 3 de março de 2020
                  + Dom Fernando Arêas Rifan
      Bispo da Administração Apostólica P. São João Maria Vianney