sábado, 16 de abril de 2022

SEPULCRO DE jESUS

 Para um Deus, o sepulcro é o último grau de humilhação!

   "Aniquilou-Se a si mesmo". Só achamos uma imagem desta humilhação na comunhão. Ali também não é só Deus que desaparece, é o próprio homem, e ainda mais que na sepultura, onde ao menos conservava a forma exterior de um corpo humano. Não se abaixou tanto na Eucaristia, senão para nos inspirar a confiança de que precisávamos, para comer a sua carne e beber o seu sangue. Preparemos-Lhe no nosso coração um sepulcro, em que tenha gosto de estar. José e Nicodemos receberam o divino corpo privado de vida: nós recebemo-Lo vivo e dando a imortalidade!

 Depois da morte,o Corpo de Jesus é descido da Cruz, depositado por alguns instantes nos braços de sua inconsolável Mãe que O cobre de lágrimas, e em seguida prestam-Lhe, como aos outros homens, as honras da sepultura. É hoje que se verifica plenamente a palavra de São Paulo: "Aniquilou-se a si mesmo".


 "Seu sepulcro será glorioso". A terra e os Céus vão regozijar-se deste triunfo; felizes os vossos verdadeiros servos fiéis, porque participarão dele um dia.  É impossível deixar de ver os desígnios da Providência divina, ao permitir que se fechasse a entrada do sepulcro com uma grande pedra, e que fosse mandado selar e guardar. Com efeito, Deus queria que todas estas precauções servissem para comprovar a morte e sepultura do seu Filho; queria com isto refutar de antemão a fábula ridícula do roubo do corpo, e dar à ressurreição uma certeza que vencesse a mais obstinada incredulidade. Só Vós, ó meu Salvador, achais na vossa sepultura o princípio do triunfo que vosso Pai vos confere. Profundamente humilhado no sepulcro, sois glorificado pelo mesmo sepulcro.




Igreja do Santo Sepulcro
Caríssimos, na verdade, o sepulcro de Nosso Senhor Jesus Cristo é uma escola de perfeição. Naquelas trevas em que se envolve, também nos diz que amemos a vida solitária, porque é muito favorável à inocência e ao progresso da virtude. É também um belo modelo de obediência: é um corpo morto. Mas admiro ainda mais a obediência que presta a seus ministros sagrados, que dispõem dele como querem, É inacessível a toda a corrupção por causa da divindade a que está unido. Também nós, se permanecermos unidos a Jesus pelo amor, conservar-nos-e-mos incorrutos embora  vivendo no mundo que é um sepulcro de corrupção. No sepulcro Jesus conserva toda a força para sair dele; também nós receberemos da nossa união com Jesus, o poder de vencer as paixões e o inferno, e como o Divino Salvador, alcançaremos também a glória da ressurreição. Amém!

sexta-feira, 15 de abril de 2022

A CAMINHO DO CLAVÁRIO E A CRUCIFIXÃO

 

A CAMINHO DO CALVÁRIO, CRUCIFIXÃO

  Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!

   Acompanhemos o Divino Salvador até ao Calvário!
   
  A multidão sanguinária, continua em furor, gritando: retirai esse homem de nossas vistas e mandai que ele seja crucificado!
   
   Pilatos ainda faz alguma resistência, mas já se mostra vacilante. 

   "Se dás liberdade a esse homem", gritam todos os sinedritas, "não és amigo de César; porque todo aquele que se faz rei é um revoltado contra César".

   Era o golpe derradeiro!!!

   À evocação do nome de César, vacila o Governador romano, como fulminado por um raio. Os doces pedidos da graça foram abafados pelas ambições humanas! Pilatos tem medo. Lava as mãos do Sangue inocente e pronuncia a sentença de morte. 

   - Serás crucificado! 


 Triunfam enfim os inimigos de Jesus. Pronunciada a sentença ardentemente desejada, organiza-se a via sacra para o Calvário:
    Como outrora Isaac levando sobre os ombros o lenho do holocausto, Jesus sobe a ríspida ladeira que dá para o Calvário a essa hora abafadiça e irrespirável. 
  
   Eis o alto do Calvário!

  Omitimos aqui, o encontro de Jesus com Sua Santíssima Mãe. Na Quarta-feira Santa já publicamos o Sermão do Encontro. 

   Aí no Calvário, permaneçamos até o fim. Agora, em companhia de Jesus e também de Sua Mãe Santíssima, deixemos que a dor invada nossos corações, contemplando essas duas vítimas inocentes unidas num mesmo sacrifício. O que se passou no alto do Calvário deve ficar gravado em nossos corações! 

   "Posta a cruz, diz Padre Vieira, naquele lugar do monte onde havia de ser levantada, enquanto uns abriam o cova, e outros preveniam os instrumentos, mandaram ao Senhor que se despisse; (...) Despido, com os olhos no chão, mandam-lhe que se deite na cruz. Levantou o Senhor os olhos ao Céu, pôs os joelhos em terra, cruzou as mãos sobre o peito, oferecendo-se ao sacrifício; e fazendo logo com grande sujeição e humildade o que lhe mandavam, deitou-se sobre a cruz, estendeu os braços sobre os braços da cruz, e os pés para a parte dos pés, e a cabeça sobre os espinhos". 
   Eterno Pai, se não há piedade na terra, esperamo-la do céu!!!
  Já Isaac está deitado sobre a lenha! Já está conhecida a obediência de Vosso Filho. Já mostrou que estima mais a Vossa Vontade que a Sua vida. Se é necessário sangue para a Redenção, já está derramado muito mais que o bastante.
   Senhor, suspende o golpe! 
   Pecadores, avaliai agora o pecado pela resposta que é dada a esta súplica; mas ai, que já os algozes têm nas mãos os cravos. Já vejo levantar o martelo. - Eterno Pai, não poupareis o Vosso Filho? - Não! Vejo n'Ele os pecados dos homens. Execute-se o golpe, diz a Divina Justiça, preguem-se os pés, preguem-se as mãos, consume-se o sacrifício...
   E assim se fez...
   Começam a pregar primeiro a mão esquerda, depois a direita, ultimamente os pés. As cruéis marteladas fazem ecos pelos vales daqueles montes; mas muito maior eco faziam no coração da lastimosa Mãe. No corpo do Filho, diz Vieira, davam-se as marteladas divididas, porque umas feriam os pés; outras a mão direita; outras a  esquerda; porém na Senhora todas batiam e descarregavam juntas no mesmo lugar, porque todas feriam o coração. 

   Pregado, enfim, na cruz, o nosso amoroso e pacientíssimo Jesus, tomaram os algozes a cruz em peso e ficou arvorado no monte Calvário o estandarte de nossa Redenção. 

   Oh! que dor! Oh! que tormento! Oh! que ânsia daquela humanidade sagrada, neste rigorosíssimo ato!. Caiu a cruz de golpe na cova, que era funda; estremeceu e ficou suspenso com todo o peso; e com este abalo de todos os membros e de todas as veias, as quatro fontes de sangue que estavam abertas, começaram a correr com maior ímpeto, e a regar a terra. ...


 Oh! que afligido, que angustiado vos vejo, meu Jesus!
   Se o Senhor se queria firmar sobre os cravos dos pés, mais feriam-se os pés; se se queria suspender sobre os cravos das mãos, rasgavam-se mais as mãos; se se queria arrimar à cruz, cravavam-se mais os espinhos. 
   Faltava-Lhe o sangue para o alento, faltava-Lhe o ar para a respiração, e até  a terra, que não falta aos bichinhos dela, faltava ao Criador do céu e da terra! Pode-se, continua o Padre Vieira, considerar mais extrema miséria e desamparo? Que morra o Filho de Deus, e que o matem os homens; e que nem sete pés de terra sobre que morrer, lhe concedam! Oh extremo de ingratidão, só igual ao extremo de tal amor!

   Prometido o Paraíso ao ladrão que se arrependeu, tratou o Senhor de se despedir e de fazer o Seu testamento. Bens deste mundo, de que testar, não os tinha, porque nunca os tivera; e os pobres vestidos com que se cobria, que é só o que possuía, não os deixou, nem os pôde deixar; porque pertenciam aos algozes que já os tinham repartido entre eles. O que tinha e Lhe restava nesta vida e desta vida era uma Mãe e um amigo que, de todos, foi o único Lhe fora fiel. Olhou, pois para a Mãe e para o discípulo amado e disse à Mãe:  "Mulher, eis aí o teu filho";  e ao discípulo: "Eis aí a tua Mãe".

   Que breves palavras, mas quão agudas e lastimosas! Agudas e lastimosas para o coração da Mãe, agudas e lastimosas para o coração do Filho. Considerai, almas devotas, qual seria a dor daquela tão amorosa e afligida Mãe, ouvindo estas palavras. Quanto lhe partiria o coração, ver que em lugar do Seu Jesus, lhe davam outro filho ou outros filhos!
   Maria olhou em torno de si. Ali estava João, o moço angélico e puro. Mas, estavam também: Madalena, os algozes, o mau ladrão. Pois também a estes haveria Ela de os acolher como filhos. João, Madalena e o mau ladrão representavam no alto do Calvário as três classes de almas de que se compõe a humanidade: almas puras e sem pecado, almas pecadoras que se arrependem e almas pecadoras não arrependidas. E Maria realmente compreendeu o alcance da profecia do Velho Simeão. Era preciso que também Ela, nesta hora de silêncio, de angústias e de trevas, oferecesse o coração à espada do profeta, para que, desta ferida aberta, nascêssemos todos nós, os filhos de sua dor. 

   Maria, sois nossa Mãe! Vós que sois a onipotência suplicante; vós que sereis sempre toda amor e bondade, porque sempre sereis Mãe, velai por nós! Amém!
   

segunda-feira, 11 de abril de 2022

FLAGELAÇÃO E COROAÇÃO DE ESPINHOS

  
   Continuemos a acompanhar o Nosso Divino Mestre em sua Paixão.

   "Attritus est propter scelera nostra". "Foi despedaçado por causa dos nossos crimes". (Isaías, 53, 5). 

   O Governador romano, surpreendido pela escolha que fizeram, condena o Salvador a uma cruel flagelação, julgando assim deixar seus inimigos satisfeitos.


Apenas foi proferida esta iníqua sentença, os algozes e os soldados se apoderam da Vítima Santa. Despem Jesus de Seus vestidos. Prendem-no à uma coluna e com toda força e brutalidade fazem voar a sua carne em pedaços e jorrar seu sangue na terra, com fortes e repetidos golpes dos açoites. 

    Ó Céus! Que confusão para o Deus que cobre a terra de nuvens, o firmamento de glória, que reveste os pássaros de sua plumagem, as flores de seu esmalte, os lírios dos campos de sua candura... ver-se exposto no estado de nudez à vistas impuras. Porém, os seus verdugos não estão ainda saciados; eles tecem uma coroa de espinhos, e com ela cingem a cabeça do Filho de Deus; estendem sobre os Seus ombros um andrajo de púrpura. Colocam em Suas mãos uma cana, para deste modo, irrisoriamente representarem a Sua Divina Realeza. Depois de O terem assim preparado, como um rei de teatro, ajoelham-se diante d'Ele por escárnio; cobrem a Sua Face de escarros. E Pilatos, vendo Jesus assim maltratado, julgou que mostrando-O ao povo excitaria compaixão. E foi assim flagelado e desfigurado que Pilatos o mostrou à multidão: "Ecce Homo!" Eis o homem!
    Eis o homem que curou os vossos doentes, ressuscitou os vossos mortos! Ainda não O maltratastes bastante?!
     Ah! estas expressões são dirigidas agora a todos os pecadores: "Ecce Homo!" Mundanos, diante de um Deus açoitado e coroado de espinhos para pagar a vossa moleza e a vossa sensualidade:  É uma ingratidão, é uma tirania, permanecerdes afogados no seio do luxo, da impureza e de tantos prazeres criminosos!...

   "Ecce Homo!" Este quadro, primeiramente é para vós cardeais, bispos, padres que renegaram e renegam a Jesus, com pecados que bradam aos céus, e, em se tratando de pedofilia, a não se converterem e passarem a fazer penitências até a morte, melhor fora que amarrassem uma pedra de moinho ao pescoço e se lançassem ao fundo do mar. 

   "Ecce Homo!" Este quadro é para vós, pais e mães de família, que tendes à vossa guarda a candura virginal das vossas filhas! Filhas abandonadas a todos os perigos da sua inexperiência e da maldade dos homens, com estas vestes imorais e indecentes com que as vestis. 

   "Ecce Homo!" Este quadro é para vós, senhoras levianas e vaidosas, que não chegais a convencer-vos de que os requintes ridículos da moda visam de perto o desprestígio da mulher cristã. 


 Minha alma, enquanto Jesus era flagelado e coroado de espinhos, ultrajado e cuspido, Ele pensava em ti e oferecia a Deus Pai seus acerbos martírios para livrar-te dos flagelos eternos do inferno. Pensava, outrossim, em sua Esposa mística, a Santa Madre Igreja cujos filhos e ministros ingratos também a açoitariam, coroariam de espinhos, cobririam sua santa face com os escarros nojentos da impureza.
 Ó Deus de amor, como pude eu viver tantos anos sem Vos amar! Ó chagas de Jesus, feri-me de amor para com Deus que tanto me amou. Ó Maria Santíssima, Mãe da graça, alcançai-me este amor! Amém!

SERMÃO DA PAIXÃO - PRISÃO E TRIBUNAIS


SERMÃO DA PAIXÃO: A prisão e os tribunais

   Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!

   Tendo meditado na Oração e Agonia do Horto, continuemos a acompanhar a Jesus na Sua Paixão meditando na Sua Prisão e Julgamentos nos diversos Tribunais.

    Tendo ainda a face umedecida e os cabelos encharcados do suor de sangue, caminha Jesus para os discípulos adormecidos, desperta-os e sai ao encontro dos que O buscavam para prender.


 Momento terrível! Era chegada a hora do triunfo das trevas. Alta ia a noite! Os arbustos secos estalam ao peso dos passos de pérfidos e cautelosos soldados. Lá ao longe, se ouvem os gritos sinistros. Aparecem finas pontas de lanças. Aproximam-se os inimigos de Cristo: à frente, manso como um irmão, jovial como um amigo, mas com o demônio no coração e a hipocrisia na língua, avança o triste apóstolo pervertido pela avareza, Judas Iscariotes: "Aquele a quem eu beijar, prendei-o".
   O miserável traidor encosta seus lábios hipócritas e criminosos ao rosto sacrossanto do Filho de Deus. E depois, Jesus afastando-o de leve, como para vê-lo bem de frente, murmurou-lhe baixinho: "Pois assim com um ósculo entregas o Filho do homem? Amigo, que vieste aqui fazer?"
   E tão adormecido lhe estava o remorso na consciência que não despertava Judas a essa voz divina que o chamava para a vida e para a graça.

   Vejo assim, dois homens que se abraçam, que se abraçam e se beijam: Judas e Jesus; o lobo e o cordeiro, a bondade e a perfídia, o amor e o ódio, a santidade e o pecado. Jesus em toda Sua vida foi um mistério de mansidão e bondade que atraía a todos e a todos acolhia compassivo. Tinha gestos de misericórdia, que faziam prostrarem-se a seus pés, contritas e regeneradas as Madalenas penitentes e gratas. Tinha olhares de infinita piedade, que penetravam no íntimo das consciências, transformando-as e purificando-as e levando o bálsamo da esperança aos pobres corações desalentados. 
    Mas, aqui, abraçado a esse homem infame; estreitando contra o Seu coração essa ferida repelente e infecta; colando Seus lábios puríssimos nessa fronte marcada pela mais revoltante de todas as baixezas. Nesse inesquecível abraço, eu O vejo mais belo, mais compassivo, mais generoso do que nunca, porque O vejo infinitamente amável, infinitamente misericordioso!
    Judas e Jesus, estreitamente unidos em doloroso abraço, é a segurança do meu perdão. Tomemos nós, caríssimos, o lugar vazio no Coração de Jesus, rejeitado por Judas orgulhoso e mau; humildes e dóceis, atiremo-nos em Seus braços, com lágrimas de arrependimento e protestos de gratidão. 

   Dado o beijo traidor, logo os algozes lançam-se como feras sobre Jesus, e, algemado como um bandido, levam- No à cidade. Assim preso, manietado, posto entre os malfeitores, lá segue Jesus para o palácio dos Pontífices, onde O aguarda Anás, para um simulacro de processo. 
   E Jesus olhou em volta de si e se viu inteiramente só e abandonado de todos os discípulos. 
   Diante de Anás, esse homem odioso, saduceu infestado de astúcia e crueldade, comparece Jesus, tímida ovelha conduzida ao sacrifício. Está de pé, calmo, sereno e tranquilo, para um julgamento irregular em que é réu a própria santidade, testemunha a monstruosa ingratidão, defensor ninguém, juiz, a hipocrisia. 

   Interrogado sobre sua doutrina, responde Jesus, mansamente, com o respeito devido à autoridade do Pontífice: -"Eu ensinei publicamente no templo e nas sinagogas onde se reúnem os judeus. Por que me interrogas? Pergunta àqueles que me ouviram'. A esta humilde e inocente resposta, um criado do Sumo Sacerdote se avança, levanta sua mão sacrílega e descarrega uma pesada bofetada naquela face augusta, que arrebata os anjos. Ah! exclama Santo Efrém, a terra estremeceu, o céu se revoltou, os anjos se horrorizaram e velaram sua face, mas o Pontífice não protestou!

   Coincidência singular! No momento em que Jesus apela para o testemunho dos Seus discípulos, no pátio da guarda, Pedro acabava de O renegar blasfemando e jurando que não conhecia semelhante homem.

   Na virtude como no pecado há sempre uma gradação perfeita. Desprezar uma graça é desmerecer outra graça. Ceder agora à tentação é preparar o desastre de amanhã. Tal é o exemplo da negação de Pedro. No fundo o orgulho, que se fia em si mesmo e não procura evitar a ocasião. Primeiro, foi uma simples mentira: - "Não serás, acaso do número dos seus discípulos?" - "Não, não sou". Depois foi uma negativa formal: - "Juro-te que não conheço este homem". E finalmente protesta, blasfemando e jurando, que não conhecia semelhante homem".
   
   E ainda a blasfêmia lhe queimava os lábios, segunda vez cantou o galo e recordou-se Pedro, da profecia de Jesus. Neste ínterim, ao fundo do átrio, manietado, aos empurrões, escarnecido e vaiado aparece Jesus que, voltando-se para o discípulo, deixou-lhe cair na alma e no coração um olhar de infinita ternura e carinhosa repreensão. E Pedro, tendo saído para fora do pátio, banha as faces em lágrimas de arrependimento, lágrimas regeneradoras e salutares.

   Coluna e fundamento da Igreja, ó Pedro! Chora e confirma-te no amor de Jesus, por Quem darás a vida com a generosidade de um convertido. Sai daquele lúgubre local.  Vai, Pedro, amanhã Jesus precisará de ti para confirmar os teus discípulos. Vai, receberás as chaves da Igreja, para abrir e fechar; para ligar e desligar os pecados submetidos à tua jurisdição universal. Aprende pois, da tua própria experiência a usar de compaixão para com os pobres pecadores. Tu, barro frágil e quebradiço, saberás que todo homem é do mesmo barro quebradiço e frágil: e tu serás afetuoso, tu serás como o Divino Mestre, todo doçura e compaixão.

   Jesus, tão bom, tão meigo, tão compassivo, está diante de Caifás e do grande Sinédrio, abandonado inteiramente dos seus. Só Lhe ficaram juízes sem entranhas...
    Às calúnias das testemunhas, Jesus responde com a dignidade triunfal do silêncio. E Caifás aproxima-se de Jesus esconjurando-O em altos brados a declarar-lhe se era de fato o Cristo, o Filho de Deus vivo. E recebe de Jesus a mais solene, a mais formal e positiva afirmação da Sua Divindade: "Tu o disseste, eu o sou, e um dia vereis o Filho do Homem assentado à direita do Onipotente vindo sobre as nuvens do céu".
   Blasfemou! rugiu Caifás. "É réu de morte", responderam os pontífices. É réu de morte, exclamou a multidão.      

   Arrastado pelos Pontífices, comparece Jesus perante o tribunal de Pilatos. Pilatos e Jesus se acham em face um do outro. - "És tu, verdadeiramente, o rei dos judeus?" Com olhar profundo, sonda Jesus a alma do governador, interrogando-o: "Dizes isto de ti mesmo, ou repetes o que outros te disseram de mim? O meu reino, continuou Jesus, não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus servos teriam combatido para que eu não caísse nas mãos dos judeus". - Portanto, replica o governador, és tu verdadeiramente rei? - "Tu o disseste. Eu sou Rei. Eu vim ao mundo para dar testemunho da verdade".  - "A verdade! murmurou Pilatos, que é a Verdade?"...
   E a multidão se avolumava mais e mais, excitada pelos pontífices: "É um malfeitor!"
   - Mas não encontro neste homem, motivo algum para condenação!
   - Se não fosse um malfeitor não o teríamos trazido à tua presença.
   Em vão se esforçava Pilatos por arrancar o Salvador do ódio enfurecido da multidão. E o Governador pagão, declarando que n'Ele não encontrava o menor fundamento de acusação; envia-O para Herodes.

   Jesus guarda perante esta orgulhosa corte o mais profundo silêncio; pelo que o rei, considerando-O como louco, O reenvia a Pilatos depois de O ter mandado vestir de branco, como uma representação de demência. 
   Sim, Herodes, Jesus é verdadeiramente um louco, mas é um louco de amor, porque deseja morrer até por aqueles que tão desumanamente O perseguem. 
  
   Jesus novamente diante do Governador. 
  Os judeus continuaram a pedir, em gritos, a morte de Jesus. Pilatos, reconhecendo a Sua inocência, procura livrá-Lo, embora seja necessário para isto, recorrer a um meio infamante.
   Havia um privilégio do povo, para perdoar a um criminoso na Festa da Páscoa. - "Escolhei, disse-lhes Pilatos, escolhei entre Jesus e Barrabás: quem deve ser posto em liberdade".
   Que horrível paralelo! Jesus, o Santo dos Santos! Barrabás, um monstro coberto de crimes! E ambos são pesados na mesma balança!!! - A qual dos dois quereis que vos solte, a Jesus ou a Barrabás? A Jesus que deu a vida aos mortos ou a Barrabás que deu a morte aos vivos?
   - Livrai a Barrabás, a Jesus, condenai-O à morte, gritaram todos a uma só voz. Ó cúmulo de abominação!!!
   E, contudo, é esta a injúria que Jesus recebe constantemente de muitos cristãos. Não é um ladrão, nem um assassino que nós preferimos a Jesus; é um metal, uma vil criatura, uma satisfação criminosa, um degradante prazer de um momento... E quem sabe, se agora eu dissesse a alguns de vós que me ouvis: a quem quereis crucificar em vossa alma: Jesus ou o torpe objeto de vossos criminosos desejos? Alguém me responderia: que morra Jesus, contanto que minhas paixões sejam satisfeitas!

   Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo, compadecei-vos da dor de Jesus, mostrai-Lhe o vosso reconhecimento. Pedi que o seu sangue caia em abundantes bênçãos sobre vós e sobre todas as almas; que ele caia sobre os corações mais duros, para os enternecer, sobre os mais manchados, para os purificar, sobre todos, para os salvar. Amém!
    

A PAIXÃO DE JESUS - A AGONIA NO HORTO DAS OLIVEIRAS

 

ATTRITUS EST PROPTER SCELERA NOSTRA
(Isaías 53,5)
"Foi despedaçado por causa de nossos crimes".

  Pelo Sinal da Santa Cruz, livrai-nos Deus, Nosso Senhor, dos nossos inimigos. Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém!

   Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!

 -  Quem não souber o que é o pecado, quem não lhe conhecer a enormidade, venha ver a satisfação que dele toma o Pai Eterno em seu Unigênito e diletíssimo Filho; "Pelos pecados do meu povo eu o cobri de chagas".

  -  Quem não sabe o estado lastimoso em que o pecado põe a alma de quem o comete, venha ver em que estado a satisfação de nossas culpas pôs a Nosso Senhor Jesus Cristo. Exclama o Profeta Isaías: "não tem nem formosura nem aparência humana".

  -  Se não receais, pecadores, da justíssima indignação de Deus contra vossas culpas, vinde ver a manifestação que delas faz a Justiça Divina em seu amantíssimo Filho. Diz São Paulo: "Deus o propôs para demonstração de sua justiça". Vereis como o fogo da ira de Deus se ateia no ramo florido da inocência de Jesus e daí podereis julgar o que fará no lenho do vosso coração seco e estéril pelo pecado.

   -  E vós, cegos e iludidos, que derramais nas criaturas o amor de um coração que é só de Deus, vinde ver o extremo de amor com Cristo vos ama e deixai-vos por obrigados e vencidos de tão excessiva caridade.

   -  Vinde todos ouvir a lastimosa narração da Paixão e Morte de Cristo. E queira Deus que, esta tristíssima consideração produza nas almas os efeitos devidos. Queria Deus que, aos cristãos que me ouvem, lhes entre no coração a perfeita contrição de seus erros e de suas culpas!

   Mas, que tristíssimo assunto se oferece às nossas piedosas meditações: Um Deus morto, como se fora o mais torpe dos criminosos! Morto numa cruz!!!

   Diante de um Deus crucificado, o vasto universo deve precipitar-se na aflição para chorar a perda de seu divino Autor.
  Diante de um Deus crucificado, a orgulhosa razão adore reverente o mais terno e santo de todos os mistérios!
    Diante de um Deus crucificado, cristãos, meditai, cheios de piedade e de verdadeira compunção sobre o mais trágico acontecimento que se tem dado sobre a terra.

ORAÇÃO E AGONIA NO GETSÊMANI

   Aproximava-se a hora fatal em que as profecias asseguravam ter soado para o Divino Mestre o momento de seus tremendos combates...

  "A minha alma está triste até a morte". Era a agonia que começava!
Terminada a última Ceia, instituído o Sacramento da Eucaristia, reuniu Jesus os discípulos fiéis, encaminhando-se, com passo firme e resoluto para o Jardim das Oliveiras. Entrando no Getsêmani, afastou-se para uma espécie de gruta, recomendando aos discípulos que velassem um instante enquanto Ele ia orar ao seu Eterno Pai. E Jesus começou a sentir tristeza mortal: "
  Uma chuva de iniquidades cai sobre o seu coração! Pálido, abatido, lamenta-se. Foi buscar algum alívio no coração dos seus discípulos. "Eu sinto morrer de tristeza. Se pois, me tendes algum amor, permanecei aqui e velai comigo por uns poucos momentos". Era o tédio, o pavor que abalam o coração até aos fundamentos. Era a tristeza que tudo reveste de sombras funerárias. Era o abatimento que são os preâmbulos da morte que se avizinha. Tal era o estado de Jesus no Jardim das Oliveiras; e no entretanto, os discípulos dormiam. "Assim não pudestes velar comigo alguns instantes?

   Ó vós que estais resolvidos a não mais pecar! Considerai! A maior miséria do homem não é, certamente o ser fraco, senão o reputar-se forte. É o orgulho, a presunção com se fia de si mesmo. Vede os discípulos e aprendei! Fortes, cheios de presunção, julgavam tocar a cabeça nas nuvens e ei-los de repente precipitados até às portas do abismo! Agora dormem; daqui a pouco, fugirão. 
   Desconfiai de vós mesmos - recorrei às luzes da oração, - valei-vos da força dos Sacramentos - vigiai e orai porque a carne é sempre fraca, embora o espírito esteja pronto.

   Outra vez, afastando-se dos discípulos, prostra-se Jesus com a face por terra exclamando em altas vozes: "Meu Pai, meu Pai, tudo é possível à vossa vontade onipotente. Se é pois da vossa vontade, se é possível poupar-me este martírio, passe para longe de mim este cálice de angústias!".
      Não. Não é possível, diz o Eterno Pai, porque este meu filho que é a santidade e inocência infinitas está revestido dos despojos do pecado e é o bastante para torná-Lo odioso aos meus olhos.

   Eis o que é o pecado! No entanto, quantas desculpas e quantas indulgências para o pecado cometido! Ó pecador insensato! Julgas, talvez, que a Justiça Divina aprecia o pecado com a indiferença do homem que o comete?! Não. Por um só pensamento mau que acolheste em teu coração, foi Cristo abandonado a todos os tormentos de sua Paixão. 

   E os pecados dos homens como um cortejo fúnebre, vão passando, um a um, perfeitamente distintos, diante dos olhos apavorados do Salvador. São os pecados dos reis e os pecados dos povos. São os pecados dos ricos e os pecados dos pobres. São os pecados dos velhos e os pecados dos moços. São os pecados dos pais e os pecados dos filhos. São os pecados dos bispos e dos padres e os pecados dos leigos. São os meus pecados e são os vossos pecados. São os pecados de todos nós, em tal dia, em tal hora, em tal lugar, em tal circunstância!

   Vê Jesus os crimes de todos os lugares e tempos, os pecados que desolaram e desolarão as cinco partes do mundo: desde o pecado de Adão e Eva, desde o homicídio de Caim até a última blasfêmia do Anti-Cristo. Ele vê, naquela noite, todas as noites tenebrosas de orgias, de carnaval, todos os crimes mais secretos e vergonhosos. 
   Nessa torrente de iniquidades, Jesus distingue as maledicências e as calúnias, as impurezas e os adultérios, as infidelidades conjugais e os atentados contra a natureza, estes pecados monstruosos desta sociedade moderna tão paganizada e ateia: o divórcio, a limitação criminosa da natalidade, o aborto, a dissolução da família pela legalização de pessoas do mesmo sexo. Jesus distingue as traições e as vinganças; os pensamentos de ódio e os pensamentos de ambição; as dissoluções dos sensuais  e a impiedade dos libertinos; a malignidade dos ateus e as imposturas dos hipócritas. 
   Distingue Jesus a monstruosa ingratidão dos seus escolhidos, os padres e os bispos: uns dormem o sono da inércia, outros estão acordados, mas não para O defender, e sim para aplicar na Sua Face adorável o beijo traidor de Judas. Jesus via o nosso tempo, tempo de modernismo, de deturpação do genuíno espírito do Evangelho.

   Não é para menos!

   Banha-Lhe o corpo, copioso suor de sangue que enche seus cabelos e cai gota a gota por sobre a terra. 

   Ó pecador! Contempla este Sangue Divino, que vês cair gota a gota!... Que lucro tiraste deste Sangue? Tu permaneces insensível na trilha do pecado! Ó tu, católico tíbio, por que vives no comodismo? Que lucro tiraste deste Sangue que vês cair e escorrer por terra? 
 Ó Sangue de Jesus, inebriai-me do santo amor. Ó agonia mortal de Jesus, fazei-me morrer a toda afeto terreno. Meu amado Salvador, salvai-me, estreitai-me convosco, e não permitais que eu venha me condenar.
    Ó refúgio dos pecadores, Maria Santíssima, Mãe do meu Salvador, ajudai um pecador que quer amar a Deus e se recomenda a vós. Socorrei-me pelo amor que tivestes a Jesus Cristo. Amém!