Não há
unanimidade entre teólogos e exegetas na explicação deste carisma.
Uns acham
que consistiria numa espécie de oração em língua estranha com animação de vozes e de gestos.
Renan
(França, + 1892), padre apóstata, historiador, filósofo, exegeta racionalista,
em seu livro HISTOIRE DES ORIGINES DU CHRISTIANISME, t. II. Les Apôtres, p.
66-72, afirma que os Apóstolos no Pentecostes proferiram sons inarticulados. Diz o exegeta e teólogo Renié: "Uma tal
explicação colide com o texto sagrado: 'cada
um de nós os ouvimos falar a nossa língua materna' (At II, 8); além do mais
... a possibilidade duma interpretação, claramente proposta por S. Paulo [I Cor
XIV, 28] sugere que o apóstolo olhava estes sons como possuindo uma
significação".
Outros
pensam que seria falar a língua dos ouvintes (língua que ele não conhece
naturalmente); ou o de, falando em sua língua materna, ser ouvido pelos
assistentes, cada qual em sua própria língua. Tudo isto é inspirado gratuita e
milagrosamente ao pregador que fala em nome de Deus, justamente como
instrumento para tocar os corações, convertendo os infiéis e edificando e
consolando os fiéis.
Santo Tomás
assim o explica: "A faculdade de falar pode significar o uso do idioma
pelo qual quem ensina se faz entender (= é o dom da variedade das línguas). E a faculdade de falar pode
significar também o sentido das palavras proferidas (= é o dom da interpretação das palavras). Falando especificamente do dom
das línguas no Pentecostes, diz o Doutor Angélico:"Assim como os povos,
que caíram na idolatria, segundo refere a Escritura em Gen. XI, vieram a falar
línguas diversas, assim também, quando foram convertidos ao culto de um só
Deus, o dom das línguas vem a ser o remédio a essa diversidade" ...
"Àquilo da Escritura em Atos II, 6: 'A
eles os ouvia falar cada um na própria língua' -diz a Glosa: Porque falaram todas as línguas; ou porque,
falando a própria deles, i. é, a hebraica, eram entendidos por todos como se
falassem a língua particular de cada um... Contudo era mais conveniente falarem
eles as línguas de todos' (S. T. II, II, q. CLXXVI. a.1).
De passagem,
queria lembrar o que Deus Pai falou a S. Catarina de Sena a respeito deste que é talvez o maior teólogo
da Igreja: "É o conhecimento infuso,
que concedo àqueles que realmente me amam e servem. Foi com essa iluminação que
Tomás (de Aquino) adquiriu grande
sabedoria" (L. O DIÁLOGO, 18.5.7; pag. 172).
Há, ainda, os que procuram conciliar as duas
opiniões, dizendo que o Espírito Santo concede o dom de a pessoa orar
em línguas e também o de pregar em línguas (ambos= dom de
línguas). O primeiro seria uma consequência imediata da recepção abundante do
Espírito Santo; o que serviria de preparação para o segundo. Isto teria
acontecido no dia de Pentecostes. Os Apóstolos, ao receberem o Espírito Santo,
extasiados, começaram a orar em línguas, louvando as maravilhas de Deus. Então,
pelo grande ruído do vento, pessoas de todas as nações que estavam em Jerusalém
acorreram para junto do Cenáculo; os 12 Apóstolos (já incluindo Matias) saíram
e começaram a pregar em línguas a todos aqueles povos.
Também poderia
ser concedido o dom de orar em línguas como encaminhamento para um dom muitíssimo
superior, ou seja, a graça habitual, pelo santo Batismo, como aconteceu segundo
narram os Atos X, 47 e 48: "Então
Pedro disse: Porventura pode alguém recusar a água do batismo àqueles que
receberam o Espírito Santo como nós? E mandou que fossem batizados em nome de
Jesus Cristo" (i. é, com o batismo instituído por Jesus).
O teólogo Tanquerey assim diz: "O dom das
línguas, em S. Paulo, é o dom de orar em língua estranha com certo
sentimento de exaltação; e segundo os teólogos, é o dom de falar várias
línguas".
O certo é
que ORAR EM LÍNGUAS só seria um carisma com utilidade comum, se houvesse quem
pudesse servir de intérprete aos ouvintes. E este intérprete poderia ser alguém
iluminado pelo Espírito Santo através do dom
da interpretação das línguas. Inclusive, S. Paulo aconselha a quem tiver
recebido o dom de orar em línguas, que também peça a Deus o dom de as
interpretar (I Cor XIV, 13).
Conclui-se
daí que na oração em línguas, a
pessoa fala uma verdadeira língua (embora desconhecida) e o dom é dado quando o Espírito Santo quer.
S. Paulo em I Cor XII, 1-3, dá o critério pelo
qual se possa reconhecer um carisma autêntico: os atos ou discursos que tendem
a diminuir a pessoa ou a missão do Salvador certamente não vêm do Espírito
Santo. Se, porém, o cristão sincero diz que Jesus é o Senhor, este está sob a
influência do verdadeiro Espírito de Deus. S. Paulo também chama a atenção para
que seja tudo feito com decência e ordem (I Cor XIV, 40).
Os teólogos
dizem que os poderes extraordinários dos carismas eram indispensáveis aos
primeiros pregadores tanto para tornar mais eficaz seu ensinamento, (e assim
espalhar rapidamente a Igreja pelo Universo) como para fortificar na fé os
primeiros cristãos diante das perseguições. O célebre exegeta D. Delatte diz:
"A efusão [dos...] dons carismáticos foi abundante na origem da Igreja,
porque a Igreja não tinha história; esta efusão de carismas é menor hoje,
porque a história e a ação da Igreja suprem-na com vantagem" (Les Épîtres
de Saint Paul, t. I, 2, pag. 353). S. João Crisóstomo (+ 408) em sua 29ª
Homilia já confessava que o sentido de muitas destas manifestações carismáticas
tinha se perdido. (Cf. Patrologie Grecque de Migne, col. 239 e sgs). Santo
Agostinho no Trat. super Joan. diz: "Atualmente (s. V), quando alguém
recebe o Espírito Santo, ninguém fala as línguas de todos os povos, porque já a
Igreja as fala todas; e quem a ela não pertence não recebe o Espírito
Santo".
S. Paulo, ao
pôr os pingos nos is, embora não desaprove o dom de línguas, diz claramente que
os outros dons são mais excelentes porque todos diretamente concorrem para a conversão
e edificação. Por ex. o dom de profecia (que, de alguma maneira, engloba quase todos os outros) edifica a Igreja. O dom
de orar em línguas, porém, só edifica aquele que o tem.
S. Paulo em
I Cor XIV, 12 diz: "Assim também
vós, já que sois desejosos de dons espirituais, procurai abundar neles para
edificação da Igreja". Penso
que os missionários podem pedir ao Espírito Santo o dom de línguas, para que,
em qualquer país que fossem enviados pela Igreja, pudessem pregar sem demora e
de maneira milagrosa para assim levar mais almas a Jesus!
Quero
terminar este artigo transcrevendo alguns tópicos do livro O DIÁLOGO de Santa
Catarina de Sena, onde o próprio Deus Pai dá as características de seus filhos
adoradores em espírito e verdade. Passando pelo via purgativa e iluminativa,
chegam à via unitiva por uma espécie de terceira conversão: "O sinal [para se reconhecer o homem perfeito] é o mesmo que aconteceu aos Apóstolos, após terem recebido o Espírito
Santo; saíram do Cenáculo pregando a mensagem do meu Filho (...) Os perfeitos
agem como que embriagados e inflamados de caridade (...) É no lado aberto de
Cristo que ele toma consciência da grandeza do amor divino (...) O homem
perfeito fala comigo pelo desejo santo, o qual constitui uma contínua oração.
Em sua "fala" espiritual, apresenta-me amorosos anseios pela salvação
dos homens; com o uso da palavra, anuncia a mensagem do meu Filho, dá
conselhos, professa a fé sem medo algum de perseguições, testemunha a todos
conforme a condição de cada um. Tal pessoa conquista muitas almas na mesa da
santa cruz. (...) Ao ter a experiência da minha caridade, desaparece a vontade
própria e a pessoa goza de paz e tranquilidade interior. Imensa é a paz
adquirida (...) Quaisquer que sejam as condições de vida, tudo faz para me
louvar, sempre alegre, na paz, na quietude de espírito... Em tudo só vê a minha
vontade.(...) Alegremente permanecem no campo da luta, inebriados no Sangue de
Cristo crucificado. (...) Morreram inteiramente para si mesmos. Conservam
sempre a graça com toda satisfação do espírito. Suas vontades se encontram num
altíssimo grau de união com a minha; nada as consegue separar. Todo lugar é
lugar de oração; todo tempo é tempo de oração. Seu modo de viver desprendeu-se
da terra, encontra-se no céu (Fl III, 10). (...)
Deus Pai falando da oração extática no homem perfeito:"Impulsionado por grandes desejos de amar, pratica as virtudes e
caminha célere na mensagem de Cristo crucificado; elevando-se espiritualmente,
atinge na caminhada da ponte aquela porta que é Jesus; inebria-se no Sangue de
Jesus, arde no fogo da caridade, experimenta a minha própria divindade. Neste
oceano de paz realiza-se a união. Já não faz nenhuma movimento fora de mim.
(...) As faculdades ficaram alienadas devido ao ímpeto do amor... Durante a
união extática as faculdades fundem-se, imergem-se, inflamam-se em mim...".
Falando a
Catarina de Sena, dos vários tipos de lágrimas, Deus Pai explica as lágrimas de
fogo: "Se prestares atenção, verás que o
Espírito Santo chora em cada servidor meu que possui o desejo santo e faz
orações contínuas e humildes na minha presença. Foi o que pretendia afirmar o
glorioso apóstolo Paulo, ao dizer que o Espírito Santo chora em mim "com gemidos inenarráveis (Rm
VIII, 26), a vosso favor". (Excertos
do Livro "O DIÁLOGO" de Santa Catarina de Sena).
VINDE
ESPÍRITO SANTO, ENCHEI OS CORAÇÕES DOS VOSSOS FIÉIS E ACENDEI NELES O FOGO DO
VOSSO AMOR! Amém!
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