Demos a palavra ao P. Prat, S. J., em seu excelente livro La Théologie de Saint Paul, 1ª parte, pags. 154-157:
No Antigo
como no Novo Testamento o profeta é aquele que fala em nome de Deus.
É o sentido
etimológico (pro fari = falar diante
de alguém, em seu lugar) que é sempre mantido no uso profano assim como na
Bíblia. O profeta, nos templos pagãos, era propriamente aquele que explicava os
oráculos ou que servia de órgão ao deus. Por extensão significava também
"intérprete"... Por ser órgão de Deus, é preciso que o profeta seja
iniciado nos segredos de Deus, que seja inspirado; assim "profeta"
tem por sinônimo "vidente" e ele é reputado como conhecedor dos
mistérios e mesmo do futuro.
Mas,
enquanto os profetas do Antigo Testamento exerciam uma função pública e um
ministério permanente, os do Novo são antes
por título privado e transitório. São pregadores inspirados; mas não é
essencial que sejam portadores de uma revelação propriamente dita. Seu papel
específico é: "edificar, exortar e consolar" (I Cor XIV, 3). Se lêem no
fundo dos corações e levantam o véu do futuro, é em virtude de uma prerrogativa
agregada à sua missão oficial. Na hierarquia dos carismas, os profetas vêm sempre imediatamente após os apóstolos, donde
se vê que o dom espiritual de que eram favorecidos os tornava aptos a dirigir
as comunidades nascentes e os destinava às funções do ministério ordinário.
Esta a razão
porque Paulo aconselha que se deseje a profecia antes que os outros carismas,
em particular, antes que o dom das línguas
(I Cor XIV, 1). Ele tem sobre este a dupla vantagem de ser compreendido
pelos ouvintes e de ser útil mesmo aos infiéis. Todo mundo compreende o profeta
e pode tirar proveito de suas instruções. Só Deus compreende o que ora em
línguas, a menos que um intérprete venha em sua ajuda (I Cor XIV, 5). Enquanto
que o profeta edifica a Igreja, o que ora em línguas não edifica senão a si
mesmo. Quando se sente sob à ação de Deus, tem consciência de O louvar; mas que
adianta isto aos assistentes? (I Cor XIV, 3 e 4). Porque, a quem serve uma
língua que não se entende? (I Cor XIV, 19). Deus tinha já ameaçado seu povo
infiel de lhe fazer ouvir uma língua estrangeira que ele não compreendesse. Há
motivo para se gloriar de um "privilégio" prometido à infidelidade?
(I Cor XIV, 21 e 22). Que, pelo menos, a oração em línguas convertesse os
infiéis! Mas ela é para eles um motivo de derrisão, como aconteceu no dia de
Pentecostes.
"Se,
pois, toda a Igreja se reunir em assembléia, e todos falarem línguas diversas,
e entrarem então catecúmenos ou infiéis, não dirão que estais loucos? Porém, se
todos profetizarem, e entrar ali um infiel ou um catecúmeno, por todos é
convencido, por todos é julgado; as coisas
ocultas do seu coração tornam-se manifestas e, assim, prostrado com a face por
terra, adorará a Deus, declarando que Deus está verdadeiramente entre vós"
(I Cor XIV, 23-25). Devemos lembrar que os profetas eram tidos como possuidores
do dom de penetrar os corações.
Como o uso
do dom de profecia pode ser ele também objeto de abusos, S. Paulo regulamenta-o
assim como o dom das línguas. Três avisos são endereçados ao agraciado pelo dom
das línguas, e dois ao profeta: Se os agraciados com o dom das línguas são
numerosos, que dois somente, no máximo três, tomem a palavra em cada
reunião. Que não falem ao mesmo tempo, e
sim, um após o outro; e que um assistente, dotado do carisma da interpretação
ou conhecedor da língua falada, explique o que eles dizem. Se não há quem
interprete, que o agraciado do dom das línguas, guarde silêncio em público e se
entretenha com Deus em voz baixa (I Cor XIV, 27 e 28). As disposições seguintes
regulam a prática da profecia: Dois ou três profetas, em cada reunião,
exortarão alternativamente o povo; os outros, ou os fiéis dotados do carisma de
discernimento dos espíritos, formarão um juízo sobre sua inspiração e sua doutrina. - Se, enquanto um fala, um outro se sente
inspirado, o primeiro, por deferência e por modéstia, ceder-lhe-á a palavra (I
Cor XIV, 29-32). O Apóstolo resume seus avisos em uma palavra: "Que tudo
seja feito com decência e ordem" (I Cor XIV, 40).
Em seu
desejo de fazer alarde dos dons espirituais, os Coríntios perdiam muito de
vista que os carismas não outorgavam nem supunham um átomo de mérito naquele
que os possuía; e que lhes eram concedidos menos para seu proveito particular
do que para o bem geral da Igreja. Olhá-los com complacência é uma puerilidade.
O dom das línguas especialmente é um dos menores, porque tem necessidade de ser
completado pelo dom da interpretação. O possuidor do dom de línguas não é
compreendido pelos outros e, regularmente, nem se compreende a si mesmo: seu
espírito (pnéuma) se edifica, mas sua inteligência (noús) fica em jejum. E não
é sem ironia que Paulo o compara à um instrumento de música, que executa um som
desconhecido do qual ninguém percebe o significado: um e outro agitam o ar e
fazem-no vibrar em vão. Não que ele [Paulo] queira menosprezar o dom de Deus,
nem impedir que se produza, mas é preciso avaliar os carismas de acordo com sua
utilidade. Neste aspecto, depois do dom do apostolado que não é para as
comunidades já estabelecidas, a profecia tem o primeiro lugar. No entanto há
algo muito superior aos carismas, favores gratuitos que Deus distribui a seu
bel grado, e cuja privação não nos suprime nada aos seus olhos: são as virtudes
sobrenaturais, porque elas permanecem na alma enquanto nela reside a graça
santificante, e acima de tudo as três virtudes teologais, a fé, a esperança e a
caridade. Tal é o fim por excelência que Paulo designa à ambição dos perfeitos,
e este nome de caridade inspira-lhe uma página duma beleza penetrante e quase
lírica. [É o c. XIII de 1ª Cor].
O objeto
especial dos diversos carismas permanece obscuro, mas um caráter comum e
essencial é sua instabilidade e sua dependência absoluta da beneplácito de
Deus. Isto não permite que sejam confundidos, seja com os outros "frutos do
Espírito", seja com as funções ordinárias da hierarquia sagrada. Sem
dúvida, nas origens, os dignitários eclesiásticos foram geralmente escolhidos
entre os possuidores de carismas. O carisma dispunha à função, mas ele não lhe
era necessário, a graça de estado que toma ela mesma, às vezes, o nome de
carisma, pode substituí-lo. Enfim, se todos os carismas são sobrenaturais, porquanto
frutos do Espírito, não parece necessário que eles fossem todos miraculosos e
não se vê motivo para que o Apóstolo não tenha podido chamar de carisma uma
aptidão natural sobre naturalizada.
DIVINO
ESPÍRITO SANTO, ILUMINAI NOSSA INTELIGÊNCIA! Amém!
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