Aqui falo apenas do escrúpulo propriamente dito, que é justamente aquele acompanhado de obstinação. Não trato dos escrúpulos passageiros e dos provenientes de causas sobrenaturais.
Escrúpulo é uma horrível doença espiritual, é um grande erro e, por estas duas coisas, constitui um grande obstáculo na vida espiritual. E se criar raízes inveteradas, pode levar à ruína espiritual. O Espírito Santo diz em I Reis, XIX, 11: "Non in commotione Dominus". "Deus não está na agitação". "Commotio" (em latim) tem o sentido literal "abalos" como os provocados por ventos fortes. Mas Cícero usa-o no sentido figurado de "agitação", "angústia". E é neste sentido figurado que aqui o empregamos relativamente ao escrúpulo. Na verdade, o escrúpulo causa grandes abalos na alma, como o vento os causa nas florestas, plantações etc. As agitações da alma provocam grandes ruínas espirituais.
O escrúpulo pode se comparar, outrossim, a uma doença nos olhos: doença que causa coceira e que turva o olhar. Quanto mais o doente coça, mais a coceira aumenta, e quanto mais esta aumenta, mais turva fica a visão. Se não usar o colírio adequado e o doente não tiver força de vontade para não coçar mais, nunca chegará a cura. Antes pelo contrário, pode levar à cegueira.
Diz o P. Faber: "O escrúpulo pode ainda ser comparado a um cavalo espantadiço e medroso que recua em vez de avançar, desobedecendo às rédeas do cavaleiro, pondo-o muitas vezes em perigo, além de lhe causar irritação. Acresce que o escrupuloso, fugindo da sombra do pecado imaginário, precipita-se no pecado real".
Mas, que é
escrúpulo? Etimologicamente, vem da palavra latina "scrupulus". que
significa "pedrinha". Foi bem escolhida esta figura para designar
esta doença que angustia e embaraça a alma. Assim, o escrúpulo é como uma
pedrinha dentro do sapato: incomoda a todo momento, e estorva o andar da
pessoa. O teólogo Tanquerey mostra outro
significado da palavra "scrupulus": "Designou durante muito tempo
um peso minúsculo, que não fazia inclinar senão as balanças mais sensíveis. Em
sentido moral, designa uma razão insignificante, de que somente se preocupam as
consciências mais delicadas. Daqui passou a exprimir a inquietação excessiva que experimentam certas consciências, pelos
motivos mais fúteis, de haverem ofendido a Deus". O escritor
espiritual Poulain assim define o escrúpulo: "É um temor infundado e aflitivo de pecar ou de ter
pecado".
Diz o P. Faber, sempre com aquela fina psicologia que lhe é característica: "Distinguir entre tentação e o pecado, constitui um ramo importante da espiritualidade, e o escrúpulo nada mais é do que uma condenável incapacidade em fazer tal distinção. Outra pessoa verá logo que meu escrúpulo não é pecado, mas si eu mesmo o discernisse, não teria escrúpulo; e mais, se confiasse na palavra do meu diretor, quando ele mo dissesse, não seria escrupuloso... (O escrúpulo) não merece a estima moral; não possui enfim o menor elemento de bem espiritual. É simplesmente um sentimento perverso e errôneo, digno de inspirar a piedade, com certeza, mas a mesma piedade que merece o homem que vai a caminho da forca. Francisca de Pampeluna viu muitas almas sofrerem no Purgatório, somente por causa dos escrúpulos, e, como isto a surpreendesse, Nosso Senhor lhe disse que nunca o escrúpulo estava isento por completo de pecado".
Seguindo o célebre e seguro teólogo Tanquerey, vamos ver donde provém o escrúpulo: "O escrúpulo provém umas vezes duma causa puramente natural... a) Sob o aspecto natural, é muitas vezes o escrúpulo uma doença física e moral. 1 ) A doença física que contribui para produzir esta desordem, é uma espécie de depressão nervosa que torna mais difícil a acertada apreciação das coisas morais, e tende a produzir, sem motivo sério, o pensamento obsessivo de que se cometeu um pecado. 2) Mas há também causas morais, que produzem o mesmo resultado: um espírito meticuloso, que se afoga nas mais ridículas insignificâncias, que desejaria ter certeza absoluta em todas as coisas; um espírito mal esclarecido, que representa a Deus como um juiz não somente severo, mas implacável; que, nos atos humanos, confunde a impressão com o consentimento e imagina haver pecado, porque a fantasia foi longa e fortemente impressionada; um espírito obstinado, que prefere o seu próprio juízo ao do confessor, precisamente porque se deixa guiar pelas suas impressões muito mais que pela razão.
Quando estas duas causas, física e moral, se encontram reunidas, é muito mais profundo o mal, muito mais difícil de curar.
O P. Tanquerey mostra a "diferença entre o escrúpulo e a consciência delicada:
a) O ponto de partida não é o mesmo: a consciência delicada ama a Deus com fervor e, para Lhe agradar quer evitar as menores faltas, as menores imperfeições voluntárias; o escrupuloso é guiado por um certo egoísmo, que lhe faz desejar com excessiva ansiedade a segurança de estar em graça.
b) A consciência delicada, por ter horror ao pecado e conhecer a própria fraqueza, sente um temor fundado, mas não perturbador, de desagradar a Deus; o escrupuloso alimenta receios fúteis de pecar em todas as circunstâncias.
c) A consciência delicada (= timorata) sabe manter a distinção entre o pecado mortal e o venial e, em caso de dúvida, submete-se imediatamente ao juízo do seu diretor; o escrupuloso discute com o diretor e não se sujeita senão com dificuldade às suas decisões.
Assim como é necessário evitar com todo o cuidado o escrúpulo, assim não há nada mais precioso que a consciência delicada" (P. Tanquerey, Compêndio de Teologia Ascética e Mística, 2ª parte, c. V).
Donde podemos concluir que o centro do escrupuloso não é Deus, mas sim o amor próprio. O escrupuloso deve, com toda urgência, procurar se corrigir, porque, caso contrário sofrerá danos deploráveis tanto na saúde corporal como na espiritual. Os escrúpulos enfraquecem gradualmente o sistema nervoso; aquelas angústias incessantes podem converter-se numa verdadeira OBSESSÃO e produzir uma espécie de ideia fixa de pecado, um verdadeiro desequilíbrio emocional. Depois, os escrúpulos cegam o espírito e falseiam o juízo, de tal modo que a pobre alma escrupulosa torna-se navio sem leme e sem bússola. E a tudo isto acresce que o demônio pode se aproveitar desta depressão para tentar levar o escrupuloso ao desânimo no caminho da vida espiritual.
Vejamos agora as normas de agir e de cura dos escrupulosos. Faço aqui um resumo do que dizem grandes teólogos tradicionais e que se baseiam em Santo Afonso Maria de Ligório, doutor máximo da Igreja em Teologia Moral. Não percamos de vista que, na verdade, o remédio do escrúpulo é a OBEDIÊNCIA PLENA E ABSOLUTA ao um diretor experimentado que deve ter para com o escrupuloso, um misto de firmeza e bondade. Só uma obediência cega ao confessor e diretor espiritual poderá curar o escrupuloso. E este deve pedir todos os dias a Deus esta graça. Uma norma que o escrupuloso deve ter sempre e firme na mente é a seguinte: "Ninguém pode cometer pecado mortal, a não ser que tenha certeza absoluta de que a ação que vai praticar é para ele proibida sob pena de pecado mortal, e, sabendo-o bem, queira ainda assim praticá-la, apesar de tudo". Não se deve dar, portanto, a mínima atenção às probabilidades, por mais fortes que sejam. Quanto às confissões gerais: depois de ter permitido uma, o confessor nunca mais deverá permitir nova confissão geral. Confissão geral para um escrupuloso é o maior veneno; como seria para ele, o maior desastre, encontrar um confessor que concordasse com as suas inquietações.
No que diz respeito aos pecados internos de pensamentos e desejos, eis o que diz o grande teólogo P. Tanquerey: "Dar-se-á esta regra: durante a crise, desviar a atenção, pensando noutra coisa; após a crise, nada de examinar-se, para ver se houve pecado (o que poderia renovar a tentação), mas continuar o seu caminho, cumprindo os deveres do próprio estado, e comungar, enquanto não tiver evidência de haver dado pleno consentimento.
Não é pecado agir contra a consciência escrupulosa, nem ainda quando se age com receio de pecar. Ao escrupuloso é permitido tudo o que ele vê fazer os homens tementes a Deus ainda que agissem contra a opinião dele. O escrupuloso pode estar escusado de muitos deveres positivos p. ex. da correção fraterna, da integridade na confissão, pelo grave perigo que daí lhe poderia resultar. Quando duvidar do cumprimento de uma promessa ou voto, o escrupuloso, sem nenhum temor de pecar, pode supor que os cumpriu. O escrupuloso tem a seu favor um grande privilégio: se duvida da suficiência de seu arrependimento, pode decidir-se em seu favor. Não precisa confessar os pecados cometidos antes da última confissão, a menos que possa jurar tê-los cometido e não os ter confessado ainda.
Cumpre ensinar aos escrupulosos que confundem sentimento de angústia com remorsos, que a causa da angústia tem sua raiz no estado anormal dos nervos e não em possíveis pecados. Agora uma coisa sobre a qual o escrupuloso tem que pensar: DEVE REAGIR contra os escrúpulos para NÃO PECAR por orgulho, teimosia e desobediência e para não prejudicar o corpo e o espírito ou o exercício da profissão e os deveres de seu estado. Se mostrar boa vontade, não peca até se corrigir. Se, não tiver boa vontade, estará pecando. Esta sim deve ser a sua preocupação.
Evite o escrupuloso ler autores rigoristas, conversar com outros escrupulosos. Deus é nosso Pai, cheio de misericórdia, que quer a salvação de todos, e para Ele nada é impossível. Amém!
Obrigado Padre.
ResponderExcluirPossivelmente me enquadro como escrupuloso. Vem um pensamento aí fico angustiado pensando que já pequei.