Primeiramente,
que é tibieza? "É uma espécie de relaxamento espiritual, diz Tanquerey,
que amortece as energias da vontade, inspira horror ao esforço e conduz assim ao
afrouxamento da vida cristã. É uma espécie de languidez ou torpor, que não é
ainda a morte, mas que a ela conduz, sem se dar por isso, enfraquecendo
gradualmente as nossas forças morais". Dificilmente acontece isto com os
neo-convertidos e com os que já chegaram a uma união maior com Deus.
Manifesta-se, sobretudo em almas que estão em progresso na vida espiritual,
isto é, na via iluminativa. São, geralmente, almas piedosas e até fervorosas,
que, tendo deixado o pecado, não vigiaram o suficiente para arrancar do coração
os apegos a coisas mais leves, mas que, na verdade são afeições ainda
remanentes dos seus pecados passados. Eis o que a este respeito diz S.
Francisco de Sales: "Filotéia, uma
vez que aspiras sinceramente à devoção, não só deves deixar o pecado, mas é
também necessário que teu coração se purifique de todos os afetos que lhe foram
as causas e são presentemente as consequências; pois, além de constituírem um
contínuo perigo de recaídas, enfraqueceriam a tua alma e te abateriam o
espírito... Essas almas, que, tendo deixado o pecado, são tão tíbias e
vagarosas no serviço de Deus, assemelham-se a pessoas que têm uma cor pálida;
não é que estão verdadeiramente doentes, mas bem se pode dizer que seu aspecto,
seus gestos e todas as suas ações estão doentes. Comem sem
apetite, riem sem alegria, dormem sem repouso e mais se arrastam do que andam.
Deste modo aquelas almas, em seus exercícios espirituais, que nem são numerosos
nem de grande mérito, praticam o bem com tanto dissabor e constrangimento que
perdem o brilho e graça que o fervor dá às obras de piedade" (Filotéia,
parte I, c. VII).
Apresento algumas
comparações para que se possa compreender bem em que consiste este grande
empecilho na vida espiritual. Comparemos a tibieza a uma tuberculose pulmonar.
A pessoa acometida desta doença, vai-se definhando aos poucos. Assim faz a
tibieza na alma que era fervorosa. A
tibieza pode ser comparada à rêmora. É um peixe marítimo relativamente pequeno e munido
de uma espécie de ventosa em cima da cabeça, que o prende no casco de
embarcações, estorvando-as, quando em cardume. Assim, a tibieza, pelos muitos
pecados veniais, impede que a barquinha de nossa alma prossiga em demanda do
porto da vida eterna.
Comparemos a vida
espiritual a água num vasilha que é levada ao fogo. Dois fatores fazem esta
água esquentar e logo ferver: o fogo bem forte, bem atiçado e a tampa da
vasilha hermeticamente fechada. Se houver um descuido com uma destas duas
coisas e, mais ainda, com as duas, a água pára de ferver, e chega a um ponto
que fica morna, isto é, nem quente e nem fria. Assim, comparando: O fogo que
esquenta a alma é o amor de Deus. Este fogo é intensificado pelos exercícios de
piedade bem feitos: meditação, leituras espirituais, oração da manhã e da
noite, exercício da presença de Deus pelas orações jaculatórias, o santo Terço,
o cumprimento fiel dos deveres de estado etc. A tampa bem fechada é o
recolhimento. Pois bem, se a alma fervorosa descuida destas duas coisas,
forçosamente mas aos poucos, vai perdendo o fervor do amor de Deus. Comete
muitos pecados veniais exatamente em fazer por rotina e negligência, estas
coisas que a colocariam sempre em maior comunhão com Deus, a fonte da vida
sobrenatural. As forças e as luzes que vinham do divino Espírito Santo vão
diminuindo. A alma torna-se morna na sua vida, porque ou não põe a lenha destes
exercícios, ou põe lenha verde ou podre. Quer dizer, entrega-se voluntariamente
às distrações nas orações; e está também dissipada pelas as coisas do mundo. E
nunca até hoje, foi tão grande o perigo da dissipação pela TV, celular e
Internet. O cuidado hoje contra a tibieza deve ser triplicado. Sobretudo,
deve-se ter muito cuidado para não criar um fanatismo por jogos e notícias.
Aqui estamos falando de pecados veniais. Mas diz a Sagrada Escritura que se a
gente desprezar as coisas pequenas, aos poucos se cai nas grandes. A pessoa
perde um tempo que poderia ser empregado no estudo do Terceiro Catecismo, em
leituras espirituais, e mesmo em mais orações. Além disso se indispõe para os
raros momentos que ainda sobram para conhecer melhor as verdades da fé, e para
fazer suas poucas orações. Não queremos dizer que não sejam legítimos e até
necessários alguns recreios honestos, mas quando muito demorados são
contraproducentes. Em lugar de descansar o espírito, cansa-o, indispondo-o para
a boa leitura e para a oração.
O que a Sagrada
Escritura diz da tibieza é realmente assustador: "Conheço as tuas obras (diz Deus ao bispo de Laodicéia), que não és nem frio nem quente; oxalá foras
frio ou quente; mas, porque és morno, nem frio nem quente, começar-te-ei a
vomitar da minha boca. Tu dizes: sou
rico, e enriqueci-me, e não conheces que és um coitado e um miserável e pobre e
cego e nu" (Apoc. III, 15 - 17). Na verdade, a tibieza como que causa
náuseas ao próprio Deus, porque envolve ingratidão e fraude para com Ele:"Maldito o homem que faz a obra de Deus fraudulentamente" (
Jeremias XLVIII, 10). Além disso, é muito difícil o tíbio se converter. A alma que estava na altura do fervor e cai de
repente num pecado mortal (como aconteceu com Simão Pedro) leva um grande susto
e logo procura se reerguer. Quando vai descendo aos poucos por uma ladeira
escorregadia (a tibieza), termina chegando em baixo sem perceber, isto é,
relaxa a consciência.
Uma barca tem que estar sempre impulsionada pelos remos.
Parando estes, ela é levada pela correnteza. Um fogo deve ser sempre atiçado,
do contrário, termina se apagando. Vejamos os remédios da tibieza:
·
São receitados pelo próprio Nosso Senhor Jesus
Cristo: "Aconselho-te que me compres
ouro acrisolado no fogo, para te enriqueceres (o ouro da caridade e do
fervor), e roupas brancas, para te
vestires e não aparecer a vergonha da tua nudez (pureza de consciência), e um colírio para os teus olhos, para
poderes ver (a franqueza consigo mesmo e com o próprio confessor). Porque aqueles que eu amo, repreendo-os e
corrijo-os; arma-te, pois, de zelo e faz penitência. Eis que eu estou de pé à
porta, entrarei em sua casa e cearei com ele e ele comigo" (Apoc. III,
18-20). NB.: É continuação do
texto anterior supra citado do Apocalipse, mas os parênteses são do teólogo
Tanquerey.
·
Para muitas almas que caíram na tibieza, a
melhor farmácia para se adquirir os remédios indicados pelo próprio Jesus, é um
retiro espiritual.
·
Para os que não podem ir a esta farmácia,
receito-lhes alguns remédios caseiros: 1º - Esforçar-se em casa mesmo, para
meditar sobre os novíssimos; 2º - Diminuir, o quanto for possível, o acúmulo de
afazeres cotidianos. Alma querida que quer voltar a ser fervorosa, eis o meu
conselho: se não puderes cumprir bem todos os teus deveres, por serem demais,
desista de alguns; 3º - Por amor a Jesus, deixe de lado por algum tempo o seu
celular, sua Internet e a TV (caso infelizmente a tenha) e você vai verificar
como sua vida espiritual vai voltar a ser fervorosa. E compreenderás que vai
ser necessário arrancar estes olhos para poderes entrar no reino do Céu.
·
Segundo o teu estado de vida, procure guardar ao
máximo o silêncio, sem é claro, faltar com a caridade para com o próximo, sem
singularidade. No mínimo, falar menos. Tenho certeza que você nunca irá se
arrepender de o ter feito.
·
Não deixar os exercícios espirituais que fazia
antes da tibieza chegar. E isto mesmo em meio a aridez e distrações que
persistirão no início do tratamento. Isto é normal como acontece com os efeitos
colaterais de certos remédios.
·
Procurar adquirir o hábito de pequenas
mortificações exteriores, como aquela supra recomendada: aposentar o celular e
a internet. Depois, à sua hora, virão as mortificações interiores. Afastastes-vos
de Deus, cedendo às inclinações da natureza; aproximai-vos d'Ele,
reprimindo-as.
Mas, caríssimos,
não esqueçamos que para conseguirmos todos os remédios da tibieza, só há uma
moeda aceita no banco de Deus: a ORAÇÃO. E primeiro, a oração pedindo a graça
de a fazer bem: "Senhor, ensinai-nos
a orar" (S. Luc. XI, 1). Orai, portanto, por mais aborrecimento que
vos cause a oração e apesar da sua aparente inutilidade: humilhai-vos diante de
Deus. Ele quer a vossa cura, mas quer que a peçais. Amém!
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