sexta-feira, 3 de junho de 2016

AMOR CONFIANTE ( I )

LEITURA ESPIRITUAL

"O Filho do Homem veio salvar o que se tinha perdido" (Mt 18, 11).
"Sou Eu, não temais" (Lc 24, 36)
Pelo Padre Mateo Crawley-Boevey  SS. CC.
É uma conferência extraída do seu Livro "JESUS, REI DE AMOR"
Vou distribuí-la em vários artigos a serem publicados no mês de Junho.

Caríssimos, não acrescentarei uma só palavra minha, não venha ela empanar o brilho daquela eloquência mais do céu que da terra; nem arrefecer o calor daquele fogo divino que abrasava o peito deste grande apóstolo da devoção ao Sacratíssimo Coração de Jesus. Assim, demos a palavra ao Servo de Deus:

"Palavra inefável, eloquente como poucas, talvez como nenhuma. Tende confiança, "sou Eu".

- Eu, vosso Pai, vosso Amigo, vosso Salvador. Nolite timere! "Não temais!".

- Mas, como?... E minhas ruindades?

- Ego sum! "Porque sou Eu" ...

Se fosse um Anjo, um profeta, um Santo, poderíeis temer, pois as criaturas, as melhores, não podem amar-vos como Eu ... Não temais, porque sou Jesus.

E por isso Ele disse: "Eu vos dou a minha paz" (Jo 14, 27). A Sua, não a nossa, tão desprezível. A Sua e não a do mundo, falsificada, perigosa, envenenada.

Sobre os fundamentos da Sua misericórdia, tenhamos a paz. Não porque nos creiamos justos e confirmados em graça, mas porque cremos com fé imensa em seu amor, remédio e reparação para nossas misérias.

Que faríamos sem esta energia sobrenatural, divina, da confiança em Nosso Senhor? ao cimo da santidade, chega-se pela vereda da confiança; não há outro caminho.

Porque sendo o que somos todos nós, um abismo de baixezas e pecados, pedir-nos que assim mesmo subamos sem nos dar antes de tudo as asas da confiança, seria arrojar-nos num outro abismo: o do desânimo definitivo e sem remédio.

Mas, por essa escada santa, mas, com tais asas divinas, quero, sim, e posso, ser santo. Quero e posso subir muito alto, de profundis, das profundezas da minha maldade, do abismo da minha miséria.

Não me venham dizer que isso é pretensão, que é ilusão ... Se pensasse em chegar ao cume com meus pés de argila, então, mil vezes seria loucura e soberba. Mas, nos braços de Jesus, sobre seu Coração, estou certo de que chegarei com êxito, porque sou menos que uma formiga.

Ele transforma sempre as formigas confiantes  em águias reais.

Se Ele, o Deus de perdão e de graças, se Ele, Jesus, o Deus de misericórdia e ternura; se Ele, Jesus, o Deus Crucificado e Sacramentado por amor e Encarnado para salvar, não me inspira confiança cega, imensa, ilimitada, quem poderá inspirar-me?

Veio, acaso, à terra para trazer-nos...  o quê? Os arremessos de tremenda justiça? As chamas de uma cólera divina? A sentença de morte eterna, mil vezes merecida? Não! Absolutamente não! Abri o Evangelho em qualquer página, ao acaso, e ainda em suas iras e anátemas encontrareis inebriante, irresistível, o Coração do Salvador.

Veio perdoar, salvar, semear paz, dar o céu, ainda àqueles, e sobretudo a eles, que Lhe prepararam a cruz: "Perdoa-lhes, Pai, porque não sabem o que fazem" (Lc 23, 34).

Com este fim redentor "aniquilou-se, tomando a natureza de servo" (Filip 2, 7). Revestiu-Se da nossa roupagem leprosa, e por isso o fulminou o Pai.

Tomou consigo nossas misérias, segundo está escrito: "Tomou sobre si nossas fraquezas, e ele mesmo carregou com as nossas dores" (Is 53, 4). "Homem de dores e experimentado nos sofrimentos" (Is 3, 3).

Não, por certo, em sentido literal, mas figurado, poderíamos pois aplicar-Lhe aquela expressão dos Livros Santos: "Um abismo chama outro abismo" (Sl 41, 8). Isto é, o abismo da nossa miséria e corrupção, dir-se-ia, atraiu o abismo de Sua misericórdia e bondade.

Belém é apenas, com toda a sua pobreza, um reflexo, um quadro poético, se comparado com outro berço consciente de sua pobreza e indignidade: o coração de quem comunga.

Jesus, que sabe disso, manda que o recebamos, que comunguemos.

Sobre a base do arrependimento e da humildade, parece Jesus correr um véu de paraíso sobre este presépio menos que palha, e comprazer-Se nele. E tem ânsias supremas de descansar nesse altar desmantelado. Negar-Lhe o direito à sua condescendência seria feri-Lhe o Coração!

Sabeis qual  é, para mim, a transfiguração que me enlouquece? não a do Tabor, onde, por um instante, parece recobrar o que havia deixado por meu bem, o manto da sua majestade esplendorosa. A transfiguração que me comove e arrebata é outra: a de Belém, quando vejo o Criador revestido das roupinhas da nossa natureza. A de Nazaré, quando contemplo meu Juiz, coberto com o véu do anônimo, de qualquer um. E aquela do Calvário, quando adoro, debaixo da púrpura sangrenta e da mortalha da morte, Aquele que é a Vida. Oh! Jesus, à força de quereres assemelhar-Te a nós, já não Te pareces contigo mesmo!

Esta transfiguração tríplice que o faz tão meu, tão Irmão, tão condescendente, tão parecido comigo, ensina-me, melhor que o Tabor, quanto devo amá-Lo e com quanta confiança, se possível infinita, devo aproximar-me de Seu Coração.

O contraste prodigioso entre o que o Tabor mostra num instante e o que é e permanece em Belém, Nazaré e no Calvário, prega-me, patentemente, e com eloquência esmagadora, a loucura do Seu amor e a realidade daquela palavra da Escritura: "Não quero a morte do ímpio, mas que se converta a viva (Ez 33, 11). E ainda: "Veio buscar e salvar o que tinha perecido" (Lc 19, 10).


(Continua no próximo artigo).

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