quinta-feira, 21 de maio de 2020

Por São Boaventura

"A ternura e bondade de Nosso Senhor tinham-Lhe conciliado tanto a afeição dos discípulos e principalmente dos Apóstolos, que não podiam resignar-se a separar-se dele. Em vão lhes dissera que ia preparar-lhes morada na casa de seu Pai, e que lhes convinha que Ele fosse; só a ideia da sua ausência, ainda mesmo temporária, enchia-os de tristeza.

Tendo pois chegado o quadragésimo dia depois da sua ressurreição, tomou consigo os santos patriarcas e os outros justos, que tirara do limbo, e veio ter com os Apóstolos que estavam no Cenáculo com sua Mãe e os outros, e aparecendo, quis, antes de subir ao Céu, comer com eles, como prova do seu amor.

Enquanto todos participavam com grande júbilo deste último banquete com seu Mestre, o Senhor Jesus diz-lhes: "É chegado o tempo de eu voltar para Aquele que me enviou; mas vós permanecei nesta cidade, até que sejais revestidos da virtude do alto. Depois ireis por todo o mundo pregar o meu Evangelho, batizar os crentes, e me sereis testemunhas até aos confins da terra".

Todos eles comem, conversam e gozam da presença do seu Senhor; mas não obstante isto, perturba-os a sua partida. E que dizer de sua Mãe, que comia ao lado dele? Não é crível que, ouvindo anunciar esta partida, ela recline cheia de ternura maternal, sua cabeça no peito de Jesus? Não tinha ela mais direito a isso que S. João? E diz-lhe banhada em lágrimas: "Meu Filho, se quereis partir, levai-me convosco". E o Senhor consolando-a, lhe responde: "Peço-vos, minha querida Mãe, que vos não  aflijais, porque vou para meu Pai; e vós convém que fiqueis ainda algum tempo na terra, para confortar os que crêem em mim; depois, virei ter convosco e vos levarei para a minha glória".

Então esta Mãe disse resignada: "Ó meu querido Filho, seja feita a vossa vontade! Eu estou disposta a ficar e a morrer, em favor daquelas almas que remistes com o preço do vosso sangue; mas lembrai-vos de mim". O Senhor consola-a, assim como à Madalena e aos discípulos, acrescentando: "Não se perturbe vosso coração, não vos hei de deixar órfãos. Vou, e hei de voltar a vós, e estarei sempre convosco". Finalmente diz-lhes a todos, que saiam e se dirijam para o monte das Oliveiras, porque dali se elevaria ao Céu; e desapareceu. Sua Mãe e os outros partiram logo para aquele monte, onde o Salvador lhes apareceu de novo.

Considerai atentamente o Mestre, os discípulos, e tudo o que se passa. Estando cumpridos todos os mistérios, o Senhor Jesus abraça sua Mãe, e diz-lhe adeus, e sua Mãe estreita-O ternamente nos braços. Os Apóstolos, Madalena e todos os outros prostraram-se, e desfeitos em pranto beijam com ternura seu divinos pés. Ele levanta com bondade os Apóstolos e abraça-os. Então começa a elevar-se, todos se prostram de novo. Nossa Senhor dizia: "Meu abençoado Filho, lembrai-vos de mim!". Ainda que chorosa, experimentava uma íntima alegria: seu filho subia ao Céu com tanta glória!... Por sua parte os Apóstolos e discípulos diziam: "Senhor, nós renunciamos a tudo para vos seguir; lembrai-vos de nós".

E Jesus, com as mãos levantadas, o rosto radiante, coroado e vestido como um rei, eleva-se triunfalmente ao Céu! Então, abençoando-os, diz-lhes: "Sede constantes, tende coragem, porque estarei sempre convosco". E subia, levando após si aquele exército de escolhidos, a quem abria o caminho do Céu, segundo a profecia de Miquéias: "Ascendet pandens iter ante eos" (Miquéias, II, 13). É assim que o Senhor cheio de glória, vestido de branco, com o rosto alegre e radiante, os precedia. E eles cantando, transportados de júbilo, seguiam-no repetindo: Cantemus Domino qui ascendit super occasum : Dominus nomen illi. [...].

Todos os coros dos Anjos, postos em ordem segundo a sua jerarquia, descem e vêm ao encontro de Jesus, todos se inclinam profundamente diante dele, seu supremo Senhor, e o acompanham, repetindo hinos e cânticos inefáveis. E os patriarcas, que seguiam a Jesus, cantavam e diziam: Alleluia, alleluia, alleluia! [...].

Vede como duma e doutra parte, todos honram o Senhor, se alegram da sua presença, e cantam sua glória, com o maior júbilo. Assim se realiza o oráculo do profeta: Ascendet Deus in jubilatione et Dominus in voce tubae.

Jesus vai-se elevando pouco a pouco, para consolação de sua Mãe e de seus discípulos, para que possam gozar deste espetáculo; depois, por fim, uma nuvem interpõe-se, e oculta-O aos olhos de todos. Mais um instante, e estará com todos os Anjos e patriarcas na pátria celestial.
Mas, como a Mãe do Filho de Deus e os Apóstolos com os discípulos, ainda que já o não viam, se conservassem sempre de joelhos, com os olhos fitos no Céu, foi necessário que dois Anjos viessem tirá-los deste êxtase, dizendo-lhes: "Homens da Galileia, porque estais olhando para o Céu? Este Jesus que acabou de subir ao Céu com tanta glória e majestade, há de tornar do mesmo modo à terra. Voltai para Jerusalém, como Ele vos mandou, esperai ali o cumprimento das suas promessas.

Notai esta atenção de Jesus para com os seus: mal se ocultou aos olhos deles, logo lhes mandou os seus Anjos, para que se não cansem em olhar daquela maneira, e para que sejam confortados com este testemunho dos habitantes do Céu, que vem juntar-se ao deles, acerca da ascensão do seu bom Mestre.

Tendo ouvido estas palavras, Nossa Senhora rogou humildemente aos Anjos que a recomendassem a seu Filho; e os Anjos, inclinando-se diante de Maria até ao chão, receberam de bom grado a sua mensagem. Os Apóstolos, a Madalena e todos os mais fizeram aos Anjos a mesma petição; e estes desaparecendo, voltaram todos para a cidade, para o monte de Sião, ali ficaram esperando, como o Senhor Jesus lhes ordenara".

Também eu, ó Jesus, meu divino rei, com a minha alma cheia de júbilo e esperança, feliz pela vossa glória, vos obedeço, e me retiro para onde vossa vontade me chama. Elevo-me  desde já acima das coisas terrenas; quero que todos os meus pensamentos e afetos estejam no Céu. Amém!


Nenhum comentário:

Postar um comentário