Capítulo III - A natureza e o caráter do primado do Pontífice Romano
Por isso, apoiados ao testemunho manifesto da Sagrada Escritura, e concordes com os decretos formais e evidentes, tanto dos Romanos Pontífices, nossos predecessores, como dos Concílios gerais, renovamos a definição do Concílio Ecumênico de Florença, que obriga todos os fiéis cristãos a crerem que a Santa Sé Apostólica e o Pontífice Romano têm o primado sobre todo o mundo, e que o mesmo Pontífice Romano é o sucessor de São Pedro, o príncipe dos Apóstolos, é o verdadeiro vigário de Cristo, o chefe de toda a Igreja e o pai e doutor de todos os cristãos; e que a ele entregou Nosso Senhor Jesus Cristo todo o poder de apascentar, reger e governar a Igreja universal, conforme também se lê nas atas dos Concílios Ecumênicos e nos sagrados cânones.
Ensinamos, pois, e declaramos, que a Igreja Romana, por disposição divina, tem o primado do poder ordinário sobre as outras Igrejas, e que este poder de jurisdição do Romano Pontífice, poder verdadeiramente episcopal, é imediato. E a ela [à Igreja Romana] devem-se sujeitar, por dever de subordinação hierárquica e verdadeira obediência, os pastores e os fiéis de qualquer rito e dignidade, tanto cada um em particular, como todos em conjunto, não só nas coisas referentes à fé e aos costumes, mas também nas que se referem à disciplina e ao regime da Igreja, espalhada por todo o mundo, de tal forma que, guardada a unidade de comunhão e de fé com o Romano Pontífice, a Igreja de Cristo seja um só redil com um só pastor. Esta é a doutrina católica, da qual ninguém se pode desviar, sob pena de perder a fé e a salvação.
Estamos, porém, longe de afirmar que este poder do Sumo Pontífice acaba com aquele poder ordinário e imediato de jurisdição episcopal, em virtude do qual os bispos, constituídos pelo Espírito Santo [cf. At. 20, 28] e sucessores dos Apóstolos, apascentam e regem, como verdadeiros pastores, os seus respectivos rebanhos; pelo contrário, este poder é firmado, corroborado e reivindicado pelo pastor supremo e universal, segundo o dizer de São Gregório Magno: "A minha honra é o vigor dos meus irmãos. Sinto-me verdadeiramente honrado, quando a cada qual se tributa a honra que lhe é devida".
Além disso, do supremo poder do Romano Pontífice de governar toda a Igreja resulta o direito de, no exercício deste seu ministério, comunicar-se livremente com os pastores e fiéis de toda a Igreja, para que estes possam ser por ele instruídos e dirigidos no caminho da salvação. Pelo que condenamos e reprovamos as máximas daqueles que dizem poder-se impedir licitamente esta comunicação do chefe supremo com os pastores e os fiéis, ou a subordinam ao poder secular, a ponto de afirmarem que o que é determinado pela Santa Sé Apostólica em virtude da sua autoridade para o governo da Igreja, não tem força nem valor, a não ser depois de confirmado pelo beneplácito do poder secular.
E como o Pontífice Romano governa a Igreja Universal em virtude do direito divino do primado apostólico, também ensinamos e declaramos que ele é o juiz supremo de todos os fiéis, podendo-se, em todas as coisas pertencentes ao foro eclesiástico, recorrer ao seu juízo; [declaramos] também que a ninguém é lícito emitir juízo acerca do julgamento desta Santa Sé, nem tocar neste julgamento, visto que não há autoridade acima da mesma Santa Sé. Por isso, estão fora do reto caminho da verdade os que afirmam ser lícito apelar da sentença dos Pontífices Romanos para o Concílio Ecumênico, como sendo uma autoridade acima do Romano Pontífice.
Cânon: Se, pois, alguém disser que ao Romano Pontífice cabe apenas o ofício de inspeção ou direção, mas não pleno e supremo poder de jurisdição sobre toda a Igreja, não só nas coisas referentes à fé e aos costumes, mas também nas que se referem à disciplina e ao governo da Igreja, espalhada por todo o mundo; ou disser que ele só goza da parte principal deste supremo poder, e não de toda a sua plenitude; ou disser que este seu poder não é ordinário e imediato, quer sobre todas e cada uma das igrejas, quer sobre todos e cada um dos pastores e fiéis - seja excomungado.
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